quinta-feira, 2 de agosto de 2012

RS: ex-governador, Britto deseja sorte a Tarso e critica PMDB

Antonio Britto ficou conhecido dos brasileiros depois de anunciar, em 1985, a morte do presidente eleito Tancredo Neves. A partir daquele dia, o jornalista gaúcho deixava de ser o porta-voz do governo para ingressar na política partidária peloPMDB. Foi deputado federal, ministro no governo Itamar Franco e governador do Rio Grande do Sul, eleito com apenas 42 anos. Após não conseguir areeleição e ter ficado em terceiro lugar em uma nova investida, em 2002, ele pediu sua desfiliação e foi trabalhar na iniciativa privada. Mais de dez anos depois, Britto falou com exclusividade ao Terra sobre as suas desilusões com os rumos da política nacional e com o partido que o ajudou a chegar ao governo do Estado.



"Entrei na política nas mãos do doutor Tancredo (Neves), do doutor Ulysses (Guimarães), e do Mario Covas, era um momento muito bonito, depois das Diretas. Mas para mim, com o passar dos anos, houve uma grande mudança no estilo de se fazer política no Brasil. Eu percebi que algumas coisas começaram a acontecer no meu partido e eu não tinha disposição para fazer também. A briga dentro do PMDB me mostrou claramente isso", afirmou o ex-governador ao destacar que a decisão de abandonar a política é definitiva. "Ninguém, nem na minha família, acreditava que fosse para sempre. E eu cheguei à conclusão de que não adiantava dizer que era definitivo, que eu precisava esperar o tempo passar. E hoje já se foram 10 anos, afirmou o ex-porta-voz de Tancredo, que atualmente é presidente-executivo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma).
Britto, que teve como uma das marcas de sua gestão no governo gaúcho a privatização de setores como telefonia e eletricidade, disse que o modelo serviu de exemplo para gestores de todos os partidos e ainda criticou a dificuldade de se encontrar consensos em um Estado polarizado como o Rio Grande do Sul. "Só existe um Estado grande onde todos os partidos grandes foram governo, só existe um Estado grande onde nenhum partido se reelegeu. E só existe um Estado grande onde nenhum processo de reforma foi concluído", disse ao desejar sorte ao atual governador, o petista Tarso Genro, um de seus maiores opositores. "Que o governador Tarso faça sempre o melhor", afirmou ao completar que seu único partido é o " Grêmio Foot-ball Porto-alegrense".
Terra publica desde segunda-feira uma série de entrevistas com personalidades da política nacional que abandonaram seus partidos depois de terem ocupados cargos públicos de destaque, como governadores, deputados e senadores. A seguir, confira os principais trechos da terceira reportagem da série:
Terra - Depois de ter sido deputado, ministro, governador, o que o levou a abandonar a política?
Antonio Britto - 
Eu entrei para a política muito jovem. Me elegi deputado constituinte com 34 anos e governador com 42 anos. Digo isso porque quando saí do governo eu tinha que tomar a decisão entre transformar a política como uma carreira, um meio de vida, ou retornar à minha origem, que era na iniciativa privada. E já na época a política dava sinais de que estava mudando muito, mudando para pior.
Terra - O senhor teve alguma decepção com a política?
Britto - 
Quem se elegeu governador com 42 anos não pode falar em decepção, mas eu me lembro, por exemplo, da briga que eu tive dentro do PMDB. Era uma briga com pessoas que estão até hoje no comando do PMDB.
Terra - Essa sua briga tem relação ao comando do senador Pedro Simon no PMDB gaúcho?
Britto - 
Não, a minha briga não era com ele, era em nível nacional. Depois daquele período de Diretas, Constituinte e impeachment do Collor parece que a política brasileira entrou numa outra fase. Nessa época, eu tinha saído do governo estadual, tinha que decidir se ficaria na política como uma carreira e se queria participar dessa mudança que a política estava passando para pior. E a minha decisão foi não e não. Eu não queria fazer da política uma carreira e eu não queria participar de algumas coisas. Então eu saí, mas a única diferença é que saí com os dois pés. Ninguém, nem na minha família, acreditava que fosse para sempre. E eu cheguei à conclusão de que não adiantava dizer que era definitivo, que eu precisava esperar o tempo passar. E hoje já se foram 10 anos.
