Uma trégua improvável está sendo selada entre israelenses e palestinos, que estão colaborando para evitar o aumento da contaminação pelo coronavírus na Terra Santa.
Nas últimas três semanas, representantes dos dois lados têm se encontrado para coordenar medidas em um escritório de monitoramento conjunto —cujo endereço é mantido em segredo.
“A saúde de todos os cidadãos da região está acima de tudo, e é nossa principal prioridade. Continuaremos a agir em colaboração com a Autoridade Palestina em um esforço conjunto", diz o major Yotam Shefer, chefe do departamento internacional da administração civil israelense na Cisjordânia.
Israel anunciou que enviará 20 toneladas de desinfetante para a Cisjordânia, além de 400 kits para realização de testes de detecção do coronavírus, além de outros 500 kits de equipamentos de proteção para as equipes médicas e as forças de segurança palestinas.
Há workshops conjuntos entre as equipes médicas dos dois lados. Também está sendo montado um hospital de campanha na fronteira com a Faixa de Gaza.
A mais recente medida foi o anúncio da permissão para que 70 mil trabalhadores palestinos cruzem a fronteira com Israel para manter seus empregos no país. A maioria trabalha em setores como construção civil, agricultura, indústria e serviços.
O número permitido durante a pandemia é um pouco menor do que o normal —100 mil palestinos costumam trabalhar diariamente em Israel. Mas a crise econômica causada pelo vírus já diminuiu os postos de trabalho.
A rotina também será diferente, porque esses trabalhadores palestinos não poderão voltar para casa no fim do dia —a fronteira com a Palestina será fechada nesta quinta-feira (19), com exceção da passagem de doentes e equipes médicas.
Os palestinos terão que ficar direto em Israel por um ou dois meses e deverão ser hospedados pelos empregadores israelenses em residências temporárias.
Caso haja suspeita de contaminação pelo coronavírus, os empregadores precisam dar condições para que o trabalhador fique em quarentena por 14 dias. Se algum palestino adoecer e precisar ser hospitalizado, será atendido em hospitais locais.
A medida tem como objetivo manter a economia israelense parcialmente em funcionamento para evitar uma crise mais profunda. As autoridades afirmam acreditar que 400 mil pessoas já perderam ou vão perder o emprego nas próximas semanas.
Israel contabiliza, até esta quarta-feira (18), cerca de 500 casos de contaminação, cinco dos quais de pacientes em estado grave. Não houve nenhuma morte atribuída à Covid-19 até o momento.
Para tentar conter a disseminação do vírus, o governo proibiu reuniões com mais de dez pessoas e ordenou a manutenção de apenas 30% da força de trabalho em repartições públicas e empresas privadas.
Lojas, com exceção de supermercados e farmácias, e todo o setor de entretenimento estão fechados.
O anúncio mais polêmico, no entanto, foi o da utilização de tecnologia avançada para rastrear os telefones celulares de pacientes com coronavírus e indivíduos suspeitos de estarem infectados.
Até hoje, o sistema era usado apenas pelo Serviço de Segurança (Shin Bet).
O major Shefer elogiou os esforços dos palestinos para contar a epidemia na região. “Eles estão levando tudo a sério”, afirmou, apontando medidas como a proibição das rezas em mesquitas e igrejas.
Os “muezim” (encarregados de anunciar em voz alta, do alto dos minaretes, o momento das preces) têm repetido as palavras “rezem em casa, rezem em casa”. O vaivém de pessoas diminuiu drasticamente nas cidades palestinas, que mantêm apenas serviços básicos abertos.
O presidente de Israel, Reuven Rivlin telefonou nesta quarta para o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, para falar sobre os efeitos do coronavírus na região.
"O mundo está lidando com uma crise que não distingue pessoas ou endereços. Nossa capacidade de trabalhar juntos em tempos de crise também é prova de nossa capacidade de trabalhar juntos no futuro para o bem de todos nós", disse Rivlin. Abbas agradeceu a coordenação de esforços.
Até esta quarta-feira (18), o Ministério da Saúde palestino havia registrado 44 doentes com Covid-19, a maioria (40) em Belém. A cidade foi colocada em quarentena e está fechada para turistas, assim como a Igreja da Natividade.
Israelenses e palestinos colaboraram para retirar mil estrangeiros da cidade.
Três infectados com coronavírus são palestinos que voltaram do exterior pela ponte Allenby, na fronteira entre a Cisjordânia e a Jordânia. E há um caso de um trabalhador palestino de construção civil que teria sido contaminado pelo contato com um empreiteiro israelense.
A liderança do grupo islâmico Hamas, que controla a Faixa de Gaza, proibiu a entrada ou saída no enclave, fechando a fronteira com o Egito.
Na Esplanada das Mesquitas, em Jerusalém, onde fica a sagrada mesquita de Al-Aqsa), as orações ainda são realizadas. Mas líderes religiosos da Jordânia —que têm autoridade sobre a esplanada, apesar de ela ficar em Jerusalém— emitiram diversas orientações para que os fieis não fiquem próximos uns dos outros e rezem do lado de fora da mesquita, que tem sido constantemente esterilizada.
Segundo uma pesquisa do Instituto Truman para Paz da Universidade Hebraica de Jerusalém, 63% dos israelenses afirmam que Israel deve ajudar os palestinos durante a crise do coronavírus.
“A maioria dos israelenses acredita que, quando houver necessidade, o governo deve traçar medidas preventivas para ajudar os palestinos durante a epidemia da Covid-19”, disse Vered Vinitsky-Serousse, presidente do Instituto.
Reprodução da Folha de São Paulo.
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