quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

José Simão comemora aniversário da cidade de São Paulo


“E comer fora em São Paulo tá tão caro que os garçons deviam apresentar a conta com meia na cabeça e luva pra não deixar impressão digital!
E São Paulo é um vício! Não troco por nenhuma ilha paradisíaca! E eu já disse que paulista é o único brasileiro que leva macarrão a sério. Macarrão tem nome, sobrenome e recheio: parpadelle, agnolini com molho de mascarpone e carambola com recheio de shitake e shimeji. E quem foi o desgraçado que inventou o shitake? Rarará!
E a polícia de São Paulo parece polícia de ditador árabe!”


Pinheirinho, a estratégia da tensão


Pinheirinho, a estratégia da tensão

Num conflito sempre há alguém que joga com a carta da tensão. Ele ganha quando ocorrem choques, prisões, feridos e incêndios. Na operação militar que desalojou 1.600 famílias da área ocupada do Pinheirinho, em São José dos Campos, ganhou quem jogou na tensão. Conseguiram mobilizar 1,8 mil PMs, numa operação que resultou em dois dias de choques, no desabrigo de 2.000 pessoas, dez veículos destruídos, quatro propriedades incendiadas e 34 presos.
A gleba foi invadida em 2004 e está avaliada R$ 180 milhões. É o caso de se perguntar o que poderia ter sido feito ao longo de sete anos para evitar que o maior beneficiado pelo espetáculo fosse a massa falida de uma empresa do financista Naji Nahas, que deve R$ 17 milhões à prefeitura.
Intitulando-se líder dos moradores, está no elenco Valdir Martins, o "Marron", candidato a deputado estadual pelo Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, o PSTU, residente em Vila Interlagos e diretor do Sindicato dos Metalúrgicos local, como representante dos trabalhadores de uma empresa que não existe mais.
Pelo lado do poder público, o elenco inclui o governador Geraldo Alckmin em cujo primeiro governo ocorreu a invasão e o prefeito Eduardo Cury, que está no cargo desde 2005. Ambos são do PSDB.
Em 2008, o advogado André Albuquerque, fundador da empresa paranaense Terra Nova, especializada em regularização fundiária, foi convidado para estudar o caso do Pinheirinho. Ele resolveu 18 litígios, legalizando lotes de 10 mil famílias, das quais 2.000 já têm escritura.
Sua metodologia é simples. A Terra Nova negocia um valor aceitável com o proprietário da gleba e os moradores, vai ao juiz que está com processo de reintegração da posse e homologa o acordo.
Retirado o obstáculo que impede obras de infraestrutura na área, a empresa apresenta um projeto de urbanização à prefeitura. O proprietário recebe seu dinheiro num prazo que vai de cinco a dez anos, e os moradores pagam prestações mensais que, na média, custam R$ 200.
No Pinheirinho, o lote poderia valer entre R$ 3.000 e R$ 6.000, com prestações de R$ 60 a R$ 100 por dez anos. Jamais um dono de lote perdeu a casa por falta de pagamento.
"Marron" ouviu a proposta e informou que seu movimento não aceita negociar indenização, muito menos pagamento. O outro caminho seria o da desapropriação, pelo Ministério das Cidades, mera promessa da Viúva federal. Nada feito. Uma reunião posterior foi boicotada pelos representantes dos moradores. Há poucas semanas, diante da ameaça de uso da força policial, apareceu uma milícia de fancaria, com escudos de latão e perneiras de PVC. Deu no que deu.
Deu no que deu porque os organizadores do PSTU, o governo de São Paulo e a Prefeitura de São José aceitaram a estratégia da tensão. O governo da doutora Dilma achou que o caso podia esperar e, depois do conflito, fantasiou-se de São Jorge para matar o dragão que já havia devorado a princesa.
Desde 2008, enquanto o caldeirão do Pinheirinho ficava em fogo brando, a Terra Nova de André Albuquerque resolveu quatro litígios fundiários urbanos. Três em São Paulo (Casa Branca, Jardim Conquista e 1º de Maio) e um no Paraná (Vila Nova, em Matinhos). Segundo ele, mais de 1.500 famílias foram beneficiadas, sem polícia.



Sopa é arma protecionista dos EUA


Sopa é arma protecionista dos EUA

A semana passada foi agitada por protestos contra o Sopa (Stop Online Piracy Act; em português, algo como "parem a pirataria on-line"). É a lei antipirataria em debate no Congresso dos EUA.
A maioria deles, no entanto, deixou escapar o elemento mais importante: o Sopa é uma ferramenta para reforçar a hegemonia comercial do país na internet.
Disfarçado de medida antipirataria, o Sopa dá aos EUA o poder de bloquear qualquer site do mundo -e, assim, impedir seu acesso ao mercado americano.
Ele cria uma barreira comercial (como as que afetam produtos agrícolas), só que pior. O alvo são empreendedores globais que criam serviços de conteúdo como YouTube, Facebook ou Twitter.
O Sopa permite que governo e empresas tirem do ar, na hora, qualquer site estrangeiro que leve à violação da "propriedade intelectual", segundo seus próprios critérios.
Mais do que isso, a lei cria mecanismos para sufocar financeiramente o concorrente. Com uma mera notificação, instituições financeiras (como empresas de cartão de crédito) ficam proibidas de repassar dinheiro ao site banido.
A medida se aplica automaticamente. Quem discordar tem de brigar no Judiciário norte-americano. Se o site é americano, está isento do Sopa. O estrangeiro é alvo da indústria e da lei. Esse tipo de barreira comercial é inédita.
É como se a doutrina Monroe, que pregava "a América para os americanos", tivesse se reerguido da tumba. Só que formulada como "a internet para os americanos".



