terça-feira, 20 de outubro de 2020

Homens como Robinho fazem com que o feminismo, infelizmente, precise existir

 Condenado por estupro pela Justiça italiana, Robinho sacudiu as redes sociais com declarações revoltantes extraídas de interceptações telefônicas e entrevistas. Enquanto feminista, o que mais me revolta é ser obrigada a concordar com alguns trechos. Antes que me cancelem, vamos a eles.

Questionado por um amigo que o teria visto colocar o pênis na boca da vítima, Robinho disse que "isso não significa transar". Longe de mim querer passar pano, mas introduzir o pênis na boca de uma mulher inconsciente, de fato, não é sexo. É estupro.

Robinho também se diz perseguido e se comparou a Bolsonaro. E tá errado? Bolsonaro foi obrigado a indenizar uma deputada por dizer que não a estupraria porque ela não merece, como se a maior violência que uma mulher pode sofrer em vida fosse uma medalhinha de honra ao mérito.

"Estou rindo, porque não estou nem aí, a mulher tava completamente bêbada, nem sabe o que aconteceu." A misoginia risonha e límpida da frase remete à célebre declaração do goleiro Bruno quando questionado sobre o desaparecimento de Eliza Samudio: "Ainda vou rir muito disso tudo".

Infelizmente, ambos têm motivos de sobra para rir, certos de que as consequências não vão fazer nem cosquinha, comparadas à dor que causaram.

Robinho chegou a celebrar contrato com o Santos, e Bruno já cumpre pena em liberdade, agarrando pelo Rio Branco e com selfie com a molecada.

O que nos leva ao fato de Robinho se referir inúmeras vezes aos outros cinco acusados como "garotos". Tinha 28 anos na época, mas acho mais razoável chamá-los de garotos do que de monstros.

A alta concentração de monstros num único grupo de amigos é coincidência muito difícil de comprar. Como diz a canção: perto de uma mulher, são só garotos. Presumidamente inocentes, cheios de sonhos e ainda assim capazes do ato de extrema crueldade como se fosse uma brincadeira, sob consentimento e incentivo da cultura do estupro.

"Infelizmente, existe o movimento feminista." Particularmente, a minha preferida.

O movimento feminista existe porque vivemos em uma sociedade em que homens desumanizam, estupram, assassinam mulheres e seguem impunes. É uma infelicidade que o feminismo precise existir. Mas ele existe, justamente por causa do discurso, e dos atos, de homens como Robinho.


Texto de Manuela Cantuária, na Folha de São Paulo

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