sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Tetinha

 Conheci o Tetinha na Redação de uma revista semanal de notícias. Eu trabalhava com a equipe de marketing, mas, porque estava arrependida da minha formação, me enfiava nas reuniões de pauta e achava aquele universo fascinante. Eu queria escrever para a publicação, e não inventar títulos idiotas para vendê-la. Tetinha era bem mais velho do que eu e gostava bastante de cultivar uma aura de lenda viva do jornalismo por onde passasse. Colecionava prêmios e era famoso por circular de vermelho trechos do texto de todo mundo e escrever em caixa-alta um NÃO cheio de exclamações dramáticas.

Não sei se me faltava experiência ou se faltavam, às incipientes redes sociais, as feministas. O fato é que, aos 25 anos, eu achava a sua empáfia a coisa mais sexy do mundo. Além de tudo, Tetinha era triatleta, tinha a voz grossa e dizia ter sido fiel à ex-esposa durante os 20 anos em que foram casados.

“Olha, querida, se você quer mesmo escrever, esquece esse mundinho ridículo da publicidade e começa com textos de verdade.” E foi o que eu fiz: abri mão de um bom salário e virei sua estagiária. Depois, sem dinheiro pra pagar o condomínio (em uma idade bastante ridícula pra pedir a ajuda da mãe), eu tive que voltar a trabalhar em agência por um tempo. O que foi ótimo, porque aproveitei a distância profissional e chamei o Tetinha para jantar.

Até esse dia, acho importante dizer, Tetinha ainda não tinha esse apelido. Ele era o sr. “um sobrenome muito másculo”, e eu passava mal só de imaginar uma noite inteira com ele. Quantas coisas aquele homem poderia me ensinar sobre a vida, sobre os livros e, principalmente, sobre os prazeres ainda não revelados ao meu corpo neófito na arte do amor? Sei que estamos em 2021, e chamar um cara de “pica das galáxias” e dizer que ele “põe o pau na mesa” não pega bem. Mas pense em mim lá por meados de 2005 e me perdoe: minha libido ainda via esse sujeito poderoso pelos olhos da admiração falocêntrica.

Depois do jantar fomos para o meu pequeno apartamento, e Tetinha, que ainda não tinha esse apelido (mas o teria em alguns minutos), começou a esfregar seu torso no meu enquanto nos beijávamos. Primeiro eu ri, achando que ele estava tão soltinho que acabara de inventar uma espécie de forró que se dança sentado; depois fiquei preocupada, achando que ele era alérgico a frutos do mar e estava convulsionando.

Como ele não ria nem parecia doente, segui no intuito de comer aquele senhor quando Tetinha, que ganharia o apelido em segundos, começou a encaminhar minha mão para algum lugar e… opa será que é o pênis? Opa é agora! E foi então que finalmente alcancei, com a ajuda de Tetinha (o apelido chegaria em 3, 2…), o seu mamilo intumescido. “É isso mesmo?!”, perguntei, confusa. E ele me explicou que não ligava muito pra sexo, o lance dele era a teta. E me pediu, quase chorando, que eu a manipulasse por algum tempo. Nem pra dizer peito. Ele disse TE-TA. Aquela voz outrora vigorosa, que tanto me ensinara sobre Hunter S. Thompson, Nanni Moretti e Keith Jarrett, agora me pedia pra fazer uma espécie de pinça com os dedos e friccionar seus mamilos como se eu quisesse obter uma pequena bolinha de ranho: “Desculpa, mas só vai funcionar se com a mão esquerda você fizer no direito e com a mão direita você fizer no esquerdo”. Por insistência, me submeti a isso, na esperança de que algum gênio ainda saísse daquela lâmpada emasculada.

Quando, por fim, Tetinha atingiu o clímax, eu já estava com tendinite nos dedões e minha vontade de rir era maior do que a de amar a complexidade humana. Levei-o até a porta e ele me pediu que, caso um dia eu fosse escrever sobre isso, que esperasse pelo menos 15 anos. Eu era só uma menina e obedeci.


Texto de Tati Bernardi, na Folha de São Paulo

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