Nenhuma empresa simboliza tão bem o poderio industrial alemão quanto a Daimler, fabricante dos automóveis e caminhões Mercedes-Benz. Por isso, quando a companhia disse no final de abril que finalmente também foi apanhada pelo redemoinho da crise econômica europeia, foi um sinal sombrio para todo o continente, ou mesmo o mundo.
Os exportadores alemães como a Daimler têm sido bastiões de estabilidade em um continente sufocado por bancos abalados, governos disfuncionais e legiões de jovens desempregados -para não falar na pior crise da indústria automobilística nos últimos 20 anos. A sombria previsão da Daimler para 2013 foi a última evidência de que a Alemanha e outros países relativamente saudáveis, como Áustria e Finlândia, correm o risco de cair na recessão que aflige seus vizinhos ao sul.
A desaceleração na Alemanha já era sugerida pelos meses de declínio da produção industrial, disse Carl B. Weinberg, economista-chefe da High Frequency Economics em Valhalla, Nova York.
"A União Europeia tornou a Europa uma economia muito mais coesa, o que é bom quando as coisas estão subindo", disse. "Mas quando as coisas estão descendo o multiplicador é muito forte. Uma maré vazante faz todos os navios baixarem."
Com apenas mais um trimestre consecutivo de queda da produção econômica, a Alemanha entraria oficialmente em recessão. O mesmo vale para Bélgica, França, Luxemburgo, Áustria e até Suécia e Finlândia. A Holanda já sofreu dois trimestres de declínio.
Novas evidências de que a recessão europeia se expande surgiram em março, quando se registrou novo aumento do índice de desemprego na zona do euro, atingindo o recorde de 12,1%. A taxa de desemprego subiu 0,1% em relação a fevereiro, quando foi anotado o recorde anterior, segundo a Eurostat, agência de estatísticas da UE, em Luxemburgo. Um ano antes, o índice era de 11%.
Dois países estão vacilantes, com um desemprego em nível de depressão: a Grécia teve um índice de 27,2% em janeiro, o último mês para o qual há dados disponíveis; e a Espanha registrou 26,7% em março.
"A realidade é que a Europa ainda enfrenta graves vulnerabilidades que -se não forem atacadas- poderão degenerar em um cenário de estagnação", disse David Lipton, vice-diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional.
A Alemanha e os outros 26 países da UE representam a segunda maior economia do mundo, e o bloco é o maior parceiro comercial dos Estados Unidos. Um novo atraso na recuperação europeia causado por uma recessão na Alemanha prejudicaria seriamente o crescimento nos EUA, Ásia e América Latina.
O crescimento que resta na região vem principalmente de países da Europa do Leste. A Polônia é protegida por seu grande mercado interno e um sistema bancário saudável. Depois de uma severa recessão que começou em 2008, o crescimento está se recuperando nos países Bálticos (Estônia, Lituânia e Letônia).
Um fato positivo é que essas economias, com exceção da Estônia, não usam o euro como moeda. Elas podem ajustar mais facilmente suas moedas às mudanças de condições econômicas.
Na Alemanha, pesquisas mostram que as empresas estão ficando pessimistas. "O mercado alemão não pode se desligar de seu ambiente", disse para analistas o diretor financeiro da Daimler, Bodo K. Uebber.
O problema para o resto da Europa é que qualquer esperança de recuperação se sustenta em uma economia alemã robusta. Empresas da Espanha e da Itália dependem da demanda alemã para compensar a queda dos gastos dos consumidores em seus países.
"Em minha área há algumas empresas que trabalham 100% para atender à Alemanha", disse Mario Moretti Polegato, fundador e executivo-chefe da Geox, um fabricante de calçados em Montebelluna, Itália, perto de Veneza.
Enquanto a situação econômica piorava, o Banco Central Europeu cortou em 2 de maio sua taxa de referência de 0,75% para um recorde de 0,5%, como se esperava. Mas continuou contrário a empregar armas mais poderosas que, segundo muitos economistas, são necessárias para dar um empurrão na economia do continente.
É improvável que o corte de juros afete um problema mais fundamental na zona do euro: a falta de crédito nos países que mais necessitam. Enquanto isso, empresas italianas como a fabricante de pneus Pirelli cortam empregos na Europa e investem na Ásia e outros mercados.
Polegato disse acreditar que a criatividade e o design italianos acabarão vencendo. Mas ele parecia menos seguro sobre as perspectivas de um governo melhor. "Muitos políticos italianos não têm tato para a economia real ou os negócios", ele disse.
Reportagem do The New York Times, reproduzida na Folha de São Paulo.
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