A Comissão da Verdade investiga tortura e assassinatos durante a ditadura militar. Antes tarde do que nunca. A Comissão da Verdade nasceu com mais de 25 anos de atraso. E investiga a responsabilidade de agentes do Estado nos assassinatos durante a ditadura.
Isso serve como exemplo. A não ser nos casos previstos em lei, óbvio, mas necessário repetir, é crime um agente do Estado matar. Se o Brasil tivesse investigado os crimes da ditatura -e os seus responsáveis- talvez não vivesse a barbárie que vive hoje.
Ótimo que a Comissão esteja investigando os crimes de décadas atrás. Mas cabe uma pergunta: e a tortura sistemática e os assassinatos de hoje? Quando uma nova Comissão da Verdade vai investigar?
Quem não sabe que Esquadrões da Morte, quase sempre com policiais fazendo parte, estão matando Brasil afora? São Paulo começou a investigar seu Esquadrão há uma semana. Ali pela região de Osasco, e não apenas. PMs são suspeitos. Mas isso não se restringe a São Paulo.
O Rio de Janeiro teve e tem suas milícias. O filme "Tropa de Elite" celebrizou o tema: a mixórdia de bandidos, policiais e políticos no mesmo pacote.
Alagoas: não há quem não saiba dos Esquadrões por lá, da infiltração nas polícias.
Bahia. Há um ano, na greve da PM, 72 assassinados tiveram morte suspeita. Com tiros na cabeça, na nuca, desferidos por homens de touca ninja ou capacete. Homens que limparam a cena do crime e usaram munição exclusiva de forças policiais.
Quem, ingenuamente, acredita que "só bandidos" são executados está enganado. Inocentes têm sido assassinados. Ninguém se incomoda e não se incomodará enquanto o morto não for um filho, a mãe ou um irmão, ou uma "celebridade".
Perguntas que talvez nos ajudem a ter respostas.
Por que não há escândalo nem manchetes com o assassinato de 30 moradores de rua em Goiânia em 8 meses? Por que o assunto só é notícia, rapidinho, a cada novo morador de rua assassinado em Goiás?
Por que nós sabemos tudo sobre os assassinos de Boston e não sabemos nada sobre quem mata e morre nas periferias de Osasco, São Paulo, Goiânia, Salvador, Rio de Janeiro, Recife, do Brasil afora?
Os três mortos de Boston têm rosto, nome e estão nas manchetes, assim como os assassinos seguem nas manchetes. Por que os quatro mortos de Osasco, os 30 de Goiânia, os 72 da Bahia e os milhares no Brasil são apenas estatística?
Por que são mortos sem nome e sem rosto? Por que três mortos em Boston são mais importantes como notícia do que os quatro mortos de Osasco, ou os 30 de Goiânia, ou…?
Basta checar nas esquinas ou numa delegacia da periferia para saber quem está matando. Por que os nossos mortos e matadores seguem anônimos?
Por que eles não chegam às manchetes e não provocam escândalo?
Texto de Bob Fernandes, no Terra Magazine.
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