A revolta dos monges tibetanos
Por EDWARD WONG
DHARAMSALA, Índia - Um jovem monge tibetano chutou veículos militares chineses e depois deixou um bilhete suicida condenando a proibição oficial a uma cerimônia religiosa. Outro sorria com frequência e preferia falar sobre o budismo, em vez de política. Um terceiro, ex-monge, gostava de tratar de animais.
Todos tinham usado as túnicas púrpuras do mosteiro Kirti, uma instituição venerável de aprendizado cercada por montanhas na borda leste do planalto tibetano. Os três atearam fogo aos próprios corpos em protesto contra o domínio chinês. Dois morreram.
Segundo a Campanha Internacional para o Tibete, um grupo de ação civil em Washington, pelo menos 38 tibetanos se imolaram desde 2009. Destes, 29 morreram. Os cerca de 2.000 monges do mosteiro de Kirti, na província de Sichuan, estão no centro do movimento.
Dos que se sacrificaram, 25 vieram de Ngaba, o condado que inclui Kirti. Eram monges ou ex-monges de Hirti 15 pessoas. Duas eram freiras do convento Mame Dechen Chokorling.
Unidades paramilitares chinesas hoje estão posicionadas em cada quarteirão da cidade de Ngaba, e Kirti está sob cerco. Os jornalistas são proibidos de entrar no mosteiro.
Mas os monges e leigos de Ngaba que fugiram através dos Himalaias até a cidade de Dharamsala, nas montanhas da Índia, disseram que Kirti se radicalizou nos últimos quatro anos devido a uma ocupação do mosteiro que representou uma das repressões mais duras contra o Tibete. As medidas de segurança chinesas transformaram o mosteiro de muros brancos em uma prisão.
Depois de um intervalo de cinco semanas, as autoimolações recomeçaram. Em 27 de maio, dois homens em Lhasa, a capital do Tibete, se sacrificaram perto do templo de Jokhang, o mais sagrado do budismo tibetano. Um deles era um ex-monge de Kirtim. Em 30 de maio, a mãe de três crianças se queimou até a morte em Ngaba.
Os exilados de Ngaba dizem que as medidas de segurança impostas à cidade e ao mosteiro foram extremas. Em 2008, durante um levante geral no Tibete, as forças de segurança atiraram contra manifestantes em Ngaba matando pelo menos dez civis, incluindo um monge.
Em fevereiro de 2009, no mercado da cidade, um jovem de Kirti se imolou, sendo o primeiro monge a fazê-lo na história moderna do Tibete. O monge, chamado Tapey, sobreviveu, e as autoridades reforçaram a vigilância em Kirti. Em março de 2011, ocorreu mais uma autoimolação: Phuntsog, de 20 anos, ateou fogo a si mesmo.
Os tibetanos locais dizem que a dura reação das autoridades nos seis meses depois desse acontecimento acabou incentivando mais autoimolações. As autoridades chinesas ordenaram que a Polícia Armada do Povo cercasse o mosteiro. Também proibiram todas as atividades religiosas, destruíram fotografias do Dalai Lama, o líder espiritual tibetano, obrigaram os monges a frequentar aulas de reeducação patriótica e impediram o acesso à Internet. Elas também levaram 300 monges em uma batida noturna, muitos dos quais não retornaram.
Um monge de Kirti, Lobsang, disse que a polícia paramilitar havia montado quatro acampamentos em torno do mosteiro. Lobsang, que chegou aqui recentemente, falou sob a condição de que apenas seu primeiro nome fosse citado. "Essa tem sido nossa vida desde 2008", disse. "Eu preferia levar um tiro a ter armas apontadas para mim todos os dias, 24 horas."
As autoridades chinesas condenaram alguns dos autoimoladores como "terroristas" e culparam o Dalai Lama por incitar os atos, acusação que ele negou.
Em setembro, depois que as autoridades abrandaram algumas restrições em Kirti, dois monges correram pelo mercado ao meio-dia com as vestes em chamas. Um segurava a bandeira proibida do Tibete, o leão da neve. Antes de cair, um dos monges, Lobsang Kelsang, gritou: "Nós somos os acusados".
O fato foi descrito por uma testemunha que chegou a Dharamsala recentemente. "Por causa de julgamentos injustos, políticas opressoras e discriminação, por causa de tudo isso, a população tibetana se sente isolada", disse. "As autoimolações não são o fim. Apenas o começo."
Colaborou Zhang Wei, de Pequim
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