Ciência versus intuição
A TEORIA econômica é uma ciência mais simples do que seus cultores neoclássicos ou ortodoxos supõem. Toda a matemática que usam para desenvolver seus modelos alienados da realidade é, além de desnecessária, prejudicial, porque os conduz a transformar o mercado em um mito, e a propor sua desregulamentação, cujo resultado são graves crises financeiras.
Mas isso não significa que a teoria econômica seja um conjunto de conhecimentos intuitivos. Pelo contrário, ela só se torna inovadora quando rompe com o senso comum.
Adam Smith rejeitou o senso comum quando disse que a riqueza da nação não estava em seu ouro e seus templos, mas na produção; Marx, quando mostrou que o lucro resultava de uma troca de valores equivalentes no mercado.
Schumpeter, quando ensinou que não é a posse do capital mas a capacidade do empresário de inovar e de ter acesso ao crédito que é decisiva; Keynes, quando argumentou que é o investimento que determina a poupança.
Hoje os economistas estão diante de um quebra-cabeça. A intuição lhes diz que "os países ricos em capital devem transferir seus capitais aos países pobres em capital", ou seja: países em desenvolvimento deveriam incorrer em déficit em conta-corrente e financiá-los com empréstimos ou investimentos diretos.
Entretanto, os países asiáticos dinâmicos, que crescem bem mais do que os latino-americanos, têm superávit em conta-corrente (superávit comercial inclusive serviços, juros e dividendos); a China, sempre.
No governo Lula, o Brasil apresentou taxa maior de crescimento quando teve superávit em conta-corrente; desde que voltou ao déficit, tem crescido menos. Na maioria dos casos, um país em desenvolvimento crescerá mais se apresentar superávit em conta-corrente e, assim, financiar os países ricos.
O modelo da doença holandesa explica essa surpreendente verdade. Para um país neutralizar a doença holandesa ou a maldição dos recursos naturais, precisa deslocar a taxa de câmbio do equilíbrio corrente (que zera sua conta-corrente) para o equilíbrio industrial (que torna competitivas empresas que usam tecnologia no estado da arte mundial). Ao lograr fazê-lo, o país terá superávit em conta-corrente, e os países ricos incorrerão em déficit.
O países em desenvolvimento devem, portanto, tentar crescer com despoupança externa ou superávit em conta-corrente.
Um segundo argumento mostra o que ocorre com o país que tenta crescer com poupança externa. As entradas de capitais necessárias para financiar esse déficit apreciam a taxa de câmbio, aumentam artificialmente salários reais e o consumo, de maneira que mesmo quando se trata de investimentos diretos, aumentam afinal mais o consumo do que o investimento. Em seguida, o país, além de ter de remeter lucros e juros para fora, fica ameaçado de crise de balanço de pagamentos.
Não é surpreendente que os países asiáticos dinâmicos, que ouvem muito menos que nós os economistas ortodoxos do Norte, tratem de administrar sua taxa de câmbio e não incorrer em déficit mas em superávit em conta-corrente. Se o Brasil apresentasse também um superávit, cresceria muito mais e com muito mais segurança do que hoje.
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