Detroit está quebrada. O suspeito de sempre é o declínio da indústria automobilística norte-americana. Não há dúvida de que os percalços da Ford e da GM ajudaram, mas não são nem de longe os principais responsáveis pelo lamentável estado do município. Várias outras localidades, afinal, enfrentaram processos de desindustrialização e só Detroit passou de mais rica cidade dos EUA para capital da decadência da América, onde a única coisa que prospera é o crime --tudo isso em 50 anos.
O desastre de Detroit é mais bem explicado por uma conjunção de reveses econômicos magnificados por uma estrutura tributária e de zoneamento perversas, que criaram uma espécie de tempestade perfeita.
Os problemas começaram em 1967, quando a cidade foi palco de uma série de revoltas raciais. Assustada, a população mais rica (e mais branca) mudou-se para subúrbios onde se sentia mais segura. Em Michigan, esses subúrbios, os "charter townships", têm imunidade contra a incorporação por cidades maiores.
Teve início assim o círculo vicioso. À medida que os mais ricos optavam por deixar a cidade, o valor dos imóveis e a arrecadação caíam. Com menos recursos, a qualidade dos serviços públicos, em especial a polícia e a educação, entraram em declínio, afastando ainda mais moradores.
Na tentativa de corrigir a situação, o município elevou as alíquotas das "property taxes". O resultado foi o oposto do almejado: mais brancos deixaram a cidade, e novas levas de pobres e desempregados (grande parte deles negros) vieram. Hoje, metade dos residentes está inadimplente com seus tributos municipais.
Detroit converteu-se, assim, em uma ilha de pobreza cercada por alguns dos mais ricos subúrbios dos EUA, como Bloomfield Hills.
Estrutura tributária e regras de zoneamento são coisas chatas de discutir, mas a catástrofe de Detroit mostra que podem fazer toda a diferença.
Texto de Hélio Schwartsman, na Folha de São Paulo.
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