Capitalismo em crise


Capitalismo em crise

É sintomático da perplexidade contemporânea que seja o "Financial Times", bastião da ortodoxia, e não um jornal de esquerda que tenha tido a ideia de publicar uma série sob o título acima. O paradoxo não escapou a um dos colaboradores do jornal, para o qual a incapacidade da esquerda de capitalizar em cima da crise financeira demonstraria que, depois do colapso do comunismo real, não seria mais possível propor alternativa ao sistema atual.
O valor principal dos artigos não está na originalidade ou profundidade das análises. As matérias não passam de variações em defesa do status quo, revisto e melhorado por reformas de seus mais aberrantes defeitos. Uma síntese do sentido geral dos comentários é o do ex-assessor do presidente Obama, Larry Summers, cuja coautoria nos erros conducentes à crise não se discute. Segundo ele, a solução se encontraria em "pequenas reinvenções", não em questionamentos radicais. Ou, como reza o título de outro artigo, "O capitalismo morreu. Viva o capitalismo!"
A série se inspirou na preocupação com a crise de legitimidade do sistema. A escandalosa concentração de riqueza e de renda já alarmava antes os mais perceptivos. Para a maioria, no entanto, a eficácia passada do capitalismo em gerar prosperidade agia como um narcótico que amortecia a consciência da injustiça. Esta se torna insuportável na medida em que deixa de ser compensada por resultados palpáveis.
O exemplo do editorial introdutório é significativo. Nos últimos 30 anos, o salário dos dirigentes das cem maiores empresas saltou de 14 a 75 vezes mais do que o salário mediano, sem que, frisa o jornal, essa diferença se justificasse por qualquer desempenho correspondente. No fundo, a moral dos autores não é melhor do que a da nomenclatura chinesa: não há problema com a desigualdade e a injustiça em si mesmas; elas são condenáveis apenas quando o sistema se torna disfuncional na capacidade de gerar crescimento.
O corolário tácito é que a deslegitimação do sistema capitalista se dissipará naturalmente quando tudo voltar ao normal. Nesse ínterim, como se ignora quanto tempo teremos de esperar, conviria acalmar os indignados com alguma atenuação dos piores excessos. Isso, é claro, se os beneficiários de remuneração obscena aceitarem entrar no jogo de sacrificar um ou outro anel a fim de salvar os dedos.
Que incentivo teriam eles para tanto se sabem que os dedos nada têm a temer de uma esquerda desmoralizada e cabisbaixa?
Não obstante essas limitações, o mérito da série é de propor reflexão que se estende além do episódico, do sobe e desce das Bolsas e das oscilações da crise europeia. O que falta é aprofundar a análise, não só dos valores morais afetados, mas de questões que tocam na própria sobrevivência do capitalismo financeiro ocidental tal como existe. Podia-se começar pelas perguntas: terá esse sistema, sem reformas profundas, a capacidade de voltar a gerar taxas de crescimento capazes de absorver o desemprego estrutural e de assegurar o regime social de bem-estar? Será ele capaz de preservar a primazia ante o desafio de um capitalismo industrial mais jovem e vigoroso, o da China?


Freakonomics entrevista Ron Paul, pré-candidato à presidência dos Estados Unidos


Pré-candidato Ron Paul responde perguntas de leitores da Freakonomics

Stephen J. Dubner e Steven D. LevittFreakonomics

Em 2008, pouco depois das eleições presidenciais dos EUA, solicitamos aos leitores perguntas para o deputado do Texas Ron Paul, que havia concorrido à presidência naquele ano. Agora ele está concorrendo novamente e, diante de seu forte segundo lugar na primária de New Hampshire em 10 de janeiro, pensamos que seria interessante republicar suas respostas. Elas são interessantes e bem ponderadas do início ao fim, e é especialmente fascinante lê-las quatro anos mais tarde, depois de ver como as circunstâncias políticas mudaram (ou não mudaram).

P: Qual foi a primeira coisa que você pensou quando descobriu que o candidato republicano John McCain havia escolhido a governadora do Alaska Sarah Palin como sua colega na disputa?
R: Primeiro achei que foi uma escolha muito astuta, de uma perspectiva política. Eu também sabia que ela havia dito algumas coisas boas sobre mim no passado. Ao mesmo tempo, eu sabia que para estar na cédula presidencial, ela teria que aceitar as posições sobre política externa e a guerra, então isso neutralizou muito o meu entusiasmo.

P: Quem no Congresso você consideraria seu(s) colega(s) mais próximo(s)?
R: Há muitos colegas com quem eu trabalho numa série de assuntos. Walter Jones, um republicano que representa a Carolina do Norte, é um bom amigo e trabalha comigo em política externa. Com frequência no orçamento, se há uma votação de 423-3 votos, os outros dois congressistas republicanos que votam comigo na câmara são Jeff Flake do Arizona e Paul Broun da Geórgia. Muitas vezes eu trabalho com democratas em questões de liberdades civis. Meu ponto é que pessoas de todo o espectro político podem ficar do lado da liberdade e da Constituição. O objetivo é conseguir que uma maioria vote desta forma a maior parte do tempo.

P: Foi dito que você é a favor de se livrar do Departamento de Educação. Isso é verdade, e se for, como você acha que isso beneficiaria os Estados Unidos?
R: Acredito em eliminar o Departamento de Educação. Primeiro, a constituição não autoriza a existência do departamento – os fundadores da constituição norte-americana nunca vislumbraram que o governo federal ditasse as políticas educacionais dos EUA. Em segundo lugar, o departamento é uma burocracia imensa que desperdiça nosso dinheiro. Nós enviamos bilhões de dólares para Washington e recebemos menos do que o valor que colocamos lá. Deveríamos deixar esse dinheiro para os estados e comunidades locais em vez de deixar que ele seja desperdiçado em Washington.
Por fim, acho que as necessidades de educação de nosso país são mais bem atendidas pelo menor nível de governo possível. Professores, pais e líderes comunitários locais deveriam tomar as decisões sobre como exatamente nossos filhos devem ser ensinados – e não os burocratas de Washington. O Departamento de Educação criou a lei “Nenhuma Criança Deixada para Trás”, ordens sem financiamento, doutrinação e, em alguns casos, medicação psicotrópica obrigatória para nossas crianças. Deveríamos nos livrar de tudo isso e devolver essas escolhas para a população.

