Shiloh, Cisjordânia Ocupada – Este assentamento israelense, a 30 quilômetros a leste da Linha Verde, parece um lugar improvável para uma discussão a respeito do possível futuro de Israel como estado binacional.
Em torno de 2000 pessoas vivem aqui, empoleiradas no alto de uma colina a poucos quilômetros ao sul de Nablus, num assentamento cercado por portões e guardas armados. Na mais recente eleição para o Knesset [o parlamento israelense], em 2009, mais da metade dos assentados nesta região da Cisjordânia votaram nos conservadores: Likud, União Nacional, ou algum dos vários partidos religiosos.
Na base da montanh,a arqueólogos estão escavando o Tel Shiloh, que os judeus acreditam ter sido o lugar do Tabernáculo por quase 400 anos.
Mesmo depois de centenas de entrevistas com israelenses ao longo do último mês, o caso mais persuasivo da solução de dois estados veio dos moradores daqui, em assentamentos ilegais em plena Cisjordânia. “O que eles chamam de solução dos dois estados não é uma solução”, disse Netanel Elyashiv, um residente de um assentamento próximo de Eli, que emigrou de Nova York para Israel há oito anos.
“As pessoas da esquerda e da direita, ambos não são razoáveis. A direita quer que todos os árabes saiam e a esquerda pensa que podemos separar e construir um muro entre nós”, disse Elyashiv, um professor. “A realidade é binacional, e é isso o que as pessoas tem de reconhecer”.
Não há um apoio significativo, em Israel ou nos territórios palestinos ocupados, a um estado binacional. Longe disso: uma maioria considerável de israelenses, e entre 40 a 60% dos palestinos – dependendo da pesquisa – ainda apoiam uma “solução de dois estados”. E tanto o governo israelense como a Organização para Libertação da Palestina continuam a alimentar, da boca para fora, a ideia de negociações renovadas visando à solução dos dois estados.
Suas ações no último mês, no entanto, sugerem que eles não acreditam realmente nem na ideia, e depois de semanas na região é difícil escapar da conclusão de que o objetivo de se alcançar dois estados é simplesmente impraticável.
“Eu não vejo uma saída”
A solução dos dois estados já foi declarada morta antes; mas ninguém quis dizer aos arquitetos do plano, daí a maquinaria do “processo de paz” seguiu engrenada. Então, pouco depois de Mahmoud Abbas ter feito seu discurso na ONU, naquela sexta, Catherine Ashton e Tony Blair correram para a frente das câmeras, ávidos para anunciar que o Quarteto de Madrid tinha chegado a uma “fórmula” para retomar as negociações entre Israel e a OLP.
Mas o seu anúncio pareceu ainda mais vazio do que o normal. Blair e Ashton admitiram, ambos, que nem israelenses nem palestinos tinha concordado com essa fórmula. Abbas expressou pouco interesse no assunto.
Benjamin Netanyahu, o primeiro ministro israelense, disse que iria apoiar a fórmula – mas ao mesmo tempo desconsiderou os pedidos para que Israel congele a construção de assentamentos, um dos princípios cardeais do Quarteto. Bem ao contrário, o governo de Israel anunciou nesta semana que está estudando a construção de 1100 novas casas em Gilo, um assentamento ilegal a leste de Jerusalém, ao lado de Belém.
“Com isso, Israel está respondendo à declaração do Quarteto, com 1100 novas casas”, disse Saeb Erekat, o chefe de negociações da OLP.
E assim foi. Os membros do Quarteto continuam a soltar declarações e a organizarem encontros, mas esta última iniciativa, como tantas antes, parecem simplesmente mortas na saída.
O processo de paz continuará suas atividades paralelamente, mas há um sentimento crescente entre israelenses e palestinos – mesmo entre aqueles que apoiam a solução dos dois estados – de que esse tipo de resultado é simplesmente insustentável. Pelo menos enquanto a política israelense estiver dominada por um bloco de direita, não com mais de 500 000 assentados israelenses já vivendo na Cisjordânia.
“Eu não vejo uma saída por meio de negociações”, admitiu Nabil Sha’ath, um alto negociador da OLP.
O aumento da direita
Sha’ath estava pessimista porque o governo israelense se recusou a impor qualquer novo congelamento de construções de assentamentos, e porque os negociadores dos EUA sequer pressionaram a respeito do assunto.
Mesmo que o tivessem feito, seria uma causa perdida. As lideranças de nossos partidos políticos – Likud, Shas, Habayit Hayehundi e União Nacional – enviaram uma carta Netanyahu nesta semana pedindo com urgência que ele retaliasse a proposta da OLP de ser membro da ONU. Eles preferiram responder assim: anexando assentamentos israelenses na Cisjordânia ocupada.
