terça-feira, 26 de abril de 2011

O Império Colonial Britânico e repressão no Quênia

Guerra suja

Em Londres, um caso em julgamento pelo tribunal de última instância continua a revelar detalhes chocantes da guerra muito suja dos britânicos contra o movimento insurgente Mau Mau, do Quênia -onde, nos anos 50, surgiu um levante muito violento contra o domínio britânico, alimentado, em parte, pela perda de terras aráveis por africanos em benefício de colonos europeus.
No Quênia, como na Palestina, na Malásia, em Áden [Iêmen] e em Chipre, os britânicos contra-atacaram com espantosa brutalidade.
O caso foi apresentado por quatro quenianos idosos que alegam ter sofrido abusos sexuais e sido chicoteados, espancados e castrados, quando prisioneiros dos britânicos. A defesa britânica não nega, mas diz que, quando da independência queniana, em 1963, a responsabilidade judicial pelo ocorrido foi transferida à nova República do Quênia.
Mas 1.500 arquivos removidos do país nove dias antes da sua independência foram localizados dois meses atrás em um depósito secreto da Secretaria do Exterior em Hanslope Park, na zona rural de Buckinghamshire, no Reino Unido.
Os documentos revelados ao tribunal demonstram de que maneira as autoridades britânicas encobriram o que estava acontecendo em campos de detenção que chegaram a ter 100 mil prisioneiros quenianos.
Três mil membros do movimento Mau Mau foram julgados por tribunais especiais, 1.574 foram condenados e 1.090, enforcados. "Se devemos pecar", escreveu Eric Griffiths-Jones, secretário da Justiça da administração colonial do Quênia, "precisamos fazê-lo discretamente".
Até 2010, a Secretaria do Exterior negava a existência desses arquivos. Mas um jovem funcionário de seu departamento africano, Edward Inglett, insistiu em visitar Hanslope Park com um advogado e procurar pelos documentos.
Três dias mais tarde, eles foram "localizados". Fizeram parte das provas apresentadas ao tribunal por David Anderson, professor de política africana na Universidade de Oxford e perito depondo em favor dos queixosos. Ele alegou que os documentos incluíam "descrições detalhadas dos métodos usados, entre os quais tortura física severa".
Nenhum funcionário britânico, civil ou militar, foi investigado ou processado em função disso. Em resposta, William Hague, o secretário do Exterior britânico, prometeu "completa transparência".
Os arquivos também cobrem 37 outros territórios colonizados pelo Reino Unido. Parentes das vítimas de um suposto massacre cometido por soldados britânicos na Malásia colonial requisitaram todos os documentos sobre o caso. Hague declarou em seu comunicado que "a lei não vale apenas em nosso território".


KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Texto publicado na Folha de São Paulo, de 14 de abril de 2011

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