quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Se homens engravidassem, presidente mandaria fabricar pílula abortiva

 Na terceira temporada da série “Veep”, a vice-presidente Selina Meyer, interpretada por Julia Louis-Dreyfus, pressionada a rever sua postura pró-aborto, desabafa. “Se os homens engravidassem, seria possível realizar aborto em caixas eletrônicos.”

A frase viralizou após o lamentável episódio de domingo, envolvendo pessoas de movimentos supostamente “pró-vida” e “pró-família”.

Embora ainda utilizados para depósitos fracionados, como fez o filho do presidente, os caixas eletrônicos entraram em desuso, assim com as agências físicas. Se os homens engravidassem, clínicas de aborto seriam tão frequentes quanto farmácias. Essas sim abrem em cada esquina, shopping, aeroporto e posto de gasolina.

Se os homens engravidassem, realizar um aborto seria como ir à sorveteria. Eles fariam filas na calçada. Pílulas do dia seguinte viriam nos sabores “Cioccolato” e “Fregola com Avocado”.

Se os homens engravidassem, seria possível abortar por aplicativo de delivery. Com um clique no iFood, qualquer rapaz pediria seu aborto junto com um hambúrguer artesanal.

Se os homens engravidassem, anticoncepcionais seriam distribuídos de graça no trânsito e portas de padaria, como panfletos de imobiliária. Não seriam as bombas hormonais que causam depressão
e trombose. Se fossem, dariam um jeito de fazer as mulheres tomarem.

Se os homens engravidassem, menstruação não seria sinônimo de prisão e vergonha. Absorventes como Sempre Livre e Intimus se chamariam Você É Perfeito e Homem que É Homem Menstrua Bonito. Eles escancarariam suas variações hormonais à vontade, socariam paredes e todos diriam que isso é natural do homem. Pera, isso já acontece.

Se os homens engravidassem, o atual presidente mandaria o Exército fabricar pílula abortiva como se fosse cloroquina. Ergueria a embalagem para o pessoal do cercadinho e sairia correndo oferecendo para a ema. Aí sim faria algo pela saúde pública do país.

Se os homens engravidassem, os supostos movimentos “pró-vida” defenderiam, de fato, a vida. Estariam na frente de um hospital para defender uma criança violentada em risco, não a atacar. Lutariam contra adultos abusadores, não menores vulneráveis.

Os homens não engravidam. Mas ainda decidem sobre os corpos das mulheres.


Texto de Flavia Boggio, na Folha de São Paulo

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