Terra - Hoje o senhor reafirma que é para sempre?
Britto - 
Sim. Eu não tenho filiação partidária há 10 anos e hoje não teria nem condições legais de concorrer a um cargo.
Terra - O senhor continua votando no Rio Grande do Sul?
Britto - 
Não. Eu tive de transferir o meu título para São Paulo, por uma questão legal. Isso me doeu muito. Para trabalhar eu precisei me mudar para São Paulo e pela legislação, você não pode morar num local e trabalhar em outro. Então, a partir do ano passado eu não sou, com tristeza, eleitor do Rio Grande do Sul.
Terra - Por que essa tristeza...
Britto - 
Eu queria continuar votando no meu Estado, manter essa relação, mas tem o meu trabalho.
Terra - Com quem o senhor brigou no PMDB?
Britto - 
Eu seria incoerente em fazer comentários políticos, se eu estou fora da política. O que eu estou dizendo é que entrei na política nas mãos do doutor Tancredo (Neves, presidente eleito do Brasil em 1985 que morreu antes da posse), do doutor Ulysses (Guimarães, deputado, presidente do PMDB, morreu em 1992) e do Mario Covas (um dos fundadores do PMDB, foi governador de São Paulo já no PSDB), era um momento muito bonito, depois das Diretas. Mas para mim, com o passar dos anos, houve uma grande mudança no estilo de se fazer política no Brasil. Eu percebi que algumas coisas começaram a acontecer no meu partido e eu não tinha disposição para fazer também. A briga dentro do PMDB me mostrou claramente isso.
Terra - Que tipo de coisa lhe incomodava?
Britto - 
Eu prefiro dizer assim: era visível que a política estava entrando em uma nova fase, uma fase pior. Mas não tenho nenhuma vontade de fazer maiores comentários políticos.
Terra - A campanha para a reeleição no governo estadual em 1998, em que o senhor foi derrotado para o petista Olívio Dutra, foi desgastante por causa da forte polarização entre o PMDB e o PT no Estado?
Britto - 
Não, de forma alguma, isso é do jogo. Em política você ganha e você perde. É óbvio que perder é mais desgastante do que ganhar. Mas no Rio Grande do Sul, até ganhar é desgastante por causa dessa disputa. O Rio Grande do Sul é um Estado tão diferente dos demais que eu não sei até o que é mais desgastante, se é ganhar ou perder.
Terra - Então ganhar foi desgastante para o senhor?
Britto - 
Não quero entrar nesses detalhes. Só fica a frase: o Rio Grande do Sul é tão diferente, que não sei o que é mais desgastante: ganhar ou perder.
Terra - Passados todos esses anos, o senhor acredita que o Rio Grande do Sul ainda tem dificuldades de encontrar consensos?
Britto - 
Eu gosto de dizer brincando que se tiver eleição na Nasa (Agência Espacial Americana, na sigla em inglês), vai ter dois comitês em Porto Alegre, um de cada chapa. Essa é uma tradição gaúcha que envolve um aspecto bonito, que é o sentimento de participação, mas que talvez tenha passado do ponto, levando a uma impossibilidade de geração de consenso. Do jeito como a vida é complicada, especialmente no Rio Grande do Sul, sem consenso se anda em círculos. Só existe um Estado grande onde todos os partidos grandes foram governo, só existe um Estado grande onde nenhum partido se reelegeu. E só existe um Estado grande onde nenhum processo de reforma foi concluído.
Terra - Após perder a reeleição, o senhor recusou-se a transmitir o cargo para o seu sucessor. Por que dessa decisão?