P: Que medidas você tomaria para reduzir o tamanho do governo?
R: A primeira coisa que eu faria, que poderia ser feita rapidamente, é mudar nossa política externa. De acordo com minhas estimativas, se você somar todos nossos gastos fora do país, gastamos quase US$ 1 trilhão por ano. De acordo com um relatório do Departamento de Defesa de 2008, temos bases militares em mais de 130 países e bem mais de 50 mil soldados na Alemanha, e nossos corajosos militares, homens e mulheres, estão presos em duas guerras no Oriente Médio. Ao anunciar que os EUA terão uma política externa de não-intervenção com foco no comércio, diplomacia e viagens – e que não policiaremos um mundo, e ficaremos fora das questões internas de outras nações – poderíamos cortar esse US$ 1 trilhão pela metade e ainda ter uma forte defesa nacional para nos manter seguros. Todo o dinheiro que pouparíamos poderia ser usado para os programas de benefícios dos EUA, garantindo que haja financiamento suficiente para pessoas que se tornaram dependentes, e ajudando os jovens a saírem do sistema.
Em segundo lugar, eu reafirmaria o respeito pela 10ª Emenda – que reduz o poder do governo federal. A constituição não autoriza muitas das coisas que Washington faz atualmente. Eu eliminaria gradualmente departamentos inteiros e devolveria essas funções aos estados como a constituição pretendia. Os departamentos de Educação e Energia estariam no topo da minha lista.
Finalmente, eu olharia para o nosso sistema monetário. Um governo só pode cobrar tantos impostos de seu povo antes que ele diga não. Quando isso acontece, e o governo já emprestou tudo o que podia, ele simplesmente expande a quantidade de dinheiro. Esta inflação é um imposto escondido que cai diretamente sobre a classe média. Um dinheiro forte e honesto iria muito mais longe na direção de impedir os políticos que gastam muito.

P: Como você estimularia nossa fraca economia?
R: Vamos começar com o que eu não faria, que é tornar o problema pior. Nós não podemos resolver nossos problemas continuando a fazer o que vínhamos fazendo – emprestar dinheiro do exterior enquanto criamos mais dinheiro e crédito do nada. Distorcer taxas de juros e inflar a quantidade de moeda pode às vezes fornecer um alívio momentâneo. Mas isso só piora a dor a longo prazo.
Durante a campanha presidencial, eu divulguei um plano de quatro pontos, e enquanto presidente eu o seguiria à risca, enquanto também pediria conselhos a especialistas para melhorá-lo. Meu plano de quatro pontos consiste em: 1) reforma dos impostos: reduzir o fardo de impostos e eliminar impostos que punem o investimento e a poupança, incluindo impostos corporativos que matam os empregos; 2) reforma nos gastos: eliminar os gastos exagerados, reduzir os compromissos no exterior e congelar todos os gastos que não são de direito e para defesa nos níveis atuais; 3) reforma da política monetária: tornar o Federal Reserve mais transparente, por exemplo, exigindo que ele transmita suas reuniões pela televisão; e 4) reforma regulatória: repelir regulações como o Ato Sarbanes-Oxley que obriga companhias a buscar capital fora dos mercados dos EUA, e liberar os bancos comunitários para alimentar o crescimento econômico local.


Tradutor: Eloise De Vylder

Reprodução de conteúdo do UOL.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Falta de manutenção ameaça patrimônio histórico no centro de São Luís; 70 casarões podem desabar

A má conservação dos prédios ameaçam um dos maiores conjuntos arquitetônicos de origem portuguesa no Brasil, localizado no centro histórico de São Luís (MA). Segundo registros do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e da Defesa Civil municipal, cerca de 70 casarões correm risco iminente de desabar.

Segundo o Iphan, o centro histórico de São Luís está inscrito na lista do Patrimônio Mundial, tombado pelo governo federal em 1955. Ao todo, 50 casarões estão localizados em uma área que compreende 1.342 imóveis, construídos nos séculos 18 e 19, tombados pelo governo federal. Já na área tombada pelo Estado, que possui 4.258 casarões, a Defesa Civil contabilizou 19 prédios com problemas de infiltrações e que correm sério risco de cair.



“Durante todo o ano, realizamos o monitoramento desses casarões, catalogando os que estão com problema, e notificando os proprietários para que sejam feitas intervenções imediatas para evitar desabamentos. O principal problema é que o tempo da Justiça não é o mesmo tempo das ações que esses prédios precisam”, afirmou a superintendente do Iphan no Maranhão, Kátia Bogea.

O Iphan diz que boa parte dos casarões pertence a estrangeiros ou a brasileiros que não residem no Maranhão. “É um absurdo o que vemos aqui. O descaso com o abandono desses imóveis, que fazem parte da história do Estado e do país. A maioria dos donos desses imóveis se apaixonou pelo local, adquiriu um imóvel e hoje não gasta um centavo para conservação dos mesmos”, contou.

Bogea explicou que os imóveis são construídos com armações em madeira e argamassa, revestidos por azulejos portugueses. “O modelo os torna mais vulneráveis à ação de cupins e infiltrações de água, devido ao crescimento de raízes de plantas nos telhados”, disse.

A superintendente citou o exemplo de um prédio localizado na rua do Giz, pertencente a um italiano, que aparentemente não estava com problemas estruturais, mas tinha o telhado podre e desabou. “O prédio estava fechado e não dava para notar por fora que ele estava sendo destruído por cupins e a madeira teria ficado podre depois de uma chuva. De repente, parte do telhado desabou e tivemos de fazer um trabalho emergencial de escoramento, que custou R$ 96 mil, para não comprometer as edificações vizinhas.”

Segundo Bogea, o Iphan localizou o proprietário, notificou e ingressou com uma ação na Justiça, cobrando a restituição do valor gasto. Caso ele não reforme o imóvel, deverá ser desapropriado.

Chuva aumenta risco

Segundo a Defesa Civil, cinco dos casarões ameaçados ainda são usados como moradia pelo proprietário ou por invasores, que se recusam a deixar os imóveis mesmo cientes dos riscos.

Com a chegada do período de chuvas no Maranhão, a Defesa Civil de São Luís informou que, durante a semana passada, realizou ações para conscientizar os moradores a procurar outros abrigos.

“Dos cinco imóveis registrados que abrigam famílias, quatro não conseguimos encontrar os moradores, que são invasores e passam o dia pedindo esmolas pelas ruas de São Luís e usam os casarões na parte da noite para dormir”, contou a superintendente de Defesa Civil municipal, Elitânia Barros.

A Defesa Civil informou que um dos cinco imóveis está habitado por uma proprietária, que se recusa a deixar o local “devido à história que viveu no imóvel.” “Nem os filhos a convenceram de sair e já repassamos a notificação para a guarda municipal tomar providência para retirada da senhora”, contou.

