sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Assim como as crianças, adultos evitam adotar hábitos de higiene pessoal

 Crianças descontroladas na pandemia já são um problema do passado. Depois de liberarem iPad, celular e refrigerantes irrestritos aos filhos, os pais enfrentam um novo desafio —impor limites a si mesmos.

Segundo pesquisadores, a quarentena está fazendo com que pessoas mais velhas também vivam de forma desregrada. Mas, ao contrário das crianças, os adultos responsáveis são eles mesmos.

“Com a pandemia, marmanjos estão adotando hábitos infantis, como não tomar banho, jantar pipoca e dormir no sofá”, explica o médico Tobias Schultz. “O problema é que, ao dormir sem escovar os dentes, ninguém irá acordá-los.”

É o caso do vendedor Cido Morais, que está há 40 horas seguidas assistindo TV e já acumula oito cáries. “Comecei vendo ‘Grey’s Anatomy’ e, quando percebi, estava havia dez horas dormindo no sofá, ainda calçando sapatos”.

Assim como as crianças, os adultos na quarentena evitam adotar hábitos de higiene pessoal. Eles passam dias sem tomar banho e só lavam as mãos quando alguém está olhando. “Se, em março, roubavam papel higiênico, em agosto desistiram de usá-lo”, lamenta Schultz, que também está há dias com a mesma cueca.

A alimentação desregrada é outra característica. Muitos começaram o confinamento dispostos a ter uma vida saudável. Com o passar dos meses, a alface e a granola foram substituídas por garrafas de vinho. “Tomava uma taça apenas no sábado. Agora, tomo vinho no almoço, uísque no jantar e rebato tudo com um shot de Corote”, justifica o engenheiro José Almeida, que também voltou a fumar.

Para manter a vida em ordem, esses marmanjos agem como se fossem pais de si mesmos, fazendo pequenos acordos. “Se arrumo o quarto, posso comer sobremesa. Se lavo a louça, ganho uma caipirinha. Outro dia, atrasei um trabalho e fiquei sem mesada”, conta Amanda Pereira, dona do perfil “Pipoca É Janta, Sim!”.

O problema é quando os adultos desregrados têm crianças, no sentido literal, em casa. Muitas vezes ocorre uma inversão de papéis. “Meu filho vive reclamando que eu não saio do TikTok”, comenta Pereira, que é mãe de um bebê de oito meses.

“Outro dia, minha filha de 11 anos comentou que eu preciso amadurecer”, conta Almeida. “Mas aí eu gritei ‘você não manda em mim!’ e corri para meu quarto batendo a porta.”


Texto de Flavia Boggio, na Folha de São Paulo

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