Acaba de ser publicado um livro extraordinário, que faz uma exploração cirúrgica no corpo da economia chinesa. Expõe os subsídios que ela tem inteligentemente manipulado sob a miopia da OMC (Organização Mundial do Comércio), para a presidência da qual foi eleito agora um bri- lhante e competente diplomata brasileiro, o embaixador Roberto Azevedo.
Trata-se do "Subsidies to Chinese Industry", de U.C.V. Haley e G.T. Haley (Oxford University Press). Sua tradução mereceria um estímulo da Confederação Nacional da Indústria, para que todos os brasileiros pudessem conhecer como funcionam os "mercados" inseridos numa estrutura de capitalismo de Estado.
O livro é o trabalho de uma dupla de detetives que vão juntando as peças de um quebra-cabeça e autopsiando um corpo vivo e vibrante como é a estrutura produtiva chinesa.
Analisa quatro setores: a indústria do aço, do vidro, do papel e de autopeças. Traz à luz do dia os imensos subsídios escondidos (alguns de características insuspeitadas) que promoveram a expansão industrial chinesa no comércio exterior.
Neste "suelto", tentamos apenas abrir o apetite dos leitores interessados em saber por que a nossa indústria siderúrgica patina e sucumbe, amassada pela produção chinesa. E como ela foi amputada das condições isonômicas de competição pela lamentável política econômica executada depois do necessário e bem-sucedido processo de privatização do setor.
O avanço da produção chinesa de aço foi avassalador: em 1999, antes de sua entrada na OMC, ela representava menos do que 16% da produção mundial; em 2006, menos de 35% e em 2012, quase 50%! Hoje, ela é superior a 700 milhões de toneladas, enquanto a nossa não passou de 35 milhões de toneladas em 2012. O volume dos subsídios (sem falar no câmbio) é gigantesco. Desde aumentos de capital para cobrir prejuízos; empréstimos a taxas de juros muito baixas e que não precisam ser "performados", feitos pelo Banco de Desenvolvimento da China; interferência do governo no custo do trabalho, até no custo da energia.
Entre 2000 e 2008, eles foram da ordem de 3 bilhões de dólares por ano. É claro que, mesmo sem esses benefícios, a indústria de aço chinesa teria se desenvolvido, mas a uma taxa menor, principalmente se tivesse de submeter-se às condições da OMC.
É ainda mais claro, entretanto, que ela foi produto de uma decisão política do governo. A China não se tornou o que é, o maior produtor e exportador de aço, por acidente ou porque usou o mercado para aproveitar suas "vantagens comparativas". Foi produto de subsídios, vontade férrea e ação inteligente do governo.
Texto de Antonio Delfim Netto, na Folha de São Paulo.
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