segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Se STF acertou nos casos de Delcídio e Cunha, Aécio deveria estar preso

O Supremo Tribunal Federal não conseguiu explicar à opinião pública por que Aécio não foi preso como foi Delcídio do Amaral. Tampouco conseguiu explicar por que suas decisões contra Aécio terão que ser referendadas pelo Senado, rota de fuga que foi fechada para Eduardo Cunha.
Se as decisões sobre o candidato da direita na última eleição presidencial estiverem corretas, as decisões sobre Delcídio e Cunha estavam erradas. Se as decisões sobre Delcídio e Cunha estavam certas, Aécio deveria estar preso.
Não sou constitucionalista, não tenho a pretensão de saber qual é o caso. Mas é evidente que, se todas essa decisões foram constitucionais, o Brasil teve outra Constituição durante a guerra para derrubar Dilma Rousseff.
Não se trata, apenas, de um político corrupto escapando da Justiça. O caso de Aécio é representativo de uma tendência muito mais grave: desde que o PT caiu, a maré anti-corrupção virou.
Delcídio caiu porque era petista, Cunha caiu porque foi pego antes de a maré virar (e, mesmo assim, só depois de ter derrubado Dilma). Aécio é tucano, do grupo que subiu ao poder com Temer. Não é Aécio que tem mais capacidade de resistir à Lava Jato: é a coalizão conservadora que chegou ao poder após o impeachment.
Não é, portanto, possível descartar a hipótese de que a direita fisiológica regula a margem de ação das instituições brasileiras conforme sua conveniência.
Depois da decisão, o mundo caiu sobre a cabeça do STF, que foi acusado de não estar à altura de sua função constitucional. Bom, tem o Gilmar, mas, mesmo assim, não acho que essa seja a melhor análise.
Se a ministra Cármen Lúcia deu seu voto em favor de Aécio por temer uma guerra contra o Senado, sua leitura da situação estratégica estava correta: no momento, o Supremo Tribunal Federal é muito mais fraco que o conjunto dos senadores.
Durante a breve vigência da Constituição de 2015, o Supremo conseguiu derrubar corruptos importantes porque, na luta para derrubar Dilma Rousseff, nenhum dos analistas que hoje se preocupam com equilíbrio institucional dava a mínima para isso. Os empresários, que hoje só querem estabilidade, inflavam patos e os ânimos. Os partidos de direita que bradavam contra Delcídio hoje são o governo e têm como prioridade se livrar da cadeia, nem que para isso tenham que livrar também os petistas que derrubaram.
E a opinião pública? Como dizia Millôr Fernandes, opinião pública é a que se publica. Se o mestre, no céu dos colunistas, nos permitir uma atualização, opinião pública é a que se posta em redes sociais. Desde a guerra do impeachment, a opinião postada está sob controle da chamada Nova Direita, essa turma que não consegue mais emprego como roqueiro, ator pornô, filósofo ou militar, e descobriu que falar mal da esquerda rende um trocado.
E onde estava a Nova Direita durante o período que antecedeu o julgamento de Aécio? Estava fechando exposições de temática LGBT. A indignação que, em 2015, teria se voltado contra Aécio, agora caiu sobre o peladão do museu. O que era, é claro, o plano.
Desde que o Senado perdeu o medo da opinião pública, voltou a ser forte o suficiente para quebrar o Supremo. E enquanto a opinião pública brasileira continuar sendo a Marcha do Orgulho Otário, não adianta reclamar.


Celso Rocha de Barros, na Folha de São Paulo

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