Em 2009, uma ação conjunta da Defesa Civil com a Prefeitura de São Luís retirou 17 famílias que viviam em um imóvel localizado na rua de Nazaré, de propriedade de um francês que comprou o casarão e foi embora para a terra-natal, deixando o local abandonado e aberto para invasores.

“Esse imóvel está interditado, fechado com concreto para que não haja novas invasões e todas as famílias retiradas ficaram recebendo auxílio-moradia. Este ano elas foram contempladas com o programa ‘Minha Casa, Minha Vida’. Mas ações similares a esta são difíceis de acontecer”, ressaltou.

Segundo Elitânia, alguns casarões podem ser desapropriados e ingressar no Programa de Revitalização do Centro Histórico, desenvolvido pela prefeitura, que terá a posse do imóvel para utilizá-lo para se tornar sede de administrações municipais que pagavam aluguel ou até locais de desenvolvimento de ações sociais.

Do UOL Notícias. A reportagem é ilustrada com fotos do casario em risco. 

Tempo fujão


"Tempus fugit"

Depois de nos privar de Plutão, que teve sua planetariedade cassada em 2006, cientistas agora ameaçam bagunçar o tempo.
Pretendem eliminar os segundos bissextos ocasionalmente introduzidos no calendário para fazer com que o tempo dos relógios atômicos (oficialmente, 1 segundo equivale a 9.192.631.770 ciclos de radiação emitidos pelo césio-133) não se divorcie de vez do tempo astronômico, em que o segundo vale 1/86.400 do dia.
Até os anos 60, a astronomia era a guardiã absoluta do tempo, mas aí descobrimos que o planeta é pouco pontual: a velocidade da rotação terrestre atrasa um número variável de milissegundos a cada ano.
Se os segundos corretivos forem de fato eliminados -a decisão foi adiada para 2015-, o tempo se tornará mais abstrato. Não dirá mais respeito à noite, ao dia, às estações e aos anos.
Os cientistas, é claro, têm suas razões. O problema é que nossos corações são insensíveis a elas. O tempo encerra uma dimensão psicológica à qual não podemos escapar.
Nas "Confissões", santo Agostinho vislumbrou o tamanho da encrenca: "Se nada sobreviesse, não haveria tempo futuro, e se agora nada houvesse, não existiria o tempo presente. De que modo existem aqueles dois tempos -o passado e o futuro-, se o passado já não existe e o futuro ainda não veio? Quanto ao presente, se fosse sempre presente, e não passasse para o pretérito, já não seria tempo, mas eternidade".
Não é por acaso que, além de Agostinho, vários filósofos se apressaram a concluir que o tempo não passa de uma ilusão. Mesmo que ele seja uma realidade ontológica, como querem os físicos, continua despertando perplexidades e até paixões.
Nem toda ciência, filosofia e poesia do mundo nos fazem deixar de lamentar o passado e temer o futuro. Quem traduziu bem esse sentimento foi Virgílio: "Sed fugit interea, fugit irreparabile tempus" (mas ele foge: foge irreparavelmente o tempo).


Europa rejeita transgênicos


Negócio dos transgênicos foge da Europa devido à rejeição social e política

Juan Gómez e Rafael Méndez
Em Berlim e Madri

A Europa não é continente para transgênicos. A rejeição social e política em muitos países deixou a UE muito atrasada nesse campo. E o anúncio de que a multinacional alemã Basf vai transferir para os EUA e a América do Sul a maior parte de suas pesquisas sobre transgênicos é o último sintoma da vitória de ecologistas e grupos de consumidores nessa dura disputa. Das grandes do setor, só a Bayer mantém centros de pesquisa na Europa.
A gigante química alemã Basf justifica sua decisão pela baixa demanda por esses produtos na Europa. Segundo a porta-voz Julia Meder, a multinacional prosseguirá suas pesquisas genéticas no continente americano. A Basf fecha seus três laboratórios genéticos com a consequente redução de pessoal e transfere sua sede central de biotecnologia de Limburgerhof (Renânia) para Raleigh (Carolina do Norte). Os produtos geneticamente modificados "não encontram aceitação suficiente na Europa" para justificar os investimentos. Só a Espanha, diz a empresa, "é aparentemente exceção". Mas em conjunto "o mercado europeu é reticente demais" para que seja rentável.
Em 2004 a suíça Syngenta tomou uma decisão semelhante. Como a Monsanto, Dow e Dupont não mantêm centros de pesquisa na Europa, isso implica que das grandes empresas do setor só a Bayer mantém centros na UE.
Carel du Marchie Sarvaas, diretor de biotecnologia da Europa Bio, associação empresarial do setor, considera a situação desastrosa. "Falamos de postos de trabalho para doutorados, bem remunerados, e as empresas europeias os levam para os EUA. É a típica coisa que deveria fazer as pessoas refletir." A Basf não dá números sobre os investimentos cancelados, mas afirma que fez pesquisas no valor de mais de 1 bilhão de euros nos últimos 15 anos.
As dificuldades de implantação na Europa não se devem tanto a restrições legais para a pesquisa e o cultivo, como à rejeição do consumidor. Uma pesquisa de 2010 com 16 mil questionários constatou um aumento da rejeição aos transgênicos: havia subido de 57% em 2005 para 61%. Enquanto isso, o apoio baixou de 27% para 23% (na Espanha, de 66% em 1996 para 35%). "Ao contrário da indústria e dos cientistas, os europeus consideram que os organismos geneticamente modificados não oferecem benefícios e são inseguros", concluiu. E isso apesar de que em quase duas décadas de uso de transgênicos até a Organização Mundial da Saúde (OMS) avalizou sua segurança. Então só seis países cultivavam transgênicos: Espanha (líder em milho resistente à praga da broca), República Checa, Portugal, Romênia, Polônia e Eslováquia. Na Europa havia só cerca de 100 mil hectares, comparados com 134 milhões no mundo.
A situação é tal que França, Alemanha, Hungria, Grécia, Austrália, Luxemburgo e Bulgária proibiram o milho cultivado na Espanha. E outros como a Áustria votam sistematicamente contra a opinião da Agência Europeia de Segurança Alimentar. Nos EUA e nos países em desenvolvimento, por sua vez, há muito menos debate. Carlos Vicente, diretor de biotecnologia da Monsanto para a Espanha, afirma que a paralisação europeia não afetará o desenvolvimento mundial: "Países muito importantes na produção de matérias-primas agrícolas, como Canadá, EUA, Brasil, Argentina, China ou Índia, por exemplo, continuam avançando no desenvolvimento da biotecnologia agrícola".
A Basf conseguiu em 2010 a licença de cultivo de uma batata transgênica. Ela é geneticamente modificada (a empresa a chama de "melhorada") para que contenha mais amido de uso industrial que uma batata normal. Isso gerou uma onda de protestos na Alemanha.
A batata Amflora chegou a ser cultivada legalmente em um estado do leste do país. O governo regional ordenou seu confisco quando se soube que na Suécia haviam sido cultivadas entre as Amflora outros tipos de batatas modificadas que não tinham licença. A Basf não comercializa diretamente produtos agrícolas, mas colabora com empresas como Monsanto ou Bayer. Com eles desenvolvem as sementes modificadas que chegam ao mercado através desses parceiros.
A saída da Basf do continente gerou ontem um debate político na Alemanha. Os liberais do DFDP lamentaram a "perda para o desenvolvimento científico". A política "não soube enfrentar uma corrente de pensamento anticientífica e alheia à realidade", disseram. Parlamentares dos Verdes, por sua vez, afirmaram que a decisão da Basf se deveu meramente ao "fracasso comercial" de seus produtos agrícolas.
Os ecologistas comemoraram o anúncio como uma vitória: "A decisão da Basf é um aviso para firmas como Monsanto, Syngenta ou Bayer, que continuam pressionando para introduzir cultivos transgênicos na Europa. O exemplo da Basf demonstra que forçar a vontade dos consumidores e da grande maioria dos agricultores nem sequer é rentável economicamente", manifestou em um comunicado a Amigos da Terra.
O professor de pesquisa do CSIC Pere Puigdomènech opina que a retirada da Basf "pode ser vista como uma vitória ecologista ou como uma perda para a Europa, porque a biotecnologia aplicada à alimentação não será freada. O Brasil, por exemplo, fez uma vagem transgênica e os EUA debatem agora a aprovação da alfafa". Puigdomènech destaca outro aspecto, que ao perder a pesquisa a UE também perde o controle: "Importam-se milhões de toneladas de grãos transgênicos, mas não poderemos controlar se for produzido por outros e não tivermos a tecnologia".

