sexta-feira, 12 de julho de 2013

Jango no exílio

Está nas melhores casas do ramo meu livro “Jango, a vida e a morte no exílio” (L&PM). Olho o volume sobre a minha mesa e quase não acredito. Eu o fiz. Quase fui consumido por esse trabalho de três anos de pesquisa, mais de dez mil páginas de documentos lidas, entrevistas, viagens, encontros com quem conviveu com Jango, visitas a prisões de alta segurança, o ponto de vista da família, longas conversas com Christopher, neto do presidente deposto pelo golpe militar, tudo, uma montanha de dados.

Ao longo da pesquisa, firmei minhas convicções: Jango foi um herói que teve a grandeza de não jogar o Brasil numa guerra civil. Foi também um reformista de visão derrubado porque estava fazendo o Brasil correr um grande perigo: ser melhorado quando a oligarquia ainda se sentia forte para sugá-lo durante mais algumas décadas. A reforma agrária, mais do que tudo, derrubou João Goulart. Ela serviu de estopim para a ação orquestrada e financiada pelos norte-americanos. Jango quis completar o trabalho de Getúlio levando a legislação trabalhista para o campo. As suas reformas de base eram tão progressistas e necessárias que apavoraram as elites retrógradas do país, que encontraram na ameaça comunista disseminada pela propaganda americana o fator de mobilização da mídia e da classe média para destituir o governo, não pelo que tinha de ruim, mas pelo que poderia vir a fazer de bom.

Historiador vive de documentos. Eu mergulhei numa tonelada deles, muitos ainda mantidos longe dos olhos dos brasileiros. Pude, por exemplo, ler a íntegra do processo da justiça argentina que, em 1982, investigou o desaparecimento de Jango como “morte duvidosa”. Andei atrás da alma de Jango. Trabalhei até ficar exausto. Tirei das minhas entranhas um livro que me toca profundamente, pois revela um Brasil que ainda se quer esconder. O cortejo de horrores da ditadura não esperou 1968 para se instalar. Começou no próprio dia do golpe. A imprensa embarcou na sinistra aventura.

Jornalistas que hoje se exibem como campeões da resistência publicaram textos de adesão, de entusiasmo e até de deslumbramento.

Completo um ciclo de vida e de pesquisa: Revolução Farroupilha, 1930, Getúlio, Brizola e a Legalidade, Jango, o golpe, o exílio e a morte. Fui buscar a resposta para a grande questão: Jango foi assassinado? Esmiucei as duas fontes principais que servem de base para essa suspeita: dois uruguaios, Foch Diaz e Mario Neira Barreiro. Mostro como este último dá continuidade à denúncia do primeiro. Estabeleço os vínculos, os nexos, as rupturas, os elos das narrativas. Fiel ao método de pesquisa que me é caro e que aprendi em dois anos e meio seguindo, na França, o seminário do filósofo Jacques Derrida, a desconstrução, apresento minhas conclusões.

Deixo a porta aberta para a surpresa.

Afinal, a exumação dos restos mortais de Jango poderá me desmentir. Mas, com os dados que levantei, ouso afirmar: havia certamente projetos para matar Jango, ou o desejo de se fazer isso, mas tudo indica que ele não foi assassinado. Faltou tempo. Um ataque cardíaco roubou-o aos assassinos.



Do Blog do Juremir Machado da Silva

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