Desde que Paulo Guedes disse mais uma de suas máximas, a de que livro é coisa da elite, dei um inesperado pulo social. De remediada a rica em algumas páginas. Sempre pensei que não viveria o bastante para ver minha ascensão na pirâmide e agora estou aqui, mergulhada nas minhas estantes, qual o Tio Patinhas dando tchibuns em sua piscina de dinheiro.
Na reforma tributária ideal do ministro, o mercado editorial, isento desde 2004, vai tomar uma taxação de 12%. Com isso, segundo ele, o governo pode aumentar o valor do Bolsa Família. E para não deixar um eventual pobre que queira ler muito frustrado por não ter mais acesso a esse produto de magnata chamado livro, quem sabe um futuro programa de doação de obras?
Assim como pé de pobre não tem número, leitura de pobre não precisa ter estilo ou autor. Quer Machado de Assis? Pega um Olavo de Carvalho e não reclama. Sem falar no livro perfeito para dar o tom do programa: “Os Miseráveis” para os miseráveis.
É de se perguntar de onde Guedes tirou que a elite compra livros. A gente abre qualquer revista de decoração e não tem uma estante nas enormes salas de piso frio dos mais abonados. Livros, só nas mesas de centro, volumes vistosos, photobooks, em geral, ali postos como enfeite ou peso de papel.
É uma generalização idiota, eu sei. Tão idiota quanto o ministro achar que pobre não lê. Não compra livro. Troca educação e cultura por uns trocados a mais no Bolsa Família. No Brasil de hoje, pobre deixou de ser uma condição, com as suas circunstâncias, para virar condenação.
Já que o livro pode ser taxado, porque quem compra é a elite, das duas, uma. Ou os pobres passam desde já a consumir jet skis, jatinhos, helicópteros, lanchas e iates, que são livres de tributação, ou o Paulo Guedes começa a taxar os jet skis, helicópteros, lanchas e iates que, se pagassem IPVA, renderiam R$ 5 bilhões ao país —em uma estimativa de 2018. Se ele taxasse as fortunas, aí sim que o Bolsa Família engordava mesmo.
Com o imposto sobre o livro, e seu consequente encarecimento, a diminuição das vendas, a quebradeira de mais livrarias, a falência de mais editoras, o encolhimento do mercado para os autores e novos desempregados para engrossar as estatísticas, pelo menos teremos mais pobres para não consumir nem livro nem produto algum. No fim das contas, não é que o raciocínio do ministro fecha?
Texto de Claudia Tajes, na Folha de São Paulo.
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