quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Em Berlim, Partido Pirata mostra força eleitoral inesperada


Em Berlim, Partido Pirata mostra força eleitoral inesperada

Por Nicholas Kulish
Em Berlim

Com laptops abertos como escudos contra o câmera bisbilhoteiro, os jovens se pareciam mais com os Garotos Perdidos de Peter Pan do que os piradas do Capitão Gancho quando foram apresentados na segunda-feira como os mais novos legisladores de Berlim: Eles são membros do Partido Pirata.


Questionados se eram apenas uma trupe caótica de baderneiros, Christopher Lauer, recém-eleito parlamentar representante do distrito de Pankow, respondeu com confiança: “você terá que esperar nossa primeira sessão na câmara dos representantes”.

Ao conquistar 8,9% dos votos nas eleições de domingo na cidade-estado de Berlim, esses piratas políticos ultrapassaram – derrubara, na verdade – qualquer expectativa de que eram apenas um ornamento, um partido de apenas um tema que promove a liberdade na internet. Os piratas superaram as expectativas de que todos os 15 candidatos em sua lista conquistaram cadeiras – as cadeiras são distribuídas com base nos votos para o partido e não para os indivíduos. Normalmente os partidos listam muito mais candidatos do que podem eleger, porque se ganharem mais do que nomearem, as cadeiras ficam vazias.

Esses jovens entre 20 e 30 e poucos anos, que se apresentaram no imponente edifício do antigo parlamento da Prússia, alguns usando casacos de moletom, e um deles com uma camiseta do Capitão América, não eram mais simplesmente ativistas críticos e excêntricos. Eles se tornaram os representantes eleitos do povo.

A questão que membros do establishment político alemão estão se fazendo agora depois que o partido insurgente arrombou o parlamento é a seguinte: se os piratas são simplesmente uma piada, um foco de protesto, uma reflexão sobre o desgosto eleitoral com todos os partidos políticos estabelecidos – ou um experimento interessante sobre uma nova forma de democracia online?

“Eles não são nenhum partido piada”, disse Christoph Bieber, professor de ciência política na Universidade de Duisburg-Essen. Embora certamente haja um elemento de protesto na porcentagem inesperadamente alta de votos que os Piratas conquistaram, eles estão preenchendo uma necessidade real dos eleitores de fora da política tradicional que não se sentiam representados. “Na internet, eles de fato encontraram um tema pouco explorado que os outros partidos não estão trabalhando”, disse Bieber.

A eleição estadual em Berlim no domingo foi repleta de resultados surpreendentes. Os Democratas Livres, que apoiam os empresários, parceiros da coalizão da chanceler Angela Merkel no Parlamento federal, foram mal novamente, recebendo menos de 2% dos votos. Isto está bem abaixo dos 5% necessários para continuar no parlamento. O Partido Verde continuou aumentando seus sucessos recentes e pode se tornar um dos partidos governantes de Berlim.

Embora questões como a privacidade online e proteção de dados podem parecer incrivelmente específicas, e até mesmo irrelevantes, para os eleitores mais velhos, para os jovens que costumam passar metade de seu tempo na internet, sobretudo em sites de redes sociais onde compartilham seus momentos mais íntimos, isso é tudo menos um assunto de menor monta. E o pedido dos Piratas para ter transparência total na política ressoa de forma poderosa com uma geração desiludida pelo caso da guerra dos EUA no Iraque e estimulada pela promessa da WikiLeaks de colocar um fim aos segredos.

O resultado surpreendentemente forte dos Piratas veio como mais uma prova da insatisfação do eleitorado na Alemanha com os partidos estabelecidos, e o que muitos veem como sua incapacidade de ir além do interesse próprio e se concentrar, em vez disso, nas necessidades de seus eleitores. Os Piratas prometeram usar ferramentas da internet para dar aos membros do partido um poder sem precedentes para propor políticas e determinar posicionamentos, no que eles chamam de “democracia líquida”, uma forma de participação que vai além de simplesmente votar nas eleições.

O partido ampliou sua plataforma inicial, que era focada no compartilhamento de arquivos, censura e proteção de dados para incluir outros temas sociais, defender a internet como ferramenta para empoderar o eleitorado e engajá-lo no processo político e legislativo.

“O quadro político de hoje está perdendo ao não fazer algumas questões muito relevantes sobre o futuro”, disse Rick Falkvinge, fundador do primeiro Partido Pirata, que ele fundou na Suécia em 2006. Ele estava celebrando com seus colegas alemães na festa da noite das eleições, no domingo, numa sala cheia de esferas de discoteca e manequins desmontados no clube noturno Ritter Butzke, em Kreuzberg. Graças à natureza interativa da internet, “você não precisa aceitar essas leis que estão sendo lidas para você. Você pode se levantar, posicionar-se e escrever as leis você mesmo”, disse ele.

Falkvinge resumiu o significado das eleições de Berlim para o novo movimento em termos que seus membros compreenderiam: “os Piratas da Alemanha agora têm um placar alto.”

Sebastian Schneider, que pede para ser chamado de Schmiddie “ou ninguém saberá de quem você está falando”, membro do partido e um dos que estava celebrando na noite de domingo, disse que não imagina voltar em nenhum outro partido.

“Na minha opinião, os Verdes são um partido conservador agora”, disse Schneider. “Eles não estavam muito certos se queriam entrar para o lado negro da força ou não”, o que segundo ele equivaleria a formar uma coalizão para governar Berlim com os Democratas Cristãos.

Havia muitos jovens, muitos com dreadlocks ou barbas e alguns com ambos, fumando cigarros enrolados a mão e bebendo cerveja. Outros usavam jaquetas com as iniciais CCC escritas atrás, a sigla do Chaos Computer Club, um coletivo de hackers que começou em Berlim e do qual boa parte dos membros também fazem parte do Partido Pirata. Um comediante de stand-up trabalhando num estilo clássico de cabarés de Berlim fez graça com o influxo de turistas e o aumento recente dos aluguéis, que se tornaram grandes temas da campanha eleitoral, dizendo: “não há mais prédios para ocupar. Vamos ter de começar a ocupar os hotéis cinco estrelas.”

O prefeito de Berlim, Klaus Wowereit, cujo partido Social Democrata conquistou a maioria dos votos no domingo, assegurando a ele um terceiro mandato como prefeito da cidade, pode ter feito o melhor elogio ao partido jovem, levando-o suficientemente a sério para atacá-lo no dia após a eleição. Ele levantou um problema ofensivo para os jovens que passam as noites escrevendo códigos de computador: não havia nenhuma mulher ao lado deles no grupo.

“A política de gênero não chegou ainda para os Piratas, e isso não é um passo adiante, mas um passo atrás”, disse Wowereit para os repórteres na segunda-feira.

De fato, numa entrevista coletiva na segunda-feira, só havia homens jovens e brancos representando o partido, sentados à mesa da sala de conferências. Lauer, que usava uma jaqueta esportiva, disse que as pessoas mais desleixadas não eram “uma parte representativa dessa sociedade” e que este é um problema que o partido está combatendo.

Os Piratas podem ser muito honestos, e são constantemente educados com seguranças, câmeras e qualquer um que cruze seu caminho. A transparência na política significa “também ser capaz de admitir quando você não sabe alguma coisa”, disse Andreas Baum, candidato líder do partido nas eleições.

Questionado sobre que tipo de mudança real um pequeno partido pode fazer no legislativo estadual, Baum respondeu: “só o fato de os outros partidos agora se perguntarem como nós conquistamos esses votos já é um progresso.”

Tradução: Eloise De Vylder


Reportagem da Der Spiegel, no UOL.

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