Joaquim Barbosa não mudou.
Conversa a coerência, que sempre incomodou a mídia lacerdinha, de quando acusou Gilmar Mendes de ter capangas, de quando se pronunciou sobre as cotas raciais e de que se posicionou sobre a questão da extradição do italiano Cesare Battisti.
Na época, Reinaldo Azevedo, o lacerdinha mais lacerdinha da atualidade, não o perdoava.
“Por cinco a quatro, os ministros do Supremo decidiram dar continuidade ao julgamento sobre o processo de extradição de Cesare Battisti. Eros Grau já antecipou seu voto em favor da simples extinção do processo. O ministro Joaquim Barbosa pediu para antecipar o voto “por razões de saúde” — aquela coluna dele, vocês sabem… Acusou a “arrogância” da Itália. Foi além: diz que o embaixador da Itália lhe pediu audiência, e isso, segundo diz, caracteriza a arrogância do que chamou de “potência estrangeira”. O valente se tem em tão alta conta, que lhe pedir uma simples audiência já caracteriza uma espécie de ofensa. Num despropósito que me parece escandaloso, Joaquim Barbosa perguntou se o Brasil teria o direito de contestar, por exemplo, a política migratória da Itália, lembrando os famélicos que se lançam ao mar etc. De que diabos ele falava? De nada! Estava apenas praticando baixo proselitismo. O ministro falou em nome de uma espécie de pátria ofendida contra uma “potência estrangeira” — que é como ele insistiu em chamar a Itália. Até parece que foram os italianos que atacaram o Judiciário brasileiro. Não! Aconteceu o contrário! Foi Tarso Genro quem atacou a Justiça Italiana. O fato que fica mais claro, a cada dia, é que Barbosa é fraco. Muito fraco. Estou começando a concluir que o Supremo ganha quando ele tem dor na coluna. Quanto mais ele fala, mais absurda se torna a sua fala. Diz que o fato de a Itália ter recorrido da extradição daria a qualquer país o direito de recorrer de decisões soberanas tomadas pelo Brasil.”
Na questão das cotas, Reinaldo Lacerdinha Azevedo voltou a atacar o ministro:
“Joaquim Barbosa não parece ter muita paciência com aqueles de quem diverge. Ou as pessoas estão do lado do Bem — e concordam com Joaquim Barbosa — ou estão do lado do Mal e se dedicam apenas à defesa dos seus interesses mesquinhos. Não estamos falando de um daqueles tribunais que se simulam muitas vezes em escolas de ensino fundamental e médio. Estamos falando do Supremo Tribunal Federal. É surrealista! Qualquer ministro branco que eventualmente se opusesse às cotas, então, estaria, segundo Barbosa, defendendo um interesse pessoal. Já Barbosa, negro e pró-cotas, só tem esse pensamento porque é um amigo da humanidade. O Bem de um lado, o Mal de outro.
Conviva sem reação com esses absurdos retóricos e argumentativos quem quiser. Eu não convivo. E não venham com a história de que Barbosa disse ou quis dizer outra coisa. Está tudo gravado. Está lá. Ele disse e quis dizer o que disse”.
O fraco tornou-se milagrosamente forte.
Passou a ser aceito com representante do bem contra o mal.
O argumento da defesa de interesse pessoal, por discordância, agora recai sobre Ricardo Lewandowski.
O Bem de um lado, o Mal do outro.
Reinaldo Azevedo, agora, durante o julgamento do mensalão, descobriu, enfim, qualidades em Joaquim Barbosa:
“A VEJA desta semana traz na capa a imagem de um menino negro, de olhar severo e altivo. É Joaquim Barbosa, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal, aos 14 anos. Num país acostumado à impunidade, ao “isso não vai dar em nada”, ele se tornou uma justa referência. Segue trecho da reportagem de Hugo Marques e Laura Diniz. Lula estava certo: um ex-garoto pobre viria a simbolizar a esperança, e falta muito para que cheguemos lá, do fim da impunidade no Brasil. A mãe de Joaquim Barbosa, leitor amigo, a exemplo da sua e da minha, também “nasceu analfabeta”. Acabou dando à luz um futuro ministro do Supremo, obcecado pela leitura e pelo estudo, não um Messias de araque…”
O ódio idelológico compromete qualquer argumentação.
