quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Avanço da crise econômica arrocha a classe média grega


Avanço da crise econômica arrocha a classe média grega

Por RACHEL DONADIO

ATENAS - Sentada na modesta sala de estar da casa que divide com os pais, o marido e os dois filhos adolescentes, Stella Firigou se preocupava com a situação da sua família em meio à crise econômica generalizada. Mas quanto a uma coisa ela estava irredutível: não irá pagar o novo imposto sobre propriedades imobiliárias, aprovado em 27 de setembro, e que é a peça central de um pacote de austeridade do governo grego.
"Não tenho como pagá-lo", disse Firigou, 50. "Podem me prender."
Enquanto os bancos e os líderes europeus discutem abstratamente sobre os impactos da eventual moratória grega, algo assustadoramente concreto acontece na Grécia: o desmonte em tempo real de um Estado do bem-estar para a classe média.
Desde 2010, o governo eleva impostos e corta indistintamente aposentadorias e salários de servidores, num esforço para enxugar o setor público que hoje emprega um em cada cinco gregos.
Funcionária de um governo municipal, Firigou, como todos os empregados do setor público, sofreu uma redução salarial no ano passado -no seu caso, seu contracheque foi de US$ 2.000 para menos de US$ 1.300 por mês.
Seu marido, vendedor de autopeças, viu suas comissões despencarem. A aposentadoria da mãe dela foi cortada.
O novo IPTU, provavelmente superior a US$ 2.000 por ano para a família Firigou, será uma mordida dura. Além de reduzir os salários, nos últimos meses o governo também adotou um "imposto solidário", no valor de 1% a 4% da renda de todos os trabalhadores, além de um imposto adicional sobre os autônomos, que compõem grande parte da atividade econômica.
Também aumentou de 13% para 23% o imposto sobre o valor agregado de muitos serviços e produtos, inclusive dos alimentos. Não é raro que até funcionários do setor privado sofram reduções salariais de 30% ou mais.
A "troika" de credores internacionais -o Banco Central Europeu, a Comissão Europeia e o Fundo Monetário Internacional- insiste que o governo grego cumpra suas metas de redução de déficit antes da liberação de uma parcela de US$ 11 bilhões na ajuda ao país.
Muitos gregos temem uma espiral mortal de novas medidas de austeridade, mais contração econômica e consequentemente menos arrecadação tributária, o que dificultaria a redução da dívida, levando o país à moratória.
Economistas dizem que as medidas são necessárias para reduzir a dívida e modernizar a economia grega. Mas os cortes foram muito mais rápidos que a modernização, e o tecido social está começando a se esgarçar.
O índice de desemprego, que já chega a 16%, e a emigração estão crescendo; a taxa de natalidade está caindo; e a cifra de suicídios está aumentando.
"O governo está cada vez mais em guerra com os cidadãos", disse o economista Jens Bastian, da Fundação Helênica para a Política Europeia e Externa. "Ele está tomando decisões cujas consequências vêm não só arrochando a classe média como também ameaçando sua própria existência."
O governo diz que espera arrecadar US$ 2,7 bilhões com o novo IPTU. Segundo a Fundação Helênica da Propriedade Imobiliária, o imposto custará de US$ 1.200 a US$ 2.000 adicionais por ano para uma família, em média.
O primeiro-ministro George Papandreou implorou aos gregos para que aceitem as medidas. "Não há outro caminho", afirmou. "O outro caminho é a falência, o que também teria pesadas repercussões para cada lar, para cada cidadão grego."
Críticos dizem que o governo tem fracassado em coibir a evasão fiscal entre os segmentos mais ricos, e que não realizou cortes mais focados para não se indispor com alguns sindicatos do setor público que são muito ligados ao governista Partido Socialista. E, apesar da sangria, o país não está cumprindo as suas metas de redução do déficit.
Segundo dados divulgados em 22 de setembro, a arrecadação líquida nos sete primeiros meses do ano foi US$ 4,7 bilhões abaixo da meta, e os gastos superaram a previsão em US$ 1,35 bilhão.
De volta à sua sala de estar, Firigou disse que foi apanhada de surpresa pelas mudanças.
"Ninguém nos alertou", afirmou, desolada. "Não tenho esperança, nem para mim, nem para os meus filhos, e olhe que eu tenho só 50 anos de idade."
Niki Kitsantonis contribuiu com reportagem


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