Reproduzo entrevista de 2014, de Giancarlo Carvalho Borges, para Paulo Carvalho, no antigo saite Fast Food Cultural.
Estou reproduzindo porque recentemente, e só recentemente, li o livro As Mitologias Roubadas - Os 12 Trabalhos, e Giancarlo.
1- Quando foi que surgiu a vontade de escrever?
Surgiu naturalmente, tão logo eu descobri que gostava de ler.
Acho que essa vontade é normal quando se lê muito. E, quando
surge esse desejo de expor seu pensamento e tornar real uma
história guardada na cabeça, começar a escrever, mesmo sem
método, é a válvula ideal.
2- De onde surgiu a ideia de fazer esse mashup de conteúdos e
porque os 12 trabalhos?
Sempre gostei muito das mitologias, praticamente todas, mas,
em especial, a greco-romana. A lenda sobre os trabalhos de
Hércules nunca saiu da minha cabeça, desde menino, quando li
"Os doze trabalhos de Hércules", o livro infantil escrito por
Monteiro Lobato e publicado em 1944. Como é uma história bem
conhecida, e memorável, durante as minhas andanças na cidade
me surgiu a ideia. Comecei a estudar e visitar diversos locais
conhecidos e, surpreendentemente, consegui chegar a uma
conexão entre elas e os trabalhos. Claro, a imaginação foi a
mil para que isso acontecesse.
3- Foi necessário muito estudo dos trabalhos e da cidade de
Porto Alegre para que a história pudesse ser criada?
Sim, bastante. Passei várias horas na Biblioteca Pública,
além, claro, de pesquisar praticamente tudo sobre os locais
escolhidos na internet. Além disso, a ajuda de um amigo
gaúcho, Miguel Felippe, técnico restaurador e profundo
conhecedor da história da cidade, foi fundamental para me
aprofundar na história e poder conectar com o enredo que tinha
na cabeça.
4- Dar a luz a um livro, todo o processo, foi um trabalho
hercúleo?
Sempre é. Afinal, é necessário ter carinho pela história,
tempo disponível (o que, na época, eu tive, por circunstância)
e conhecimento da língua. E paciência para não desistir, boa
vontade para sempre colocar a auto-crítica na mesa e coragem
para reescrever, refazer, deletar. Ou seja,é um processo de
contante entrega.
5- Segundo Chronus, quanto tempo levou para o livro ser
escrito e quais as maiores dificuldades?
Todo o processo levou praticamente 1 ano e meio. A maior
dificuldade, no meu caso, foi o excesso de ideias e a dor de
ter que deixar algumas "na sala de edição". Eu tinha sempre a
intenção de editar o livro, e sabia que o tamanho do livro
seria um fator importante numa futura avaliação. Sem falar,
claro no tempo diário disponível que eu tinha pra escrever.
Noitadas e noitadas foram necessárias.
6- O que você acha que falta para que pequenos artistas, de
inúmeras vertentes, saiam do esconderijo como você saiu?
Oportunidades, um pouco de sorte, e, definitivamente,
disciplina e dedicação. Se não entregar o coração, a alma e
boa parte do tempo no que se acredita, as ideias serão somente
ideias, e as oportunidades não virão. E contar só com a sorte
não é o melhor caminho.
7- Qual a sua dica para esses que ainda estão escondidos, com
medo de trombar com o Leão da Nemeia, ou com o Minotauro?
Primeiramente, ter disciplina e acreditar no potencial. Não
adianta começar algo e engavetar, pensando que não vale a pena
continuar. Pegue seu esboço, sua ideia ou projeto e divulgue.
Use a internet, suas conexões pessoas, seu amigos ou,
simplesmente, busque a fera que pode auxiliar no seu projeto e
esfregue na fuça dela o seu sonho. O máximo que pode acontecer
é um não, ou um conselho para aprimorar, ou uma mordida. Nada
que vá te matar.
8- Sei que deveria haver uma continuidade para a sua história,
você pretende concluí-la? Se não, por quê?
O livro apresenta sim a possibilidade de continuação da
história. Não significa que o livro não tenha um final, que
necessite de outras histórias para fechar algum ciclo. Tem sim
um desfecho bem definido, e adequado, ao meu ver. Mas, sim,
pretendo continuar essa aventura, assim que concluir um
projeto atual. Afinal, as mitologias são diversas, e ideias
não faltam.
9- Qual a sua maior satisfação após concluir o livro?
Terminar o livro foi um alívio, uma sensação de promessa
cumprida. Ter o livro em minhas mãos foi muito legal, uma
sensação de que o trabalho foi válido. Mas receber boas
críticas dos leitores, e o reconhecimento dos amigos e
familiares, foi, e ainda é, a melhor recompensa.
10- Você tem mais algum projeto em mente? Alguma outra
história que possa adiantar?
Sim, atualmente estou tentando conciliar o trabalho com a
escrita, e finalizar um novo livro, de temática e abordagem
diferente das Mitologias Roubadas.