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves



Os doutores blindaram os implantes


Os doutores blindaram os implantes


Os cirurgiões plásticos e suas guildas deveriam convocar um congresso da categoria para discutir os aspectos desastrosos de suas condutas diante das adversidades provocadas pelos implantes de mamas de silicone PIP.
A ruína poderia ter sido evitada em 2009, quando a Câmara aprovou um projeto do deputado Miro Teixeira exigindo que os médicos comprovassem a "ciência da parte do paciente de todos os riscos eventuais do uso de silicone quando implantado no organismo humano". A nobiliarquia médica mobilizou-se contra a exigência e prevaleceu, pois o projeto morreu no Senado.
Até abril de 2010, quando o uso dos implantes PIP foi proibido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, estima-se que 20 mil brasileiras tenham passado por esse tipo de cirurgia. Desde então, a Anvisa recebeu 39 queixas de ruptura dos implantes e 55 de outros efeitos adversos.
Em todos os casos, as reclamações vieram de pacientes. Não houve uma só notificação de médico. Zero, mesmo sabendo-se que, antes de reclamar na Anvisa, a vítima queixou-se a ele. (É verdade que os computecas da agência avisam no site do órgão que só se chega ao formulário de "evento adverso" com um navegador, o Explorer, da Microsoft.)
A agência recebe anualmente 650 mil queixas de pacientes e apenas 200 notificações de profissionais. Essa disparidade resulta do ambiente promíscuo onde coabitam a indústria farmacêutica, médicos e hospitais. Mesmo assim, no primeiro semestre de 2011 ocorreram 323 queixas relacionadas com a má qualidade de luvas de procedimentos.
A revendedora das próteses -EMI Importação e Distribuição- foi obrigada pela Justiça a pagar uma nova cirurgia e a troca da prótese. Notificação do médico? Nem pensar. O silêncio persistiu ao longo de 2009 e 2010, quando o fabricante verificou que o índice de rompimento dos seus implantes oscilava entre 30% e 40% e indenizou mais de uma centena de vítimas, na França.
Os médicos que implantaram essas mamas souberam dos problemas e nada disseram à Anvisa. Serão obrigados a defender suas condutas na Justiça, pois não só há ações das vítimas, como o Ministério Público entrará no lance. A Anvisa, que não deu atenção às queixas das pacientes, responderá pela sua inépcia.
Ocorrida a desgraça, a Sociedade Brasileira de Mastologia informou que um estudo de 2002 revelou que os índices de ruptura dos implantes oscilavam entre 26% em quatro anos, 47% em dez anos e 69% em 18 anos.
Em 2009, combatendo a exigência da comprovação do conhecimento, pelas clientes, dos riscos que corriam, o Conselho Federal de Medicina disse o seguinte: "O médico brasileiro é obrigado, por questões éticas, a explicar a seu paciente o que será usado como propedêutica e como terapêutica, sem a necessidade de um 'laudo de autorização' que, sem trazer qualquer benefício ao paciente, irá -ao contrário- provocar uma situação de constrangimento para o médico que empregue a prótese de silicone e uma expectativa negativa por parte do paciente. Isso mostra que a exigência de autorização por escrito para a realização desse procedimento médico é incabível".
Incabível era jogar para baixo do tapete uma justa "expectativa negativa" da paciente. Boa notícia: daqui a duas semanas, com a Câmara reaberta, Miro Teixeira reapresenta seu projeto, com novas salvaguardas.



