Fazendo um ditador tremer
Por LARRY ROHTER
Alguns cinéfilos podem não saber o que é "granito", mas o documentário de Pamela Yates que leva esse nome vem com um subtítulo cujo significado não poderia ser mais claro: "Como pegar um ditador".
O tirano em questão é o general Efraín Ríos Montt, que durante 17 meses sangrentos no início dos anos 1980 liderou uma junta militar na Guatemala, e os "granitos" [pequenos grãos] são os vários defensores dos direitos humanos, grãos de areia metafóricos, que juntos conseguiram processá-lo por genocídio em um tribunal espanhol.
De modo incomum, essas acusações contam com provas tiradas do trabalho de Yates.
"Granito" é uma sequência do primeiro longa-metragem de Yates, "Quando as Montanhas Tremem". Filmado 30 anos atrás, no auge do governo do general Ríos Montt, o documentário oferece uma visão do turbilhão na Guatemala do ponto de vista tanto dos líderes militares como dos guerrilheiros marxistas que tentavam derrubá-los.
"Eu deveria ter sido mais cética", disse Yates. "Pensei que os mocinhos venceriam, que o movimento guerrilheiro e a sociedade civil que o apoiava tinham o direito e a força da história a seu lado. Mas foi muito mais complicado, e isso não aconteceu." De fato, um acordo de paz alcançado em 1996 foi seguido por uma série de governos civis ineficazes.
As eleições presidenciais da Guatemala em 11 de setembro último, terminaram em um segundo turno, agendado para novembro. Otto Pérez Molina, um general aposentado e chefe da inteligência militar que foi acusado de violação de direitos humanos, obteve vantagem significativa, mas não conseguiu os 50% dos votos necessários para vencer.
Depois que "Quando as Montanhas Tremem" foi exibido pela primeira vez na Guatemala, em 2003, Yates foi procurada por um advogado que se perguntou se suas filmagens poderiam conter material que incriminasse o general Montt, hoje com 85 anos.
E elas continham, principalmente uma entrevista em que o general se gabava de seu poder. Foi exatamente este momento que levou à realização de "Granito", que no início mostra Yates revirando antigas latas de filmes.
Enquanto o general Montt continua na Guatemala, que se recusou a extraditá-lo, o que ela descobriu está sendo usado agora no processo judicial aberto contra ele em Madri.
"Esta é a primeira vez que evidências videográficas são admitidas em um tribunal espanhol, por isso estabelece um precedente importante", disse Almudena Bernabéu, uma advogada espanhola envolvida no caso Ríos Montt.
A figura mais inspiradora de "Quando as Montanhas Tremem" foi Rigoberta Menchú, a defensora da paz e dos direitos dos maias que ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1992. Mas no final de 1990 sua reputação foi manchada por evidências de que muitos dos principais episódios de sua autobiografia campeã de vendas, "Eu, Rigoberta Menchú", foram fabricados ou exagerados. Ela se candidatou a presidente nesta eleição, mas recebeu menos de 2% dos votos.
Em "Granito", Menchú, que abriu a queixa original de genocídio contra o general Montt, tem um papel muito reduzido, como uma de nove defensores dos direitos humanos retratados.
A guerra civil da Guatemala começou em 1960, seis anos depois que um golpe organizado pelos Estados Unidos derrubou um presidente eleito, e durou 36 anos. Pelo menos 200 mil pessoas teriam sido mortas, a maioria por forças do governo.
"Acreditamos que a história do que aconteceu na Guatemala deve ser contada, e que é nossa responsabilidade contar essa história e deixar as vítimas falarem", disse Fredy Peccerelli, que liderou esforços para exumar valas comuns na Guatemala.
"Granito" foi exibido nos festivais de cinema de Sundance e no Festival Internacional da Human Rights Watch, e agora pode ser nomeado ao Oscar.
"Para fazer uma mudança é preciso um compromisso da vida inteira", disse Yates. "Ao contar esta história, eu quis enviar uma carta de amor para a próxima geração de documentaristas, de que você pode fazer a diferença. Talvez nem sempre da maneira como você pensou, mas partilhando uma semente de esperança, um caminho a seguir."