*
Eliane Cantanhêde, colunista da Folha de S. Paulo, costuma ser mais comedida.
Mesmo assim, tem seus momentos lacerdinhas.
Sobre Joaquim Barbosa, quando da briga do ministro com o colega Gilmar Mendes, ela falou assim:
“Nunca antes neste país se viram ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) tão loquazes, muito menos trocando desaforos ao vivo. O fato é que a formalidade do tribunal e das próprias togas não combinou com o palavreado do ministro Joaquim Barbosa em plena sessão transmitida pela TV”
Barbosa disse que Gilmar tinha capangas e estava “destruindo a credibilidade da Justiça brasileira”.
Eliane ficou chocada e não conteve a sua indignação com tamanho destempero: “Barbosa mais parecia o delegado Protógenes do que um magistrado da alta corte em uma sessão pública. Em bom português, isso é o fim da picada”.
O tom, nestes novos tempos, é outro.
Eliane adota agora o tom de novela de televisão:
” A semana que antecede as eleições é de Joaquim Barbosa, o menino negro do interior, filho de pedreiro, que se formou em direito, fez mestrado e doutorado nas melhores universidades, estudou línguas e está bagunçando o coreto do Supremo Tribunal Federal justamente no chamado “julgamento do século”. Ao nomeá-lo, Lula escreveu certo por linhas tortas. Dizem que está arrependidíssimo. Joaquim é ministro de amor e ódio, de ame-o ou deixe-o. Adorado pela opinião pública –sobretudo em Brasília, onde continua sendo o “Joca” dos tempos de UnB–, é odiado por petistas de cúpula e de base, mexendo com a solenidade fria do STF e com as emoções quentes dos colegas. Especialmente dos mercuriais”.
O que era linguajar indigno da corte tornou-se capacidade de mexer com a “solenidade fria do STF”.
Aquilo que maculava o ritual, virou virtude. As dores da coluna, que, segundo Reinaldo Azevedo, salvavam, por vezes, o STF das decisões de Barbosa, transformaram-se em sinais da coragem de um mártir, de um abnegado, de um salvador da pátria:
“Respaldado pela toga, justificado pelas dores de coluna, perdoado pelas origens e exposto pelas transmissões ao vivo, ele bateu boca e trocou adjetivos nada polidos com Gilmar Mendes (em outros julgamentos), com o revisor Lewandowski (virou uma guerra) e com o polemista Marco Aurélio (que ultrapassou limites, ao ver perigo na ascensão de Joaquim à presidência, em novembro)”.
O que era “o fim da picada” passou a ser apenas uma troca de “adjetivos nada polidos”, algo “perdoado pelas origens”.
O homem que mais parecia o “delegado Protógenes” passou a ser um um exemplo de neutralidade:
“Veja que a escolha de “adversários” por Joaquim não é ideológica nem partidária –é improvável que, na cabine indevassável, Gilmar e Lewandowski depositem o mesmo voto. Talvez seja mais por excesso de convicções e seu desdobramento quase natural: o voluntarismo. Pois será justamente Joaquim quem estará dissecando as entranhas do governo Lula e do PT nesta semana. Enquanto Lula e Dilma estiverem nos palanques e no horário nobre falando maravilhas de Haddad, Joaquim gastará tardes inteiras para contar os podres de José Dirceu e do partido do candidato. Guerra de audiências como nunca se viu”.
Barbosa não mudou.
Ainda bem.
A mídia lacerdinha é que muda de acorda com as conveniências.
Ou seja, também não mudou.
Salvo em relação a Joaquim Barbosa.
O “fraco, muito fraco” virou forte, muito forte.
Como sempre fora.
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