Comprei um estimulador de clitóris. Aos 41 anos eu nunca havia adquirido ou sequer provado qualquer tipo de vibrador. Quem me recomendou a marca foi meu psiquiatra, cansado das minhas reclamações acerca do meu atraso orgástico, efeito colateral do antidepressivo. Ele me disse que trocou os remédios da esposa quatro vezes, até que lhe deu esse aparelhinho e todos os problemas foram resolvidos.
A caixinha chegou violada e, a essa altura da vida, eu que tinha inventado um pseudônimo durante a compra online, tive que informar três sobrenomes, CPF, RG e número de celular no SAC. O gerente, que para a minha surpresa não tinha voz de cafetão (e por que teria, meu Deus? É apenas um sex shop, eu deveria ser menos tia velha reaça), me ligou para explicar que os brinquedos sexuais importados (eu estava com a minha filha no colo nessa hora) precisavam ser testados antes da entrega, porque "imagina a senhora receber e não poder usar?". Essa frase me causou espécie. Primeiro o termo "senhora", depois a certeza presumida sobre minha urgência: "imagina o DESESPERO da SENHORA em receber e não poder usar?".
Já ia desligando, quando pensei em perguntar "testados como?". Mas entendi que se tratava apenas de verificar a funcionalidade da língua no quesito "sim, ela liga", e não no quesito "sim, dez das nossas funcionárias usaram a sua lingueta vibratória e gemeram até perder a consciência". De qualquer maneira, borrifei bastante álcool 70, até porque, se fosse uma jaca ou uma miniatura da Basílica de São Pedro, já é o que eu faria mesmo.
Sim, eu comprei um aparelho que simula uma língua, mas uma língua com 14 padrões de operação, sendo que nenhum deles é o clássico "peraí, meu maxilar travou". Achei mais girl power, ou senhora power, não comprar um pênis. Não quis associar nada masculino ao meu desbravamento. E, pra falar a verdade, seria ridículo ter um pinto na gaveta. Nunca vou entender. Não sou a Perpétua, irmã da Tieta.
Tranquei a porta do escritório, abaixei as persianas. Começo a pensar sem parar. Onde eu vou guardar isso depois? Se alguém achar, digo que é um estimulador de colágeno facial em formato de baiacu desinchado. Tive um ataque de riso. Claro, minha ironia sempre atrapalhou demais minha vida sexual. Espantava os rapazes ou os transformava em amigões. E agora estava estragando o clima comigo mesma. Eu precisava transpor essa barreira. Isso me ajudaria a resgatar tantas coisas. Era em nome da família que eu faria isso. Pensei na bandeira do Brasil com os dizeres "língua e progresso". Ou "ordem e linguada".
Posicionei o aparelhinho na função "intenso contínuo" e, antes de ajeitar uma almofadinha abaixo dos meus joelhos por motivos de "é melhor para a coluna", já alcancei o almejado prazer. Não demorou nem um minuto. Olha, amigos, com o advento da venlafaxina (que tanto bem faz para a minha ansiedade e depressão) eu não tinha um orgasmo em menos de 40 minutos desde a era Lula. Max Tongue reavivou em mim a esperança de dias melhores. E aí você me diz: "Ah, e com tanta coisa séria acontecendo você vai ficar falando de". Só que nem deu tempo de você terminar essa sua frase e eu já tive outro orgasmo.
Mandei 26 emojis de mãozinhas rezando para meu psiquiatra. Ele respondeu com 3 emojis de foguinho. Eu respondi com um emoji de língua e um gatinho assustado. Ele respondeu com emoji de palmas. Que médico maravilhoso!
Texto de Tati Bernardi, na Folha de São Paulo.
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