sexta-feira, 10 de maio de 2013

'Tsunami chinês' nas eleições legislativas reforça racismo na Malásia


A Malásia tem muitas identidades. Essa diversidade a torna complicada de governar: mais de 60% dos malásios são malaios "étnicos", de religião muçulmana. Vinte e cinco por cento são chineses e praticam o budismo, o cristianismo ou o confucionismo. Eles chegaram à península durante a colonização britânica. Assim como os indianos (8%), em sua maioria hindus, que dividem o resto do espectro demográfico com populações indígenas.
As eleições de domingo (5), longe de terem contribuído para unir os malásios, reforçaram o caráter étnico do cenário político: a polarização entre os malaios, dominantes, e as minorias chinesas e indianas parece mais aguda do que nunca.
A Barisan Nasional (BN, "frente nacional"), coalizão no poder desde a independência de 1957, pode ter novamente vencido por pouco as eleições legislativas, mas desta vez praticamente perdeu o apoio das minorias. Até hoje, alguns chineses ainda votavam em um partido que os representava dentro dessa coalizão composta de quinze partidos diferentes.
Desta vez, eles deram quase todos seus votos a um dos três partidos da coalizão da oposição, o Partido de Ação Democrática, dirigido em sua maior parte por chineses. Os indianos também votaram em massa em um dos três partidos dessa mesma coalizão, Pakatan Rakyat ("aliança do povo").
"Foi um tsunami chinês", exclamou após a apertada vitória da coalizão governamental do primeiro-ministro Najib Razak. Ele foi obrigado a reconhecer que os descendentes dos "filhos do céu" votaram contra ele. Mas a expressão foi infeliz e a internet se apoderou dela com deleite e furor, num país onde quase metade dos 30 milhões de malásios se encontra no Facebook. O comentário do chefe do governo já foi chamado de "racista".
Essa tendência é preocupante. Mas não é novidade: a Barisan Nasional representa um poder que instrumentaliza as diferenças étnicas, contribuindo para reforçá-las. Há cerca de quarenta anos, uma política de discriminação positiva instituindo um sistema de cotas beneficiou sobretudo os malaios. Chineses e indianos ficaram frustrados: eles não tinham as mesmas vantagens que a maioria malaia para ingressar no funcionalismo público, nas universidades, para receber bolsas de estudos, moradia popular etc.
O primeiro-ministro, no entanto, havia bolado o slogan "Uma Malásia" durante a campanha eleitoral, para mostrar que o país era unido e que todos os malásios eram tratados de forma igual, independentemente de sua "raça" ou religião. Ciente de que representa um sistema corrupto de tendências autoritárias, ele insistiu no fato de que a eleição se daria de forma transparente. Nos últimos tempos, ele também alterou leis que atentavam contra a liberdade por permitirem prender sem julgamento opositores do regime sob acusação de "insurreição".

Auxílios, presentes e recompensas

Mas essas pequenas reformas foram vistas como "cosméticas" pela oposição e pelas ONGs de defesa de direitos humanos que vêm se organizando de maneira cada vez mais eficiente e que trouxeram à tona uma sociedade civil dinâmica e obstinada. Já a "transparência" eleitoral foi vaiada pela oposição: seu líder, Anwar Ibrahim, um malaio muçulmano moderado, declarou que não aceitava os resultados e convocou os malásios a se mobilizarem com "ímpeto" contra o governo. Após a eleição, muitos dentre a minoria passaram a temer que a "fratura racial" se ampliasse.
Ninguém se esqueceu dos terríveis tumultos de maio de 1969, quando uma onda de violência entre etnias tomou conta da capital Kuala Lumpur. Provavelmente quase 200 pessoas, sobretudo chineses, vistos como ricos demais pelos malaios, morreram.
Na época o governo havia tomado como pretexto o desequilíbrio de nível de vida entre malaios e chineses para lançar sua "nova política econômica": como muitos malaios eram camponeses pobres, às vezes analfabetos, era preciso conceder-lhes vantagens para que eles pudessem subir socialmente. Já os chineses, instruídos, herdeiros de uma civilização milenar, comerciantes talentosos e enriquecidos, não precisavam disso...
A realidade é mais complexa: ainda existe uma população de chineses pobres nas províncias. Mas os malaios retorquem dizendo que os chineses ainda controlam boa parte das riquezas do país. Todavia, muitos malaios enriqueceram graças a um governo que distribui subsídios, auxílios, presentes e recompensas a seus partidários.
Oitenta e cinco por cento dos funcionários públicos, tirando os professores, são malaios. Setenta e cinco por cento das universidades reservam suas vagas para os bumiputras, os "filhos da terra".
O voto dos malaios da zona rural pode ter beneficiado o governo atual, mas um número crescente de malaios urbanizados também rejeitou a BN, que nunca havia obtido tão poucas cadeiras e nem mesmo ganhou a maioria dos votos: ele conseguiu menos de 50% dos votos, mas dispõe de 133 das 222 cadeiras do Parlamento!
Na realidade, ele só deve sua vitória a um zoneamento eleitoral que super-representa o voto rural, o que beneficia a coalizão dirigente. Agora é fácil para a oposição taxar esta última de "ilegítima".

Bruno Philip, para o Le Monde, reproduzido no UOL. Tradutor:
 Lana Lim

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