Região turística turca vira base de rebeldes
Por JEFFREY GETTLEMAN
ANTAKYA, Turquia - As pessoas daqui a chamam de Toscana com minaretes.
O quadrante sudeste da Turquia, junto à fronteira com a Síria, é uma das regiões mais pitorescas do país, com olivais encobrindo seus campos ondulados, e montanhas sulcadas por córregos cristalinos. Pelas manhãs, idosas descem os morros para pegarem damascos nos mercados. À noite, turistas passeiam por alamedas com calçamento de pedra.
Mas há uma nova uma onda de recém-chegados: sírios, especialmente combatentes. Não é raro ver soldados rebeldes mancando de muletas pela cidade turística de Antakya, e incontáveis apartamentos da região foram transformados em clínicas improvisadas, que ficam lotadas de jovens corpulentos feridos a bala.
Suprimentos médicos, equipamentos militares e combatentes se infiltram todas as noites pelos 890 km de fronteira, fazendo deste charmoso pedaço da Turquia a mais importante base para a crescente rebelião síria.
A guerra civil na Síria virou uma dor de cabeça para a segurança nacional turca. Em 30 de julho, Ancara despachou soldados, blindados e mísseis para a fronteira, embora as autoridades tenham se apressado em descrever a mobilização como "rotineira".
Além do ônus de receber 40 mil refugiados, um posto de fronteira no lado sírio acaba de cair nas mãos de um grupo ligado à rede terrorista Al Qaeda, e cerca de doze combatentes líbios foram recentemente vistos no principal hospital de Antakya, esperando seus "irmãos" feridos.
Houve rumores de que um contingente de combatentes líbios havia acabado de desembarcar no aeroporto local, portando coletes à prova de balas.
Aparentemente, Antakya tem atraído "jihadistas" estrangeiros que chegam à Turquia para travar uma guerra santa na Síria. Um refugiado recém-chegado de Bab al Hawa disse que cerca de 200 jihadistas estrangeiros haviam capturado essa cidade fronteiriça.
Outra zona de fronteira foi dominada no lado sírio por milicianos curdos, deixando os turcos temerosos de que o rápido esfacelamento do governo de Bashar Assad possa estimular ativistas curdos na Turquia.
Questionado recentemente sobre a hipótese de a Turquia bombardear a Síria caso militantes curdos usem o país árabe como base, o primeiro-ministro turco, Tayyip Erdogan, disse: "Isso não é nem questão de discussão; é um dado".
Mas o conflito na vizinhança não permite respostas fáceis. Originalmente, o governo turco pediu reformas a Assad. Como ele recusou, a Turquia escancarou suas portas ao Exército Sírio Livre, grupo rebelde obstinado, mas incipiente, cujos líderes operam a partir de um acampamento fortemente vigiado no lado turco da fronteira.
Os turcos tentam sutilmente guiar os acontecimentos na Síria, estimulando a oposição a se unir, recebendo várias reuniões de alto escalão com líderes rebeldes e ajudando os insurgentes a obter armas. Ancara, no entanto, tem receio de se envolver mais profundamente.
"Esta sociedade está colhendo os frutos da prosperidade econômica, e não quer que ela seja destruída por algum envolvimento externo", disse Ilter Turand, professor de relações internacionais na Universidade Bilgi, em Istambul.
De certa forma, os dois vizinhos não poderiam ser mais diferentes, no momento.
A Turquia, democrática, fortemente nacionalista, ordeira e ascendente, versus a Síria, autoritária, profundamente dividida e mergulhando em uma confusa guerra civil.
Antakya é uma cidade turística, conhecida por suas ruínas, suas igrejas e um museu que abriga um dos melhores acervos existentes de mosaicos romanos e arte bizantina.
Os campos ao seu redor são incrivelmente férteis, produzindo azeitonas, cerejas, melões enormes e doces, e uma culinária famosa pelo uso inovador de ingredientes frescos.
Nos fins de semana, a cidade costumava receber sírios que vinham fazer compras. Um agente de viagens que não quis se identificar disse que sua clientela caiu de 2.000 por dia para zero, e que ele acaba de demitir suas três últimas secretárias.
"Esse conflito não nos afetou", afirmou. "Ele acabou conosco."
Sebnem Arsu colaborou com reportagem
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