Eleições de Portugal são mais um sinal de desencanto político na Europa
Lana Lim
A cada eleição, uma sanção - ou quase isso. Os europeus estão com humor eleitoral febril. De esquerda ou de direita, pouco importa: os dirigentes em fim de mandato não estão comemorando. Eles saem com uma desvantagem, sofrendo com um crescente desinteresse por parte dos eleitores em relação aos grandes partidos governistas. É preocupante.
O português José Sócrates acaba de sentir isso na pele. No poder desde 2005, o líder do governo socialista sofreu uma dura derrota nas eleições legislativas do domingo (5). A direita venceu incontestavelmente, conduzida pelo Partido Social Democrata (PSD, centro-direita) de Pedro Passos Coelho.
Este formará o próximo governo e, com ajuda de um pequeno partido de direita, o CDS-PP, terá à disposição uma esmagadora maioria na Câmara dos Deputados. Sócrates é mais vítima de uma espécie de desgaste do governo do que de uma desaprovação de ordem pragmática.
Passos Coelho se fez porta-voz de uma política de austeridade e de reformas ainda mais drástica do que aquela defendida por Sócrates. A ideia é atender aos pedidos da União Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), que vieram em socorro de Portugal – um empréstimo de 78 bilhões de euros em três anos – para ajudá-lo a enfrentar um considerável endividamento público.
O futuro primeiro-ministro deu garantias. Ele se disse disposto a ir além daquilo que lhe é pedido em Lisboa: mais privatizações, mais austeridade orçamentária. Mas não é essa a principal lição das eleições portuguesas. Ela está em um histórico índice de abstenção, como Portugal nunca havia visto em quarenta anos de sua jovem vida democrática.
Quase 41% dos portugueses não foram votar. Que eles tenham preferido a praia, o campo ou os bares do país, o resultado foi esse: um maciço desinteresse político. Ele certamente explica a derrota sofrida pelo Partido Socialista. Mas não só isso. Ele é reflexo de um fenômeno mais amplo na Europa. As eleições municipais na Espanha e na Itália (nesta primavera), as legislativas na Irlanda (em março), as regionais na Alemanha, as cantonais na França: em toda parte, os que estavam em fim de mandato apanharam nas urnas. Por quê?
Uma primeira explicação, mais tranquilizadora, seria de ordem conjuntural. Os eleitores não estão aceitando bem as soluções para a crise. Isso vale tanto para a zona do euro, como para outras partes dentro da UE. Estão tendo dificuldades para aceitar uma recuperação um tanto fraca e que tem criado poucos empregos. O desemprego continua maciço entre os jovens europeus. E é uma época de austeridade, naturalmente algo impopular...
Uma segunda explicação, esta mais grave, seria por uma crise profunda da democracia representativa. Um sentimento de ausência de verdadeira escolha política, indiferença em relação à esfera pública, fragmentação social: tudo teria contribuído para essa desaprovação à expressão política tradicional. Se for verdade, será preciso combater esse desencanto. Isso pressupõe que os “políticos” ouçam aquilo que os abstencionistas e outros “indignados” têm a dizer.
Texto do Le Monde, republicado no UOL (que desta vez não publicou tradutor).
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