Um movimento desses poderia tornar lei a realidade existente na Cisjordânia. Também certamente tornaria a solução de dois estados impossível. A Cisjordânia não pode ser parte de um estado Palestino viável se Israel anexa os blocos de 122 assentamentos em seus limites.
Esses partidos continuarão a controlar a política de Israel no futuro previsível. Uma pesquisa feita em setembro pelo jornal Haaretz apurou que a coalizão de direita israelense iria continuar a mandar na próxima eleição. O partido de centro esquerda, o Partido Trabalhista, ganharia nove assentos, mas esses ganhos viriam às expensas do Kadima, que perderia 10. Assim, o tamanho do bloco de centro esquerda de Israel permaneceria o mesmo, nem maior nem menor o suficiente para formar uma coalizão.
Os partidos conservadores dominantes, para dizer o mínimo, rejeitam as precondições necessárias para o estabelecimento de conversações com a OLP, senão a ideia mesma de negociações.
No entanto, mesmo que eventualmente eles queriam vir a desmantelar os assentamentos, poderia Israel arcar com isso? Um estudo recente revelou que Israel gasta um milhão de shekels (270 mil dólares) por cada homem, mulher e criança que removeu da Faixa de Gaza, em 2005.
E a Cisjordânia é ainda mais populosa: 500 000 israelenses vivem em assentamentos na Cisjordânia e em Jerusalém Leste, comparados com os 9000 evacuados de Gaza. Seria um preço exorbitante para um país atingido por protestos socioeconômicos durante todo o verão – causados, em parte, pelos subsídios já pagos aos assentados às expensas dos israelenses dos que vivem outro lado [ou seja, nos limites] da Linha Verde.
'O maior fracasso diplomático'
Nesse contexto, o entusiasmo comovente pelo reconhecimento do estado palestino – 70% dos israelenses pensavam que seu governo deveria aceitar um voto “sim” nas Nações Unidas – parece como uma última tentativa desesperada de fazer a opinião pública apoiar uma ideia moribunda.
Analistas ainda esperam por movimentos políticos mais consistentes para reinaugurarem o “processo de paz”, mas a realidade política – em ambos os lados e particularmente em Israel – sugere que nada está para acontecer. Como escreveu Carlos Strenger, no Haaretz, Netanyahu “pode entrar para a história como o homem que matou a solução dos dois estados”.
“Esta ideia, a solução dos dois estados, é o maior fracasso diplomático do último século”, disse Elyashiv, o residente de Eli. “Passarão décadas até que tenhamos uma boa solução”.
A alternativa é um estado, e esta é uma alternativa difícil, que a maioria dos israelenses e palestinos não apoia.
Pois uma coisa persevera, lá, é claro: uma desconexão fundamental entre o próprio sionismo – o objetivo de manter Israel como um estado judeu – e a ideia de um estado binacional. Mesmo sem o direito de retorno dos refugiados, um único estado ao longo de toda a Palestina histórica teria quase tantos não-judeus como judeus, e as altas taxas de natalidade dos primeiros levariam a que ultrapassassem os outros em questão de anos.
Uma pesquisa do Instituto da Democracia Israelense mostrou que, perguntados se priorizavam o caráter judaico ou o seu governo democrático, a maioria dos israelenses escolheu o primeiro.
E alguns, em ambos os lados, simplesmente não querem viver juntos. Mais ou menos como se comentou, há algumas semanas, Maein Areikat, o enviado da OLP aos Estados Unidos, que disse que palestinos e judeus “deveriam ser separados” no futuro. Frequentemente se escuta observações similares dos conservadores israelenses, que são da opinião de que “O Jordão é a Palestina”, um jeito polido de pedir a limpeza étnica da Palestina histórica .
Mas a realidade inescapável é que Israel tem mais de dois milhões de cidadãos palestinos; e salvo por meio de um realinhamento político sem precedentes de 500 000 israelenses assentados na Cisjordânia, eles provavelmente estão lá para ficar.
O mantra do “processo de paz” israelo-palestino há muito tem sido “dois estados para dois povos”. Mas esse slogan soa vazio quando ambos os estados já contêm ambos os povos.
Fonte:http://english.aljazeera.net/indepth/spotlight/unpalestine/2011/09/201192817371971592.html
Texto de Gregg Carlstrom, tradução de Katarina Peixoto, na Agência Carta Maior.
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