Por LARRY ROHTER
Alguns cinéfilos podem não saber o que é "granito", mas o documentário de Pamela Yates que leva esse nome vem com um subtítulo cujo significado não poderia ser mais claro: "Como pegar um ditador".
O tirano em questão é o general Efraín Ríos Montt, que durante 17 meses sangrentos no início dos anos 1980 liderou uma junta militar na Guatemala, e os "granitos" [pequenos grãos] são os vários defensores dos direitos humanos, grãos de areia metafóricos, que juntos conseguiram processá-lo por genocídio em um tribunal espanhol.
De modo incomum, essas acusações contam com provas tiradas do trabalho de Yates.
"Granito" é uma sequência do primeiro longa-metragem de Yates, "Quando as Montanhas Tremem". Filmado 30 anos atrás, no auge do governo do general Ríos Montt, o documentário oferece uma visão do turbilhão na Guatemala do ponto de vista tanto dos líderes militares como dos guerrilheiros marxistas que tentavam derrubá-los.
"Eu deveria ter sido mais cética", disse Yates. "Pensei que os mocinhos venceriam, que o movimento guerrilheiro e a sociedade civil que o apoiava tinham o direito e a força da história a seu lado. Mas foi muito mais complicado, e isso não aconteceu." De fato, um acordo de paz alcançado em 1996 foi seguido por uma série de governos civis ineficazes.
As eleições presidenciais da Guatemala em 11 de setembro último, terminaram em um segundo turno, agendado para novembro. Otto Pérez Molina, um general aposentado e chefe da inteligência militar que foi acusado de violação de direitos humanos, obteve vantagem significativa, mas não conseguiu os 50% dos votos necessários para vencer.
Depois que "Quando as Montanhas Tremem" foi exibido pela primeira vez na Guatemala, em 2003, Yates foi procurada por um advogado que se perguntou se suas filmagens poderiam conter material que incriminasse o general Montt, hoje com 85 anos.
E elas continham, principalmente uma entrevista em que o general se gabava de seu poder. Foi exatamente este momento que levou à realização de "Granito", que no início mostra Yates revirando antigas latas de filmes.
Enquanto o general Montt continua na Guatemala, que se recusou a extraditá-lo, o que ela descobriu está sendo usado agora no processo judicial aberto contra ele em Madri.
"Esta é a primeira vez que evidências videográficas são admitidas em um tribunal espanhol, por isso estabelece um precedente importante", disse Almudena Bernabéu, uma advogada espanhola envolvida no caso Ríos Montt.
A figura mais inspiradora de "Quando as Montanhas Tremem" foi Rigoberta Menchú, a defensora da paz e dos direitos dos maias que ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1992. Mas no final de 1990 sua reputação foi manchada por evidências de que muitos dos principais episódios de sua autobiografia campeã de vendas, "Eu, Rigoberta Menchú", foram fabricados ou exagerados. Ela se candidatou a presidente nesta eleição, mas recebeu menos de 2% dos votos.
Em "Granito", Menchú, que abriu a queixa original de genocídio contra o general Montt, tem um papel muito reduzido, como uma de nove defensores dos direitos humanos retratados.
A guerra civil da Guatemala começou em 1960, seis anos depois que um golpe organizado pelos Estados Unidos derrubou um presidente eleito, e durou 36 anos. Pelo menos 200 mil pessoas teriam sido mortas, a maioria por forças do governo.
"Acreditamos que a história do que aconteceu na Guatemala deve ser contada, e que é nossa responsabilidade contar essa história e deixar as vítimas falarem", disse Fredy Peccerelli, que liderou esforços para exumar valas comuns na Guatemala.
"Granito" foi exibido nos festivais de cinema de Sundance e no Festival Internacional da Human Rights Watch, e agora pode ser nomeado ao Oscar.
"Para fazer uma mudança é preciso um compromisso da vida inteira", disse Yates. "Ao contar esta história, eu quis enviar uma carta de amor para a próxima geração de documentaristas, de que você pode fazer a diferença. Talvez nem sempre da maneira como você pensou, mas partilhando uma semente de esperança, um caminho a seguir."
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