terça-feira, 17 de março de 2015

Narcoterrorismo faz campanha eleitoral no México

Ahuacuotzingo é um povoado na montanha em Guerrero. Isso significa pelo menos três coisas. Uma, que está encravado no coração dos maiores campos de ópio da América; duas, que o narcotráfico controla a região; e três, que fazer política ali é arriscar a vida.
Aidé Nava González, 41 anos, a última candidata do PRD (de esquerda) em Ahuacuotzingo e sua família são uma prova disso. A cabeça de Nava foi encontrada na terça-feira em uma estrada de terra. Ao seu lado, em um pano branco, havia uma mensagem escrita com letras vermelhas: "Isto é o que vai acontecer com todos os putos e políticos putos que não quiserem entrar na linha. Assinado: Puro Rojo ZNS". O corpo, com inexplicável pudor, havia sido coberto com uma manta. A autópsia determinou que a política, uma viúva conhecida por sua coragem, foi torturada com requintes e que ainda viva lhe cortaram o pescoço. Possivelmente antes de morrer lembrou o que aconteceu em 28 de junho de 2014.
Naquele dia, Francisco Quiñónez Ramírez, 42 anos, prefeito de Ahuacuotzingo pelo PRD entre 2009 e 2012, dirigia uma camionete Ford Longo vermelha. Carregava as compras para sua festa de aniversário. Quiñónez era um homem popular e com um forte compromisso social. Sua intenção era voltar a disputar as eleições em junho de 2015. Na altura da saída de Tierras Pretas, foi alvo de uma emboscada. Os bandidos o tiraram do carro e acabaram com sua vida a tiros. Tudo isso aconteceu diante de sua acompanhante e esposa, Aidé.
Era a segunda vez que a tragédia atingia essa mulher. Em 11 de outubro de 2012, o filho do casal, Francisco, 15 anos, foi sequestrado. A última vez que o viram foi em um vídeo de péssima qualidade colocado no YouTube, em que o rapaz implorava aos pais que pagassem US$ 17 mil de resgate. Até hoje ele continua no limbo dos desaparecidos, essa terra de ninguém que no México é habitada por 23 mil pessoas. "Para mim ele está morto, mas se continuar vivo não tem mais pai nem mãe para pagar o resgate. Aqui é assim. Matam e ninguém investiga nem sabe de nada", afirma Pedro Nava, primo da assassinada e líder de uma ONG na região. Ele conhecia bem a morta e a admirava: "Aidé decidiu tomar o lugar de seu marido quando o assassinaram. Perguntamos se ela não tinha medo; disse que sim, mas que preferia seguir em frente".
Assim é a política em Guerrero. Na última década foram assassinados 60 membros do PRD nesse estado vulcânico, o mais violento do México. Também caíram militantes e dirigentes do PRI e do PAN. Na porta de sua casa, enquanto tomavam café da manhã em um hotel, em plena estrada... Pouco importa o lugar. O braço do narcoterrorismo chegou à política há muito tempo. O caso Iguala revelou ao mundo sua imensa barbárie. A morte de Aidé Nava, simples e perdida na montanha, voltou a lembrá-lo.
As autoridades federais indicaram três estados - Guerrero, Michoacán e Tamaulipas - como zonas de alto risco para as eleições locais e estaduais de junho. Em muitos de seus municípios, os candidatos vivem à beira do abismo. Aidé Nava (oficialmente pré-candidata) era um deles. Seu assassinato foi atribuído pelo PRD a Los Rojos [Os Vermelhos], um cartel selvagem que há anos trava um combate mortal com os Guerreiros Unidos, organização criminosa que causou a tragédia de Iguala. O sinal que deixaram na beira da estrada é claro: o inferno espera a quem não se dobrar a seus desígnios. O território é deles.
Embora não seja oficial, Ribelín Calzarubias é o mais que provável novo candidato do PRD em Ahuacuotzingo. Não tem proteção e não confia nas autoridades. "Aqui tudo fica impune, você sabe", diz, sem muitos rodeios. Calzarubias conhecia o casal e também o filho sequestrado. E os três irmãos que sobreviveram: "Imaginem sua dor: primeiro um irmão, depois o pai e agora a mãe".
"E o senhor não tem medo de ser morto?"
"Olhe, alguém tem que dar a cara. Não podemos recuar."
Na quinta-feira, Aidé Nava González foi sepultada em seu povoado natal de Pochutla. Centenas de pessoas aderiram ao cortejo fúnebre. Sua filha mais velha, Vanessa, pediu diante do caixão coberto de flores que o México não deixe cair no esquecimento a luta de seus pais. Depois partiu para sempre de Ahuacuotzingo.

Reportagem de Jan Martinez Ahrens, para o El País, reproduzida no UOL. Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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