Digamos que eu tenha um terço pronto, mas que toda a história
já está pronta, na cabeça. Posso adiantar que terá aventura,
mistério, realidade, ficção e fantasia, um detetive
improvável, sangue, crítica social e um ingrediente que me
enoja: políticos corruptos.
11- Sobre sua participação no projeto "Santa Sede", como foi a
experiência e o que você aprendeu? Qualquer um pode
participar?
Ter participado da Oficina e do Projeto Santa Sede foi um
divisor no meu método de escrita e no meu entendimento da
literatura. O Rubem Penz, idealizador e ministrante da oficina
tem uma capacidade surpreendente de envolver, de trocar
experiência e de repassar bons métodos para quem gosta de
escrever. E ali conheci pessoas especiais, amigos até hoje,
que também ensinam enquanto aprendem. Me sinto melhor escritor
depois de ter participado da turma de 2011. Quem quiser
participar, pode ter acesso às informações através do site
dele, o rubempenz.net. Vale muito a pena.
12- Além da escrita, existe mais alguma atividade artística
que você desenvolva dentro dos labirintos da vida?
Já fui um ótimo desenhista, dizem. Mas faz algum tempo que não
pratico. Qualquer hora eu volto a produzir meus rabiscos, prá
ver se ainda tenho o dom e para satisfazer alguns pedidos
insistentes. Produzo também, mais por hobby e exercício de
criatividade, sites diversos, logomarcas e material
publicitário, como cartazes e folders. Essa produção ainda é,
digamos, somente para os amigos e casos excepcionais.
13- Quais os 12 trabalhos que você acha que precisam ser
feitos em Porto Alegre para a cidade melhorar?
1) Escolher melhor os candidatos ao votar 2) Matar a carreira
de quem foi eleito e não cumpriu 3) Destruir a falta de
respeito com o cidadão 4) Exterminar o preconceito 5)
Valorizar as carreiras cruciais para a cidade, responsáveis
pela segurança, educação e saúde 6) Respeitar a opinião da
população 6) Ouvir e respeitar a juventude 7) Dar valor ao
papel da mulher na sociedade (sejam elas amazonas ou não) 8)
Respeitar o patrimônio e a história 9) Exterminar os
interesses particulares e opressores de algumas corporações
"monstro" 10) Renovar a cultura local, valorizando os que tem
mais qualidade do que "costa-quente" 11) Abrir a boca e não
aceitar o mal feito 12) Levar mais a sério o papel de
cidadão, afinal não basta matar um leão a cada dia: tem que se
manifestar e denunciar
14- E qual o trabalho mais difícil a ser enfrentado para que a
cidade melhore?
Definitivamente, saber escolher os governantes no próximo
pleito. Se não for levado a sério o voto, o futuro vai
apresentar muito mais do que 12 problemas e consequências
ruins. E será uma missão ingrata e difícil remediar a
situação.
15- Desde o lançamento do livro até agora, considerando todo
estudo minucioso que foi feito, você acha que a cidade
melhorou, ou piorou?
A cidade parou no tempo. Muito pouco ou quase nada foi feito
para melhorar as opções de diversão, cultura e educação. A
falta de respeito com o patrimônio histórico, a natureza e a
cultura é evidente. Os benefícios que os projetos para a Copa
do Mundo trariam não se concretizaram, por incompetência ou
mal-feito. Perdeu-se uma oportunidade única que dificilmente
se repetirá. Uma pena.
16- Você acha que um dia chegaremos próximos da Porto Alegre
retratada no seu livro?
Minha versão da cidade é, evidentemente, utópica. É um futuro
desejado, onde a tradição e a tecnologia coexistem. Pode até
parecer impossível, mas não é. Com o comprometimento da
sociedade, com políticas públicas e políticos melhores, os
"devaneios" do livro são, sim, perfeitamente realizáveis.
Um Arroio Dilúvio como um canal limpo onde as pessoas passeiam
a pé ou em pequenos barcos? Dá para fazer. Uma beira do Guaíba
com restaurantes, galerias, jardins e natureza exuberante?
Sim, é possível. Prédios históricos e monumentos resgatados
dentro das leis e técnicas corretas de restauração? Dá também.
Trens subterrâneos e aéreos para melhor circulação na cidade?
É só querer.
17- Porto Alegre, no ponto em que está, precisa de um herói?
Sim. Mas não de um herói único, solitário, mitológico. A
cidade precisa de uma Liga da Justiça inteira, onde a voz do
povo, a manifestação da juventude e a eterna insatisfação com
o mal feito sejam os principais super poderes. Só assim vamos
derrotar esse bando de vilões que andam por aí.
18- Para finalizar: qual seu Fast Food favorito?
Não tem como não gostar de um sanduba ou uma pizza bem feita.
19- Sabe cozinhar algum Fast Food que possa nos passar a
receita?
Quisera eu ter a intimidade com a gastronomia que meu irmão
possui... Mas, caso considerem um ovo frito e azeitona jogados
sobre uma fatia de pão um fast-food, posso mandar a receita. É
bom, até Cérbero comeria...
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