Exilados cubanos sofrem com a crise espanhola
Por RAPHAEL MINDER
MADRI - Depois que a Espanha negociou a libertação da prisão de 715 dissidentes cubanos, quase dois anos atrás, eles vieram para cá expressando enorme gratidão pela oportunidade de recomeçar em um país que parecia cheio de promessas. Os espanhóis também ficaram orgulhosos do que foi considerado um golpe de mestre diplomático.
Hoje muitos dos cubanos protestam novamente -desta vez, sobre as precárias condições de vida, a falta de empregos e a perda dos subsídios de um governo hoje sem caixa. Um deles, Albert Santiago du Bouchet, ficou tão desanimado, segundo sua mulher e amigos, que se suicidou em abril.
A reviravolta causou um embaraço a Espanha e salientou sua profunda e súbita transformação do que parecia uma terra de oportunidades para uma das piores economias da Europa. O país está em uma crise bancária e uma recessão enquanto luta para evitar um resgate no estilo grego.
Os cubanos, que foram transplantados junto com 647 parentes, tornaram-se o exemplo mais destacado das dificuldades dos mais de 5 milhões de imigrantes -11% da população- que chegaram durante o período de uma década de êxito da Espanha, mas hoje estão na linha de frente da crise econômica.
"Como recém-chegados a um país que hoje tem mais de 5 milhões de desempregados, é difícil gerar alguma simpatia aqui", disse Ricardo González Alfonso, o jornalista cubano que estava entre os primeiros 12 dissidentes a chegar a Madri. "Mas nossa situação é desesperadora, e não sei como vou alimentar minha família depois deste mês."
O desemprego entre migrantes alcançou 37%, acima da média nacional de 24,4%, a mais alta da Europa. Em abril, o governo anunciou que migrantes que não são cidadãos espanhóis não teriam mais direito a tratamentos gratuitos no sistema de saúde do Estado sem provar uma situação de plena residência. Até agora, eles podiam ser tratados desde que estivessem registrados junto às autoridades locais.
González Alfonso foi preso em 2003, como parte da repressão à mídia do regime Castro, e condenado a 21 anos de cadeia.
Enquanto ele e outros são gratos por terem deixado a prisão mais cedo, muitos dissidentes dizem que estariam mais felizes se voltassem a Cuba. "Alguém que veio para cá por vontade própria pode ao menos voltar para casa, enquanto para nós não existe possibilidade de retorno a Cuba, que é onde eu gostaria de viver", disse González Alfonso.
Os dissidentes continuam recebendo cerca de US$ 1 mil por mês de grupos de exílio cubano em Miami, assim como a ajuda da comunidade cubana da Espanha. No entanto, González Alfonso diz que os US$ 1.600 mensais em subsídios que recebia do governo espanhol foram cancelados no fim de janeiro. Alguns críticos dizem que o governo abandonou os cubanos.
O governo conservador do primeiro-ministro Mariano Rajoy insiste que não rompeu promessas e diz que a decisão tem de ser vista no contexto dos grandes cortes orçamentários.
Alguns exilados sentem que foram peões para as ambições da Espanha. "O governo espanhol não foi motivado por preocupações humanitárias, mas porque queria ser visto como o país europeu que poderia mudar a política em relação a Cuba", disse Omar Rodríguez Saludes, fotojornalista que cumpria pena de 27 anos.
"Quando você vê o quão pouco eles se importam conosco, fica claro que fomos apenas uma moeda de barganha."
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