Presidente de El Salvador pede perdão por chacina ocorrida na guerra civil


Presidente de El Salvador pede perdão por chacina ocorrida na guerra civil

Juan José Dalton
El PaísEm San Salvador (El Salvador)

O exército matou mil pessoas em 1981, a metade delas menores

O presidente de El Salvador, Mauricio Funes, com palavras entrecortadas e olhos vermelhos, qualificou como "barbárie" o que na história da guerra civil salvadorenha é conhecido como o massacre de El Mozote. A chacina, ocorrida entre 11 e 13 de dezembro de 1981 e executada por soldados do Batalhão Contrainsurgente Atlacatl, tirou a vida de cerca de mil pessoas, a metade delas menores de idade.
"Aqui foram cometidos inúmeros atos de barbárie e violações dos direitos humanos: inocentes foram torturados e executados; mulheres e meninas sofreram abusos sexuais e centenas de salvadorenhos e salvadorenhas hoje fazem parte de uma longa lista de desaparecidos, enquanto outros tiveram de emigrar e perder tudo para salvar suas vidas", disse Funes diante de centenas de moradores do município de Meanguera, onde se situa El Mozote.
O presidente teve um gesto sem precedentes: mencionou os chefes responsáveis pelo que é considerado o maior massacre já ocorrido em países latino-americanos que sofreram conflitos armados. "O tenente-coronel Domingo Monterrosa, comandante daquele batalhão; seu segundo no comando, o major José Armando Azmitia Melara; o chefe de operações, o então major Natividad de Jesús Cáceres Cabrera" tiveram, segundo Funes, responsabilidade específica.
El Mozote e os casarios a seu redor, a cerca de 175 quilômetros a leste da capital salvadorenha, eram habitados por agricultores pobres. Sua proximidade dos acampamentos da guerrilha Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN) os transformou em "suspeitos" de ser a base da insurgência. Por isso o exército os dizimou selvagemente em operações de "terra arrasada" que aprendera nas bases americanas, onde assimilou práticas que os EUA haviam aplicado no Vietnã. Houve outros massacres de agricultores como os de Río Sumpul, Guajoyo, El Junquillo e El Calabozo. E o exército também matou seis padres jesuítas, quatro freiras americanas e quatro jornalistas holandeses.
Durante a guerra também ocorreram massacres contra a Zona Rosa, onde morreram 13 pessoas, entre elas quatro fuzileiros navais americanos, e o chamado massacre de Mayo Sibrián, provocado por um comandante rebelde que assassinou cerca de 800 guerrilheiros e colaboradores que considerou "inimigos infiltrados".
Funes não só reconheceu os fatos como pediu perdão aos sobreviventes e parentes em nome do Estado salvadorenho. Ao mesmo tempo, instruiu os chefes das forças armadas para que façam "uma revisão de sua interpretação da história à luz deste reconhecimento".
Até o momento, o tenente-coronel Monterrosa e seus subalternos em Atlacatl, que morreram em um atentado guerrilheiro, são considerados heróis para o exército. "Exatamente porque 20 anos depois dos acordos de paz estamos diante de uma instituição militar diferente, profissional, democrática, obediente ao poder civil, não podemos continuar apresentando como heróis da instituição e do país chefes militares que estiveram envolvidos em graves violações dos direitos humanos."
Ele fez um apelo aos partidos políticos para que substituam hinos e lemas que façam referência à violência no país. O hino do partido Aliança Republicana Nacionalista (Arena), por exemplo, chama a transformar El Salvador em "uma tumba onde os vermelhos terminarão".
O presidente também pediu a promotores e juízes que acabem com a impunidade histórica que existiu em El Salvador, amparada na anistia geral de 1993, decretada pelo então presidente Alfredo Cristiani.
Finalmente, Funes fez anúncios importantes para a população de Morazán, que já foi zona de guerra. Será implementada uma série de projetos de saúde, educação, infraestrutura viária e apoio aos pequenos empresários para as comunidades estabelecidas em El Mozote e arredores.
A guerra salvadorenha começou em 1980 devido ao assassinato do arcebispo Oscar Romero, deixando 75 mil mortos e 8 mil desaparecidos. A ONU mediou um processo de negociação que durou mais de dois anos, até que foi assinada a paz em 16 de janeiro de 1992, há 20 anos.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves



