quarta-feira, 15 de maio de 2013

Importação de médicos



Os médicos estão revoltados com o governo brasileiro, que pretende importar 6.000 profissionais de saúde cubanos para trabalhar em lugares onde existem vagas e elas não são preenchidas. Para nossos valorosos doutores, a medida ameaça a saúde pública.
Tenho uma visão menos dramática. É verdade que o plano do governo dificilmente funcionará. As prefeituras mais remotas nas quais a falta de médicos é crônica já oferecem há tempos um salário bem acima da média do mercado. Se nem assim conseguem atrair e reter o profissional, é porque o problema não está restrito a vencimentos. O médico não fica porque as condições de trabalho ali são precaríssimas.
Os cubanos até poderão resistir por mais tempo nessa situação, mas, se nada for feito para resolver as dificuldades estruturais, estaremos apenas fingindo que oferecemos um atendimento decente. A substituição da mão de obra local por um exército de reserva, se é lícito utilizar o vocabulário marxista, não passa de um paliativo.
A grita contra os cubanos, contudo, é em larga medida uma reação corporativista. Mesmo que eles não tenham uma formação comparável à dos brasileiros, num raciocínio bem consequencialista, é melhor para o sujeito que procura um serviço de saúde ser atendido por alguém que tenha algum conhecimento do que ficar sem assistência nenhuma.
Cabe ainda perguntar quais seriam os resultados se os médicos brasileiros fossem submetidos à mesma prova que fazem os estrangeiros que tentam validar seu diploma. Os números do último exame do Cremesp não autorizam muito otimismo.
No mais, associações e conselhos médicos insistem na tese de que o Brasil já tem mais profissionais do que precisa sem nunca tê-la demonstrado. É natural que entidades de classe digam isso. O governo deve ouvir seus argumentos, mas não necessariamente atender a seus pleitos.


Texto de Hélio Schwartsman, na Folha de São Paulo.

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