Britto - 
Para evitar pancadaria na frente do Palácio. Esse é um episódio que já foi explicado, a gente tentou de todas as formas assegurar uma transição civilizada e eu achei preferível sofrer o desgaste de não transmitir o cargo do que ajudar a estragar um dia festivo por conta do radicalismo de quem tinha ganho.
Terra - Por que, após a derrota, o senhor decidiu trocar o PMDB pelo PPS?
Britto - 
Saí por causa dessa insatisfação com o PMDB. Eu tentei ajudar a construir um caminho novo, envolvendo o PPS, PDT e PTB.
Terra - O senhor concorreu novamente ao governo do Estado pelo PPS e perdeu no primeiro turno. O senhor avalia essa decisão de trocar de partido como acertada?
Britto - 
Claro que sim. A gente sempre toma a decisão acertada, no sentido de que se achasse que era errado não tomaria. Com os dados da época, tomaria a mesma decisão. E foi uma decisão coletiva, de um grupo, não foi só minha.
Terra - O seu governo foi muito criticado pela oposição, principalmente pelo PT, por causa das privatizações. O senhor acha que isso ficou como uma marca negativa da sua administração no Rio Grande do Sul?
Britto - 
Esse tema, depois que todo mundo passou a fazer, acho que deixou de ser uma pauta de discussão. Na época, como ninguém fazia, deu muito debate. Mas depois que governos de diversos partidos começaram realizar as privatizações, tenho a impressão de que perdeu um pouco toda essa polêmica. Tanto que esse tema só reaparece nas vésperas de eleição. Nos três anos e meio entre uma eleição e outra, todo mundo fica concedendo e privatizando, mas chega na eleição muitos são contra. É um fenômeno religioso, ressuscita a cada três anos e meio.
Terra - Mesmo não estando filiado, o senhor tem simpatia por algum partido?
Britto - 
Tenho.
Terra - Por qual? Britto - Grêmio Futebol Clube Porto-alegrense (risos).
Terra - O que o senhor acha da atuação da presidente Dilma Rousseff?
Britto - 
Eu acho que ela tem tido muita coragem em enfrentar algumas práticas políticas que são exatamente as mesmas práticas das quais eu estava falando agora a pouco quando eu citei o PMDB nacional. Nada mudou, só tem piorado. Então eu acho que ela tem tido coragem de enfrentar isso. Também acho que ela tem tido mais dificuldade (do que o ex-presidente Lula) porque o cenário mundial mudou bastante e o Brasil insiste em não fazer o dever de casa, que passa por reformar a educação, a política e a previdência.
Terra - E sobre a atuação do governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT)?
Britto - 
Eu não sou mais eleitor do Rio Grande do Sul, não falo sobre o Estado.
Terra - O governador Tarso rompeu com os contratos de pedágios nas rodovias gaúchas, modelo criado na sua gestão e criticado pelo petista. O que o senhor acha disso?
Britto - 
Eu não tenho acompanhado isso. Apenas desejo boa sorte nesse assunto e em qualquer outro. Que o governador Tarso faça sempre o melhor. Torço para que tudo dê certo.
Terra - O senhor continua visitando o Estado?
Britto - 
Sim, minha família está toda lá. Mas vou menos do que eu gostaria por causa do trabalho. E quarta e domingo eu assisto aos jogos do Grêmio.
Terra - Como torcedor fanático, existe a possibilidade de retornar ao Estado e assumir a direção do Grêmio, como já foi cotado em outras oportunidades?
Britto - 
Não, de jeito nenhum. Eu só quero voltar ao Estado para a inauguração da Arena (o novo estádio do time que será concluído no final deste ano).
Terra - Após esses mais de 10 anos na iniciativa privada, como o senhor avalia o setor público?
Britto - 
Para mim existe uma diferença simples entre a iniciativa privada e o setor público: no público você quase não tem liberdade para fazer, mas corre menos riscos. No privado você tem mais liberdade para fazer, e em compensação corre mais riscos. Obviamente para mim o trabalho no setor público é mais gratificante e mais honroso, mas não acho que um seja mais difícil ou mais fácil, o que há são diferenças.

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