Os 20 anos que se seguiram ao final da Segunda Guerra Mundial se caracterizaram por alta nas taxas de natalidade, sobretudo nos países "centrais", que tanta influência exercem na cultura mundial, e por expressivo crescimento econômico.
Foi como se a sociedade, inocentemente, festejasse o final da tirania, os horrores do Holocausto, as atrocidades que levaram muitos à morte e uma destruição apocalíptica.
E os casais tiveram mais filhos, muitos. Um boom de nascimentos. Nascia a geração baby-boomers.
Mais saudáveis do que qualquer geração precedente, beneficiários de avanços científicos –vacinas e antibióticos antes inexistentes, para citar apenas dois. Mais bem informados, com níveis educacionais superiores aos de seus pais, que dirá avós. E com um pouquinho de dinheiro no bolso –até a Segunda Guerra, mesmo nos países mais ricos, as crianças tinham que trabalhar para comer assim que chegassem aos 12, 14 anos.
E o que fizemos, por sermos muitos, mais saudáveis e informados? Impactamos todas as etapas de vida desde então, começando com a "invenção" da adolescência, como a entendemos hoje. Rebelamo-nos, viramos a mesa, tornamo-nos ativistas, ousamos, criamos costumes.
Dos Beatles à Tropicália, dos movimentos estudantis de 1968 às lutas contra a opressão —e, para as mulheres, o começo da revolução sexual. Com a pílula, elas deixavam de ser escravas do aparelho reprodutor.
Sou de uma geração que, quando íamos para o quarto com os namorados/as e trancávamos a porta, os pais não sabiam o que fazer. Crescemos. Agora, quando vamos fazer um cruzeiro com alguém que conhecemos "outro dia", são os netos que não sabem o que dizer.
Da adolescência à gerontolescência. Novos padrões de comportamento, estilos de vida. A mesma ousadia de antes, a mesma rebeldia –só que 50, 60 anos depois, com maior conhecimento, discernimento e maturidade.
Como poderíamos envelhecer do mesmo jeito que nossos pais, que dirá nossos avós? Assistimos agora a uma nova transição. Claro, não da infância para a idade adulta, mas desta para a tal da velhice.
Como vai ser? Daqui a 15, 20 anos, veremos. O certo é que, da mesma forma que em um dicionário dos anos 1950 não encontraríamos uma definição de adolescência como a entendemos hoje, ainda é cedo para definir gerontolescência, pois a estamos definindo.
Se a adolescência dura cinco ou seis anos (ou deveria, embora seja bem verdade que tenho colegas de faculdade que se comportam como tal, o que não recomendo), a gerontolescência dura dos 55/60 anos aos para lá dos 80. É muito tempo para virar a mesa, se rebelar, ousar, ciente de nossos direitos, prontos para por eles lutar.
Claro, em um país tão desigual como o nosso, muitos não tiveram adolescência, precisaram trabalhar para comer. E muitos mal conseguem envelhecer e ter esse privilégio que eu, entre outros, tenho de fazê-lo sem amarras, com mais saúde, conhecimentos, consciente de meus direitos, lutando pela cidadania plena.
O desabrochar desta “nova” fase de nossas vidas já cria novas histórias e revolucionará o futuro. A gerontolescência subverterá o “outono da vida” por primaveras múltiplas e ampliadas!
Texto de Alexandre Kalache, na Folha de São Paulo.
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