sábado, 8 de março de 2014

Pesquisa exalta direitos das mulheres soviéticas

Pesquisa exalta direitos das mulheres soviéticas

Estudo da historiadora Wendy Goldman chega ao Brasil no fim deste mês

Para pesquisadora, mulheres de hoje precisam se organizar para conquistar condições justas
 
ELEONORA DE LUCENA DE SÃO PAULO

Mulheres ganham só uma fração do que ganham os homens. Na separação, ficam com os filhos e estão mais pobres. Não têm acesso a boas creches e sofrem com a violência em boa parte do mundo.
"Mudar essa situação é tarefa das mulheres. Elas precisam falar de aborto, estupro, da insegurança de andar à noite na rua. A violência contra a mulher precisar ser inaceitável socialmente. É muito difícil mudar individualmente; é preciso mudar coletivamente."
A avaliação é da historiadora americana Wendy Goldman, 57. Professora da Universidade Carnegie Mellon, em Pittsburgh (Pensilvânia, EUA), ela é autora de "Mulher, Estado e Revolução: Política Familiar e Vida Social Soviéticas, 1917-1936", que sai no fim do mês no Brasil.
O livro, de 1993, aborda as enormes transformações sociais ocorridas na União Soviética nos primeiros anos da revolução de 1917.
Naquele ano, foi estabelecido o divórcio a pedido de qualquer um dos cônjuges (no Brasil o direito só vigoraria 60 anos depois) e o casamento civil substituiu o religioso. A URSS foi o primeiro país do mundo a dar a todas as mulheres a possibilidade legal e gratuita do aborto.
"Operários e camponeses haviam tomado o poder e podiam pensar como construir um mundo melhor. Hoje o sentimento revolucionário, o otimismo e a esperança no futuro não existem da mesma forma. Só, talvez, em pequenos grupos", diz Goldman em entrevista à Folha.
Ela conta que a maior surpresa na sua pesquisa histórica foi constatar que "mesmo camponesas que não haviam tido educação tinham sentimentos fortes sobre igualdade e opressão. Não é preciso ter educação para ter consciência do que está errado".
Naquela época, relata ela, os bolcheviques buscavam formas de transferir para a esfera pública as tarefas domésticas como forma de liberar as mulheres do trabalho "banal, torturante e atrofiante", nas palavras de Lênin. A ideia era multiplicar a criação de lavanderias públicas, comedouros coletivos e creches.
"Os bolcheviques tiveram uma boa ideia, que era tirar o trabalho de casa. Aqui hoje homens e mulheres têm de dividir o trabalho e brigam pelas tarefas domésticas e pelos cuidados com as crianças", afirma Goldman.
Naquele momento, houve muito debate sobre o papel da família. "Eles acreditavam que a família desapareceria em boas condições no socialismo. A família hoje está desaparecendo no capitalismo, mas em condições muito ruins", avalia a historiadora.
"As mulheres são abandonadas com os filhos; se criam famílias só de mulheres: mães, avós, netas. Com baixos salários é muito difícil sustentar uma família. Hoje há mais crianças vivendo na pobreza nos EUA do que há 25 anos", diz.
Para ela, as mulheres precisam de bons salários para que possam ter independência para criar seus filhos e ter participação na vida pública. Condenando a publicidade, ela declara: "Corporações usam os corpos das mulheres jovens para vender seus produtos. Numa sociedade melhor, isso não seria feito".
E qual seria o papel da família no futuro? Goldman responde: "Se a família continuar a se desfazer, será muito ruim. Se homens e mulheres têm bons salários e são capazes de sustentar seus filhos, se têm acesso a uma boa educação, a controles da natalidade e o aborto é legal, não importa se a família continuar a existir ou não, se são casados ou não".

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