sábado, 11 de maio de 2013

Na Alemanha, cresce o número de seguranças particulares ligados à extrema direita



Apesar de as equipes do Borussia Dortmund e Schalke --da primeira divisão do futebol alemão-- terem sobrevivido ilesas a uma partida crucial no Signal Iduna Park no ano passado, um torcedor do clube tradicional da região do Ruhr teve menos sorte e acabou no hospital com uma concussão, costelas fraturadas e lesão na mandíbula.

O torcedor do Schalke sofreu seus ferimentos durante uma briga no banheiro do estádio. A polícia diz acreditar que o agressor seja um segurança do estádio de Dortmund que teria postado conteúdo de extrema direita na internet.

O suspeito nega a agressão, e os banheiros são uma das poucas áreas do estádio sem câmeras de segurança. Portanto, é a palavra dele contra a da vítima e, no final, caberá a um tribunal determinar a culpa.

Dado os rumores de que entre os seguranças da arena em Dortmund há extremistas de direita há muitos anos, o Borussia, o time campeão alemão, não viu outra opção após o ataque ao torcedor do Schalke a não ser conferir os certificados emitidos pela polícia para os seus seguranças.

Mas o incidente em Dortmund é sintomático de um problema maior que aflige os serviços de segurança da Alemanha. Uniformes, camaradagem masculina e oportunidade para exercer o poder tendem a provocar uma atração mágica sobre os neonazistas e outros extremistas de direita.
Além disso, é fácil demais ser contratado em um setor que é extremamente sensível. As autoridades do setor tomam as decisões de contratação, e a agência de inteligência doméstica alemã --o Escritório para a Proteção da Constituição, que opera nas esferas federal e estadual e é responsável pelo monitoramento de atividade extremista-- não costuma realizar nenhuma checagem de segurança.

Situação perigosa

Afinal, há uma demanda por músculos. O setor passa por um boom, com seguranças patrulhando eventos esportivos, concertos, shopping centers, parques de diversão e casas noturnas. Atualmente, há quase tantos seguranças particulares quanto policiais. Segundo a Associação Alemã dos Serviços de Segurança Particulares (BDSW), o setor emprega cerca de 180 mil pessoas, enquanto o volume de negócios no setor mais que dobrou desde meados dos anos 90.

As agências domésticas de inteligência são as mais bem posicionadas para avaliar quantos seguranças têm ligações com a extrema direita. Um relatório aponta que os serviços secretos no Estado alemão de Brandemburgo, no leste, observaram que "pessoas com laços com a cena de extrema direita cada vez mais buscam emprego ou abrem empresas no setor de segurança".

A situação está se tornando perigosa. O mesmo relatório publicado pelos serviços de inteligência de Brandemburgo tratou do "potencial significativo de conflito" gerado pela presença de seguranças neonazistas em lugares como albergues para pessoas que pedem asilo. Até mesmo os donos de algumas empresas de segurança ganharam notoriedade. A prefeitura de Walsrode, por exemplo, multou a empresa de segurança GAB em 1.200 euros após seus seguranças se tornarem agressivos em uma partida de futebol para a qual foram contratados para manter a paz. Entre os donos da empresa estão ex-Hells Angels e operadores de bordéis.

Em Wetterau, no Estado de Hessen, no oeste, dois seguranças contratados para a abertura de um novo museu da cultura celta foram identificados como ex-dirigentes do Partido Nacional Democrático (NPD) de extrema direita. Então, em dezembro, a empresa de varejo online Amazon contratou seguranças junto à empresa Hensel European Security Services (HESS) que apareciam para trabalhar vestindo roupas da grife Thor Steinar, que é popular entre os neonazistas. Patrick Hensel, o dono da HESS, argumentou que nunca lhe ocorreu que sua empresa compartilhava o nome do vice de Hitler, Rudolf Hess, e anunciou que o mudaria.

Em outro incidente, os seguranças de uma festa em um campus universitário em Dresden, em 2012, foram identificados como extremistas de direita. Verificou-se que um conhecido neonazista responsável pelo portal de internet "Irmandade Ariana" estava anunciando serviços de segurança --apesar de a Saxônia ser o único Estado alemão onde a inteligência costuma checar os candidatos a empregos no setor de segurança.

Necessidade de reforma

Mas tudo o que as regulamentações do setor exigem dos candidatos ao setor de segurança é informação fornecida pelo Registro Criminal Central Federal. As regulamentações mais abrangentes só se aplicam a cargos específicos, como seguranças de aeroportos e de reatores nucleares.

Diante dos desdobramentos recentes, vários políticos estão pedindo reformas. "As autoridades que emitem licenças para cada setor precisam ampliar sua cooperação com as agências de segurança domésticas dentro da estrutura legal existente ou precisamos mudar a lei, transferindo a responsabilidade para o Ministério do Interior", diz Hans-Peter Uhl, porta-voz de política doméstica do grupo conservador democrata-cristão no Parlamento federal, o Bundestag.

Michael Hartmann, um especialista em políticas domésticas do Partido Social Democrata de centro-esquerda, também acredita que uma "revisão rigorosa da 'integridade' dos seguranças é necessária, dado quão estreitamente eles trabalham com a polícia em grandes eventos".

Nem mesmo a Associação Alemã dos Serviços de Segurança Particulares faz objeções a controles mais rígidos.
"Checagem cuidadosa por parte das autoridades que emitem licenças é a única forma de os candidatos extremistas serem peneirados desde o início", disse Oliver Arning, da BDSW.


Reportagem de Andreas Ulrich, para a Der Spiegel, reproduzida no UOL. Tradutor:
 George El Khouri Andolfato

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