A tuberculose, a doença dos pobres, resiste a desaparecer da próspera Europa. Nem os tratamentos existentes nem o bem-estar do continente, sobretudo no oeste, eliminaram a doença.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que em 2011 havia na Europa 500 mil pessoas com tuberculose. O número estava em declínio, mas a OMS aponta, antes de fechar os dados, que a tendência se inverteu. Destas pessoas, cerca de 44 mil morrem por ano, o que a transforma na segunda enfermidade infecciosa mais letal, depois da Aids.
A maior parte das vítimas está na Europa do Leste e Central. Os números nos países ocidentais são muito menores, mas há um aumento, sobretudo de casos resistentes.
O mal - uma infecção bacteriana contagiosa que ataca principalmente os pulmões, mas pode se propagar para outros órgãos - representa uma importante carga econômica: 6 bilhões de euros por ano na UE, segundo a primeira avaliação. E são cálculos "conservadores", segundo a equipe do Hospital Universitário de Schleswig-Holstein (em Kiel, Alemanha) que os publicou no "European Respiratory Journal".
São duas as causas de uma situação que contradiz os prognósticos de 40 anos atrás, quando se pensou em erradicar a doença. Por um lado, o aparecimento de variantes do bacilo resistentes aos medicamentos. Seu impacto é tal que se o tratamento de uma pessoa com o bacilo normal custa 7.900 euros, quando se trata de um com uma variante resistente (só pode ser tratada com medicamentos de segunda geração), sobe para 55 mil e chega a 168 mil nas extremamente resistentes (quase não há medicação).
Por outro lado, ocorre a chegada de coletivos de imigrantes que repetem as condições de superlotação, pobreza e má alimentação e higiene que fizeram da tuberculose uma praga até o início do século 20. Muitos também vêm de países onde a incidência da doença é alta.
O último toque de atenção a respeito foi dado pela França. Um relatório recente de seu serviço de vigilância epidemiológica detectou que entre 2006 e 2010 chegaram cerca de 50 amostras da variante resistente. Hoje são 69. Mais que os números em si, importa o aumento. Mas neste caso as autoridades comprovaram que se trata de casos importados da Rússia e de outros países do Leste Europeu, já que não há surtos (grupos de doentes relacionados). Mesmo assim, representa um risco potencial para o resto da população, já que basta respirar ar com microgotas de um infectado para contrair a doença.
Outro exemplo da necessidade de enfrentar o mal vem da Bélgica, onde, quase três décadas depois de fechar o último hospital para tuberculosos, Bruxelas está prestes a construir um para tratar os doentes com a variante mais perigosa.
Não se trata de um lugar de repouso onde se respira o ar puro das montanhas, como os do século 19, e sim de um módulo do Hospital Saint-Pierre, no centro da capital, para dez pacientes com a variante mais resistente aos antibióticos.
"Esse projeto piloto foi pensado para aqueles que passaram da fase mais perigosa, na qual se detectam bactérias nos exames, mas devem ficar internados mais de um ano porque ainda podem transmitir a doença", afirma Michèle Gerard, responsável pelo controle de infecções do hospital.
A Bélgica contava em 2008 com mil infectados; em 2012 eram 1.200. Não são os únicos. "Vimos experiências semelhantes na Noruega e na Hungria. Recomendamos concentrar o tratamento no atendimento ambulatorial, mas esse programa, como complemento de um plano integral, vai na boa direção", afirma Masoud Dara, responsável pelo programa europeu de doenças infecciosas da OMS.
Tratamento ambulatorial
Atualmente se registram na Espanha cerca de 10 mil casos por ano de tuberculose (aproximadamente 15 a cada 100 mil habitantes, segundo o Centro Europeu de Controle de Doenças). Mas a grande maioria recebe tratamento ambulatorial, segundo Joan Ruiz Manzano, do grupo de tuberculose da Sociedade Espanhola de Pneumologia e Cirurgia Torácica (Separ).
A medicação que foi implantada nos anos 1960 representou o fim dos centros para doentes. "Percebeu-se que não contagiavam", diz Manzano. "Restam apenas alguns para os casos especiais", afirma. Ele se refere a pessoas com problemas de dependência química ou em situação marginal, que podem ter dificuldade para seguir o tratamento.
Porque o importante é que a pessoa tome a medicação. Esta é eficaz, mas lenta: seis meses se correr bem (dois anos se houver resistência). Como são só comprimidos, não é preciso que os pacientes se internem. Aos descumpridores é dado um "tratamento observado", em que um profissional garante que o paciente o tome.
Os resultados são, na maioria dos casos, muito bons: "Com 15 dias já estão trabalhando", diz Manzano.
Reportagem de Luis Doncel e Emilio de Benito, para o El País, reproduzido no UOL. Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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