No Brasil, há algum tempo, o transporte coletivo enfrenta crescente crise em razão da perda constante de passageiros, que acumulava, desde 2014, um decréscimo de 25%. Em 2020, com a Covid-19, o processo de crise foi impulsionado, levando diversos estados e municípios a enfrentarem risco de colapso do setor. Em paralelo, tendo ainda a necessidade de despender mais recursos e aplicar medidas ao enfrentamento da pandemia (uma vez que o deslocamento de profissionais de serviços essenciais depende do transporte público), e atuando diretamente na retomada da economia.
Diante desse cenário, sob a ótica financeira, não se pode ignorar que os sistemas são concebidos e dimensionados para alcançarem economias de escala mediante a oferta de alta capacidade, congregando muitas pessoas em estações, terminais, ônibus e trens, justamente para proporcionar preços minimamente acessíveis. No transporte por pneus, por exemplo, as frotas são tipicamente concebidas para acumular seis pessoas por metro quadrado na hora-pico, sendo que em metrôs esse número pode chegar a até 12.
O transporte de massa não funciona sem aglomerações. De outro lado, é preciso, mais do que nunca, garantir a continuidade dos serviços com todas as observâncias sanitárias, circunstância que remete, invariavelmente, a uma política nacional de financiamento da mobilidade —até hoje inexistente.
De fato, os sistemas de transporte de passageiros estão, na maioria das grandes cidades e regiões metropolitanas, sustentados apenas nas tarifas que são pagas pelos usuários. E, em um cenário em que a demanda sofre reduções drásticas e imprevisíveis, como sob o contexto do novo coronavírus, a matemática que alicerça os sistemas é colocada em xeque —ainda mais quando se sabe que muitos dos estados e municípios responsáveis pela prestação desses serviços estão em sérias dificuldades financeiras para prover qualquer tipo de aporte ao setor.
O isolamento social fez cair a movimentação de passageiros nas principais capitais do país em cerca de 70%, em média. Dado esse panorama, as autoridades municipais e metropolitanas passaram a enfrentar o seguinte dilema: fechar o transporte público, com todas as consequências da medida (haja visto a inviabilidade financeira da sua prestação); ou obrigar a oferta, e ainda, num patamar superior à demanda, com o objetivo de contribuir com a minimização do acúmulo de pessoas. Essa última estratégia foi a adotada na maioria dos casos. Entretanto, ela está se mostrando cada vez mais inviável economicamente em razão da situação fiscal de penúria pela qual passam estados e municípios para fazer frente ao dito “novo normal”.
O transporte público é peça-chave para qualquer estratégia de retomada da economia. É crescente a pressão para manter e ampliar o nível da oferta, e em patamares superiores ao número de usuários pagantes. Sob essas condições, a pergunta que é necessário responder, por força, até mesmo, do déficit acumulado ao longo dos últimos meses, é: quais as alternativas para viabilizar a sustentação financeira das operações e garantir a continuidade dos serviços?
É chegada a hora de buscar uma solução que passe pela coordenação nacional e que aponte para o financiamento da mobilidade de forma robusta e sustentável. A participação da União no assunto é inadiável, e os nossos congressistas, a esse respeito, precisam contribuir com as medidas legislativas que ajudem a equacionar o problema. Algum apoio, a esta altura, tem que vir. A conta, com a Covid-19, para o transporte público de passageiros, mais do que nunca, não fechará apenas com o pagamento dos usuários.
Alexandre Baldy, Delmo Pinho, Marco Aurélio de Barcelos Silva e Marcelo Bruto
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