sábado, 21 de janeiro de 2012

'Chavs': a demonização da classe trabalhadora britânica


A demonização da classe trabalhadora britânica tem uma sigla indecifrável: “Chavs”. Ninguém sabe o que significa, mas em páginas web, em programas de televisão e em análises midiáticas populares ou “sérias”, serve para estigmatizar os jovens que vivem em moradias municipais e têm um tipo específico de sotaque e aspecto físico. “Na realidade é uma maneira oblíqua de definir o conjunto da classe trabalhadora e responsabilizar os pobres de ser pobres”, escreve Owem Jones, autor de “Chavs”, um livro chave sobre o tema. Em meio à atual crise, a justificativa cai como anel no dedo. A pobreza não se deve aos problemas da economia, mas às falhas do próprio indivíduo ou de sua família: aos lares deslocados, à falta de ambição ou inteligência.
As três décadas de neoliberalismo, inauguradas por Margaret Thatcher com uma drástica desindustrialização nos anos 80, marcaram o triunfo de um individualismo que afundou o sistema de valores solidários da classe trabalhadora. Em 1979 havia sete milhões de operários com um forte peso de mineiros, portuários e do setor automotivo. Hoje há dois milhões e meio, as minas desapareceram e só a empresa automotiva, em mãos estrangeiras, está crescendo.
Neste vazio de identidade, de uma classe operária em retirada, surgem os “chavs”. Objeto de escárnio na imprensa ou de piada em programas de televisão e cenas de classe média, os “chavs” são apresentados como parasitas encravados no tecido social. Segundo o estereótipo são desempregados crônicos, adolescentes que engravidam para receber auxílio-maternidade, responsáveis pelo déficit fiscal e moral, virtuais delinquentes com um coeficiente de inteligência pelo chão e uma família disfuncional. “O que chamávamos de respeitável classe trabalhadora praticamente desapareceu. Hoje a classe trabalhadora na verdade não trabalha nada e está mantida pelo estado de bem-estar”, assinala o comentarista conservador Simom Heffer.
O estereótipo ajudou a justificar o draconiano ajuste fiscal da coalizão conservadora liberal-democrata encabeçada pelo primeiro ministro David Cameron, mas também tem servido de base para propostas reacionárias, de limpeza social. Em 2008, o vereador conservador, Johm Ward, propôs a esterilização obrigatória das pessoas que tiveram um segundo ou terceiro filho enquanto recebiam benefícios sociais, medida apoiada com entusiasmo pelos leitores do jornal conservador “Daily Mail”, escandalizados com “estes aproveitadores e sem-vergonhas que estão afundando o país”.
A obsessão classista e o estereótipo levaram a confusões tragicômicas. Em um panfleto para as eleições de 2010, os conservadores asseguraram que em algumas zonas pobres “a gravidez de adolescentes menores de 18 anos é de 54 %”. Na verdade era 5,4%, cifra que representava uma queda com respeito ao que acontecia durante o Thatcherismo. No departamento de imprensa conservador ninguém percebeu o erro tipográfico. Apesar de se referir a mais da metade das menores de 18 anos dessas zonas, o fenômeno já havia sido naturalizado pelo preconceito.
Uma das curiosidades é que se usa o término Chavs com certeza de conceito sociológico, mesmo que ninguém possa dizer com certeza o que significa o acrônimo. O dicionário de oxford na internet define o “Chav” como “um jovem de classe baixa de conduta estridente, que anda em grupo e usa roupas de marca, reais ou imitadas”. Outro dicionário, de 2005, o define como “jovem de classe trabalhadora que se veste com roupa esportiva” Um mito popular o faz passar como “Council Housed and Violent” (violento que vive em casas municipais).
Esta vacuidade permite englobar amplos setores sociais. Em um livro que já está na nona edição e vendeu mais de 100 mil exemplares, “The Little book of Chavs”, se identificam os típicos trabalhos “chavs”. A “chavette” – mulher chav – é aprendiz de cabeleireiro, faxineira ou camareira enquanto os homens são guardas de segurança ou mecânicos e encanadores “cowboys” (“especialistas” em reparações que destroem tudo). Segundo o livro, “chavs” de ambos os sexos costumam ser 'caixas' nos supermercados ou empregados de lanchonetes.
Panorama
Esta tipificação ocupacional corre paralela às mudanças que a classe trabalhadora britânica viveu nos últimos 30 anos. Hoje um quarto da força de trabalho tem uma jornada precária e mais de um milhão e meio se encontra em empregos temporários. O salário médio de 170 mil cabeleireiras (“chavettes”) está pouco acima da metade da média salarial da população, medida que define a linha de pobreza no Reino Unido. Em cidades que alguma vez giraram em torno à atividade manufatureira ou mineira, os escassos trabalhos que existem são em supermercados ou farmácias. “Não só são trabalhos mais inseguros. Estão muito pior pagos.
Quando a Rover faliu em Birmingham com a perda de 6500 postos de trabalho, a remuneração média que receberam aqueles que conseguiram trabalho era um quinto menor do que ganhavam na automotiva”, aponta Owem Jones.
O paradoxo é que em uma sociedade tão classista como a britânica, na qual o sotaque e a universidade (Oxford, Cambridge) definem o futuro de uma pessoa, conservadores e novos trabalhistas propagam o mito de que hoje todos os britânicos são de “classe média”, salvo essa pequena subclasse disfuncional e patológica, para a qual falta ambição ou fibra moral: os Chavs. Em 1910 Winstom Churchill, então ministro do interior do Partido trabalhista propôs a esterilização de mais de 100 mil pessoas que considerava “débeis mentais e degenerados morais” para salvar o país da decadência. Um século mais tarde a decadência continua ameaçando o Reino Unido, mas a fórmula é mais “civilizada”: um estigma que nega a existência e o significado social da classe trabalhadora. 

Texto visto no Opera Mundi

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

A Era da Incerteza




André Dahmer, na Folha de São Paulo, 17/01/2012.

A um passo da xenofobia


A um passo da xenofobia

Escaldado pelos brasileiros deportados de Madri sem justificativa plausível, o país se juntou em 2008 à reação regional à Diretiva de Retorno da União Europeia, que endureceu o tratamento a imigrantes em situação irregular.
O Mercosul aprovou nota de repúdio. Exigiu "reciprocidade" pelos imigrantes europeus do passado e prometeu "lutar contra qualquer forma de racismo, discriminação, xenofobia".
Na abertura da Assembleia Geral da ONU naquele ano, Lula disse que "muitos dos que pregam a livre circulação de mercadorias e capitais são os mesmos que impedem a livre circulação de homens e mulheres".
É uma contradição, portanto, que o governo Dilma comece a ceder aos que demonstram pelos haitianos recém-chegados à região Norte a mesma intolerância condenada nos dirigentes da Europa.
Fala-se com exagero numa "invasão", quando o número de imigrados é de cerca de 4.000. Na região, o assunto é usado na campanha eleitoral deste ano. O senador Eduardo Braga (PMDB-AM) sugeriu à Rádio Senado que parte dos autorizados a ficar poderia estar ligada ao narcotráfico.
Antes das restrições anunciadas anteontem, a Secretaria de Direitos Humanos prometera "acolher com humanismo" os que chegassem. O "New York Times" espantou-se porque os haitianos recebiam vacina, água e duas refeições diárias.
O tráfico de pessoas deve ser combatido, para evitar mortes como as já ocorridas aos milhares no deserto entre os EUA e o México. Mas o anúncio de deportação dos que chegarem sem visto precisa ser esclarecido. Não pode, por exemplo, impedir a reunião de famílias.
É verdade, como se repete, que temos nossas próprias carências. Em 2010, porém, 44 mil estrangeiros ilegais se beneficiaram de uma anistia aprovada pelo Congresso e não consta que tenham causado prejuízo ao país.



