Sempre que toco no tema do amor romântico, muitos leitores se manifestam. Ao contrário do que parece, muita gente se sente afetada por essa questão. A primeira pergunta que me fazem é: "Você crê no amor romântico?". A resposta é sim. Mas, como os medievais, não creio que seja uma experiência universal e acho que é uma doença encantadora e, por isso mesmo, perigosa.
Mas volto ao assunto hoje devido a uma questão específica que toquei na minha coluna de 16 de maio último ("A doença do amor"), em que discutia alguns especialistas no tema do amor cortês (ou romântico). E acho essa questão muito importante, porque ela incide sobre uma compreensão errônea comum em nossa época da relação entre desejo e maturidade.
A questão é a seguinte: as pessoas mais maduras tendem a descrer no amor romântico, enquanto as mais jovens estão mais propensas a viver essa forma de amor?
As explicações comuns para isso seriam a pouca idade e experiência de vida (como digo na coluna de 16 de maio), que levariam os mais jovens aos delírios amorosos. A favor dessa hipótese está a costumeira afirmação de que Romeu e Julieta teriam no máximo 15 anos de idade. Ou que, na Idade Média, berço da literatura romântica, os homens e mulheres morriam com 30 anos e, portanto, os personagens da literatura cortês não passavam dos 15 anos de idade de novo.
E aí voltamos ao argumento comum de que só jovem crê nessas coisas porque não entende a vida como ela é. Mas o erro está na ideia de que, na Idade Média, pessoas de 15 anos eram "jovens".
"Jovem" é um conceito criado para descrever alguém que não precisa obedecer aos pais como as crianças devem fazê-lo, mas que, ao mesmo tempo, são livres para fazer o que quiserem, sem o peso da responsabilidade dos adultos. "Jovem" é uma das primeiras invenções do enriquecimento do mundo devido a sociedade de mercado. Logo, na Idade Média, não existia "jovem".
Para entender a literatura de amor cortês, você deve pensar o seguinte: o amor romântico só podia acometer pessoas que carregavam responsabilidades e interdições.
Portanto, se transferirmos os pressupostos da dramaturgia medieval para hoje, época em que homens raramente morrem em batalhas e mulheres estão em conventos, o que se revela como o coração do drama são as interdições morais: as vítimas são casadas e carregam responsabilidades da vida adulta.
Qual é a conclusão então da relação entre idade e amor romântico? A conclusão é de que um jovem de hoje dificilmente viveria o amor romântico tal como foi descrito na Idade Média. Mas homens e mulheres adultos, casados, com filhos e responsabilidades profissionais e sociais, são os verdadeiros candidatos à doença do amor hoje.
Por isso, são os mais maduros que estão a mercê desse flagelo, e não os mais jovens, que, costumeiramente, não têm quase nenhuma responsabilidade determinante em suas vidas.
O "amor fora de lugar" ocorre como um desejo que não pode se realizar plenamente devido a uma estrutura moral que lhe precede. A condenação do desejo implica em sua piora como "pressão", que nunca cessa de se manifestar, corroendo o cotidiano dessa estrutura que lhe precede. O amor romântico só existe quando os amantes não podem vivê-lo porque para isso destruiriam a própria vida e de outras pessoas que não mereciam sofrer.
O erro da associação do amor romântico à idade "jovem" é a não percepção, típica de nossa época, da lógica do desejo em questão.
Perdemos a capacidade de desejar na medida em que declaramos que "é proibido proibir". Os jovens logo deixarão de desejar.
E, aqui, chegamos a outra incompreensão decorrente dessa: entendemos pouco do amor romântico porque esvaziamos nossa cultura da noção de conflito entre desejo e virtude como um dos motores essenciais do drama moral humano. O drama romântico pressupõe o desejo encantador acompanhado da terrível experiência da culpa. Só os olhos vidrados de culpa enxergam o combate entre desejo e virtude na alma.
A vida secreta do desejo é esse desespero que, na mesma medida em que encanta, destrói.
Texto de Luiz Felipe Pondé, na Folha de São Paulo.
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