segunda-feira, 2 de abril de 2012

Opinião: na América Central, desigualdade, impunidade, corrupção e narcotráfico


Opinião: na América Central, desigualdade, impunidade, corrupção e narcotráfico


M. Á. Bastenier

O centro da América é a parte mais perigosa da Terra; nessa estreita faixa de 2.800 quilômetros de comprimento, 520 mil quilômetros quadrados --pouco maior que a Espanha-- e 45 milhões de habitantes --a mesma população-- se encontram os três países que sofrem a maior violência civil do planeta. Honduras, com 82 homicídios para cada 100 mil habitantes por ano; El Salvador, 71; Guatemala, 52; e 44 para toda a América Central. Todos eles são números oficiais de 2010 e que, por isso mesmo, são muito otimistas.

Honduras tem a dramática distinção de que San Pedro Sula, com 159 homicídios, foi no ano passado a cidade com mais mortes violentas por habitante do mundo inteiro. Ciudad Juárez, no México, só pôde ficar em segundo.

Em novembro de 2011 realizaram-se eleições presidenciais na Guatemala e, há dois domingos, legislativas e locais em El Salvador, e em ambas ganhou claramente a direita de toda a vida, de uma esquerda de fantasia social-democrata, mas sem bases sociais em que se sustentar. Na Europa teria sido interpretada como uma virada conservadora, mas na América Central é mais diretamente a busca do milagreiro que remedie uma situação na qual a recuperação formal da democracia --extinto o fenômeno guerrilheiro nos anos 1990-- é só papel molhado, o mesmo que se deposita pontualmente nas urnas.

A metade dos guatemaltecos --os que votam-- elegeram um antigo general, Otto Pérez Molina, cujo programa é a inevitável mão-dura e a mais que evitável intervenção militar, de um corpo especial chamado kaibiles, que são os enviados nas missões da ONU. E em El Salvador, a Arena, partido do ditador Efraín Ríos Montt, finalmente submetido a julgamento como assassino em série --de massacres-- durante a guerra contra a dissidência, dobrou seu número de lugares para 35, contra 33 do partido da antiga guerrilha FMLN, do presidente Maurício Funes. E com os 11 de Gana, grupo saído da própria Arena, a direita teria maioria no Congresso.

Por que a morte em tempo de paz fala majoritariamente castelhano? A pobreza influi, mas não decisivamente. Desigualdade, impunidade, corrupção e narcotráfico pesam muito mais. A desigualdade data da colônia, mas as independências a agravaram ao eliminar a relativa proteção de que gozava o súdito do antigo regime, convertido de repente em cidadão, mas inerme diante de um mercado de poderosos vendedores.

A impunidade é consequência da inoperância e cumplicidade criminosa da polícia. O jurista espanhol Carlos Castresana, que dirigiu um organismo criado pela ONU para reformular a justiça guatemalteca, quis introduzir a prova científica irrefutável nos tribunais, porque os bandos compravam, intimidavam ou matavam as testemunhas. Mas demitiu-se em junho de 2010, sobrepujado pelo país. A Guatemala caiu do 91º lugar para o 120º, entre 182 países, no índice de corrupção compilado pela Transparência Internacional, e mesmo assim antecede a Nicarágua e Honduras.

O BID calcula que a renda centro-americana seria 25% maior se a criminalidade igualasse a média mundial, que é de 14 por 100 mil habitantes. E nessa parada de monstros aparece o narcotráfico, que corrompe e mata sem distinção de siglas. Diversos municípios de El Salvador formaram uma sociedade mista com a Venezuela para receber petróleo em condições muito vantajosas, mas isso não influiu na situação, nem econômica nem de segurança, e com a vitória da Arena a maioria dessas prefeituras abandonará o projeto.

A única indústria que floresce é a das companhias de segurança, que na América Central já são mais de 10 mil, o dobro de 2006. Em Honduras, finalmente, foram absolvidos em outubro de 2010 seis generais hoje aposentados, que no ano anterior expulsaram o presidente democraticamente eleito Manuel Zelaya, que acusavam de chavista. Desigualdade, impunidade, corrupção e narcotráfico só ocorrem nessa proporção no mundo ibero-americano.

Tudo isso se resume em um corolário sucinto. O Estado não existe, e enquanto não se reorganizar a polícia, o exército, mal treinado para o combate e a investigação a domicílio, mais atrapalha que ajuda. Como se comprova no México, que luta com um problema parecido, a força pública precisa de meios --armas, treinamento, melhor salário; um extenso trabalho de inteligência e coordenação entre instituições, o que Castresana pretendia e Horatio Caine aborda na série CSI; estudar a possível descriminalização de algumas drogas; e, talvez o mais importante, um enfoque transnacional, porque é toda a América Central que tem, ou logo terá, um gravíssimo problema.


Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves




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