Agora, sim: "Big Brother" zumbi


Agora, sim: "Big Brother" zumbi

Tarde do dia 64. As câmeras focalizam Space, que está fumando um cigarro na estufa de plantas. Marky e Veronica tomam sol na piscina. Joplin e Pippa estão no sofá, conversando.
"Quer dizer, o que é a televisão?", filosofa Joplin, enquanto a companheira de confinamento pinta as unhas dos pés. "É apenas uma grande seta apontando para longe do problema. Especialmente em programas como este." Mirando o horizonte, Pippa retruca, pensativa: "Os dedos do pé têm ossos?".
Começa amanhã, dia 10 de janeiro, o "Big Brother Brasil 12", na Globo, e espera-se que seja tão bom quanto os cinco episódios da minissérie inglesa "Dead Set", de Charlie Brooker, produzida em 2008 pelo E4 e exibida no Brasil pelo Multishow.
A série se passa dentro da casa do "Big Brother" inglês, onde os participantes se encontram efetivamente confinados por conta de um apocalipse zumbi que tomou conta do mundo.
Conforme previsto, eles agem como se a epidemia fosse uma prova especial da produção, ficam lisonjeados com os gritos lá fora e aplaudem a nova participante que consegue entrar na casa - uma estagiária ensanguentada fugindo dos zumbis.
Além disso, a transmissão ao vivo não é interrompida, e tudo acontece em noite de eliminação.
A série de terror conta com a participação de inúmeros ex-BBBs de verdade e da apresentadora oficial da versão britânica, Davina McCall, em papel de destaque -ela admitiu inspirar-se no vilão de "O Exterminador do Futuro 2" para criar seus trejeitos moribundos. É como se Pedro Bial viesse rastejando pelo corredor, olhasse para a câmera e gritasse: "Miolos!".
Charlie Brooker trabalhou com um orçamento apertado. As cenas de Davina foram filmadas em um só dia, e os mesmos figurantes tiveram de interpretar diferentes mortos-vivos por conta do alto custo das lentes de contato. Em lugar de uma caríssima explosão de carro, recorreu-se a um prosaico "problema mecânico" para justificar uma fuga a pé. As cenas do público na noite de paredão são verdadeiras, e muitos dos extras da multidão decrépita foram voluntários recrutados via internet.
Apesar das limitações de produção e da relativa falta de originalidade do enredo, a atração foi bem recebida pelo público e pela crítica, que a consideraram bastante realista. Não me surpreenderia se terminasse com a legenda "baseada em fatos reais".
Amanhã, protejam seus miolos.


terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Como se fossem bebês, cães entendem humanos, diz estudo


Muitas pessoas conversam com seus cachorros como se estivessem se dirigindo a seus filhos. Agora, um novo estudo relata que esses animais têm uma compreensão de uma criança de seis meses a um ano de idade, sendo capazes de compreender a comunicação humana e interpretar intenções de forma correta.
Pesquisadores da Hungria, que publicaram o estudo na revista "Current Biology", mostraram dois vídeos a um grupo de cães.
No primeiro, uma mulher diz "olá, cão", enquanto olha diretamente para a câmera. A mulher então se vira em direção a um contêiner, e o cão segue seu olhar.
No entanto, quando a mulher olha para baixo, e não para a câmera, e pronuncia a mesma frase, o cão não segue seu olhar subsequente.
Para os estudiosos, os cães captam a diferença sutil no comportamento da mulher nas duas situações, diz Adam Miklosi, biólogo comportamental da Universidade Eotvos Lorand de Budapeste, na Hungria, e um dos autores da pesquisa.
O estudo mostra que os cães são capazes de "ler" o comportamento humano, acredita o pesquisador, como os humanos em sua primeira infância.
"Os cães são funcionalmente similares a um bebê", compara Miklosi. "Não sabemos como a mente canina lida com o problema, mas deve ser provavelmente uma maneira diferente do bebê".
Os cães presumivelmente adquiriram esta habilidade após gerações de domesticação. "Estar numa família humana confere aos cães a habilidade de interagir de forma humana", diz Miklosi.
"Você realmente pode tratar seu cão como uma espécie de bebê, coisa que não faria com um bode ou outro animal doméstico", explica.


Texto do The New York Times, reproduzido na Folha.com .

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Primeiro-ministro português incentiva emigração


Primeiro-ministro português incentiva o "ame-o ou deixe-o"

PATRÍCIA CAMPOS MELLO
DE SÃO PAULO

O primeiro-ministro de Portugal, Pedro Passos Coelho, sugeriu no fim do ano que os professores portugueses desempregados emigrem para países como o Brasil e Angola. As declarações causaram enorme celeuma em Portugal, que vive uma das maiores crises de sua história. Aqui no Brasil, a notícia não repercutiu.
Em entrevista ao jornal "Correio da Manhã" em 18 de dezembro, Passos Coelho afirmou que os professores "excedentes" de Portugal deveriam procurar emprego "em Angola e não só. O Brasil tem também uma grande necessidade ao nível do ensino básico e secundário." E acrescentou: "Sabemos que há muitos professores em Portugal que não têm, nesta altura, ocupação. E o próprio sistema privado não consegue ter oferta para todos."
Na entrevista, o primeiro-ministro ressaltou também que Angola teria capacidade para absorver mão de obra portuguesa em setores relacionados a "tecnologias de informação e do conhecimento, e ainda em áreas muito relacionadas com a saúde, com a educação, com a área ambiental, com comunicações".
Para não deixar dúvidas de que estava realmente incentivando a emigração: "Nos próximos anos haverá muita gente em Portugal que, das duas uma: ou consegue nessa área fazer formação e estar disponível para outras áreas ou, querendo manter-se sobretudo como professores, pode olhar para todo o mercado da língua portuguesa e encontrar aí uma alternativa."
Questionado sobre o bom senso de se incentivar o êxodo de mão de obra qualificada do país, Passos Coelho não recuou -disse apenas que a questão da emigração é um "episódio lateral" e que ele tem como princípio falar a verdade e não iludir a população.
Paulo Rangel, um outro líder do PSD, o partido do primeiro-ministro, foi além: sugeriu que deveria ser criada uma agência governamental para ajudar quem queira emigrar por não encontrar trabalho em Portugal.
Isso em um país que tem um dos piores níveis de escolarização da Europa. Segundo o relatório do Desenvolvimento Humano de 2011, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), a escolarização média da população de Portugal com mais de 25 anos era de 7,7 anos, enquanto na Grécia e na Itália era de 10,1 anos. Na Alemanha é de 12,2 e nos EUA, de 12,4.

KIT DE EMIGRAÇÃO

Os professores, irados, mandaram Passos Coelho fazer as malas e se mudar do país. Na internet, já surgiram "kits de emigração do Passos Coelho", com os dizeres "Desempregado? Kit de emigração do governo de Portugal". O pacote inclui uma lancheira, espaço para diploma, passagem aérea só de ida, foto de um parente com seu prato favorito.
"Primeiro foi a surpresa e o choque [com as declarações de Passos Coelho]; depois virou piada", conta a jornalista portuguesa Rita Siza, do jornal "Público" e colunista da Folha.
O desânimo em Portugal é generalizado. O governo cortou salários e adicionais de férias e Natal dos funcionários públicos. O setor privado está negociando reduções de salários com os funcionários: em uma empresa, foram negociados três cortes salariais em 2011.