Uma vez eu vi o Evaristo de Macedo sentado num banco na rua. Sim, o ex-jogador dos anos 1950 e 60, do Flamengo, do Barcelona e do Real Madrid. Mas, naturalmente, o reconheci de sua fase mais senhoril, como ex-técnico do Flamengo e de outros times menores como a seleção brasileira dos anos 1980. Ele parecia já ter já quase 80 anos.
Me emocionei. E ele não estava fazendo nada, só sentado. Sem conversar, sem fazer carinho em pombo, sem compartilhar notícia falsa em rede social. E olha que é difícil realmente não fazer nada. Elegantemente, num primeiro momento, virei a cara.
Mas não resisti e olhei de novo. Ele provavelmente percebeu que eu estava olhando. Merda. Que situação chata. Disfarcei, olhei em outra direção, mas uma força me puxava de volta. Queria resistir, queria não ficar olhando. Que vergonha. Tentei olhar de novo só rapidinho, ele já devia até ter ido embora.
Não. Não só não tinha ido embora como agora estava olhando fixamente na minha direção. Ele havia percebido. E agora estávamos nos olhando nos olhos, sem disfarces. Esse olhar… Esse doce olhar… Foi aí que bateu: o Evaristo de Macedo em pessoa sentadinho num banco de praça!
“Gente, olha lá o Evaristo de Macedo sentadinho!”, deixei escapar para um qualquer do meu lado, que me ignorou e voltou a fingir que não estava fazendo nada, quando na verdade estava fazendo alguma coisa. Não importa. Agora, para mim, só existiam Evaristo e eu. Definitivamente ele percebeu.
Que vergonha. Por que será que quando vemos alguma pessoa famosa na rua ficamos olhando? Já me disseram que é como ver um monumento, como a torre Eiffel. Você pode até não admirar a arquitetura, mas não tem como não ficar olhando. Uma vez eu vi o Marcelo Serrado e não fiquei olhando. Não que eu esteja comparando o Marcelo Serrado com a torre Eiffel. São propostas diferentes.
Agora não havia mais escolha. Eu tinha que atravessar a rua e ir até lá. Ele poderia até achar bom, não é todo mundo que consegue reconhecer o Evaristo de Macedo hoje em dia. Estamos trocando olhares não sensuais já há algum tempo. Chega. Tomei coragem. Fui falar com ele. Atravessei, cheguei perto, me agachei ao seu lado e olhei dentro de seus olhos, ele me olhou de volta.
Não era o Evaristo de Macedo. Era só um velho.
Texto de Daniel Furlan, na Folha de São Paulo.
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