segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Presidente de El Salvador pede perdão por chacina ocorrida na guerra civil


Presidente de El Salvador pede perdão por chacina ocorrida na guerra civil

Juan José Dalton
El PaísEm San Salvador (El Salvador)

O exército matou mil pessoas em 1981, a metade delas menores

O presidente de El Salvador, Mauricio Funes, com palavras entrecortadas e olhos vermelhos, qualificou como "barbárie" o que na história da guerra civil salvadorenha é conhecido como o massacre de El Mozote. A chacina, ocorrida entre 11 e 13 de dezembro de 1981 e executada por soldados do Batalhão Contrainsurgente Atlacatl, tirou a vida de cerca de mil pessoas, a metade delas menores de idade.
"Aqui foram cometidos inúmeros atos de barbárie e violações dos direitos humanos: inocentes foram torturados e executados; mulheres e meninas sofreram abusos sexuais e centenas de salvadorenhos e salvadorenhas hoje fazem parte de uma longa lista de desaparecidos, enquanto outros tiveram de emigrar e perder tudo para salvar suas vidas", disse Funes diante de centenas de moradores do município de Meanguera, onde se situa El Mozote.
O presidente teve um gesto sem precedentes: mencionou os chefes responsáveis pelo que é considerado o maior massacre já ocorrido em países latino-americanos que sofreram conflitos armados. "O tenente-coronel Domingo Monterrosa, comandante daquele batalhão; seu segundo no comando, o major José Armando Azmitia Melara; o chefe de operações, o então major Natividad de Jesús Cáceres Cabrera" tiveram, segundo Funes, responsabilidade específica.
El Mozote e os casarios a seu redor, a cerca de 175 quilômetros a leste da capital salvadorenha, eram habitados por agricultores pobres. Sua proximidade dos acampamentos da guerrilha Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN) os transformou em "suspeitos" de ser a base da insurgência. Por isso o exército os dizimou selvagemente em operações de "terra arrasada" que aprendera nas bases americanas, onde assimilou práticas que os EUA haviam aplicado no Vietnã. Houve outros massacres de agricultores como os de Río Sumpul, Guajoyo, El Junquillo e El Calabozo. E o exército também matou seis padres jesuítas, quatro freiras americanas e quatro jornalistas holandeses.
Durante a guerra também ocorreram massacres contra a Zona Rosa, onde morreram 13 pessoas, entre elas quatro fuzileiros navais americanos, e o chamado massacre de Mayo Sibrián, provocado por um comandante rebelde que assassinou cerca de 800 guerrilheiros e colaboradores que considerou "inimigos infiltrados".
Funes não só reconheceu os fatos como pediu perdão aos sobreviventes e parentes em nome do Estado salvadorenho. Ao mesmo tempo, instruiu os chefes das forças armadas para que façam "uma revisão de sua interpretação da história à luz deste reconhecimento".
Até o momento, o tenente-coronel Monterrosa e seus subalternos em Atlacatl, que morreram em um atentado guerrilheiro, são considerados heróis para o exército. "Exatamente porque 20 anos depois dos acordos de paz estamos diante de uma instituição militar diferente, profissional, democrática, obediente ao poder civil, não podemos continuar apresentando como heróis da instituição e do país chefes militares que estiveram envolvidos em graves violações dos direitos humanos."
Ele fez um apelo aos partidos políticos para que substituam hinos e lemas que façam referência à violência no país. O hino do partido Aliança Republicana Nacionalista (Arena), por exemplo, chama a transformar El Salvador em "uma tumba onde os vermelhos terminarão".
O presidente também pediu a promotores e juízes que acabem com a impunidade histórica que existiu em El Salvador, amparada na anistia geral de 1993, decretada pelo então presidente Alfredo Cristiani.
Finalmente, Funes fez anúncios importantes para a população de Morazán, que já foi zona de guerra. Será implementada uma série de projetos de saúde, educação, infraestrutura viária e apoio aos pequenos empresários para as comunidades estabelecidas em El Mozote e arredores.
A guerra salvadorenha começou em 1980 devido ao assassinato do arcebispo Oscar Romero, deixando 75 mil mortos e 8 mil desaparecidos. A ONU mediou um processo de negociação que durou mais de dois anos, até que foi assinada a paz em 16 de janeiro de 1992, há 20 anos.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves



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