"Vou dar-lhe a cor dos seus olhos", disse o artista gráfico paraguaio Andrés Guevara ao apresentar a Samuel Wainer o logotipo azul, imitando letras manuscritas, da Última Hora. Era apenas uma das muitas inovações do jornal fundado em 1951 para defender Getúlio Vargas, adotando uma linha editorial popular, trabalhista e nacionalista. A maior delas talvez fosse pagar bem aos contratados --"salários ao menos três vezes superiores aos praticados pelos outros jornais", conta Karla Monteiro na recém-lançada biografia de Wainer.
Otto Lara Resende pôde enfim trabalhar em um único lugar. Francisco de Assis Barbosa ganhava "dinheiro para burro": 15 contos. O redator-chefe era Otávio Malta; o chefe de reportagem, Paulo Silveira, irmão de Joel Silveira, que não veio porque brigara com o patrão. Na arte, além de Guevara, Nássara e Augusto Rodrigues nas caricaturas.
Nelson Rodrigues chegou para a página policial. Mais tarde, publicaria na Última Hora os contos de "A Vida Como Ela É" e o folhetim "Asfalto Selvagem". Vinicius de Moraes escrevia sobre cinema, e Marques Rebelo, sobre teatro. Edmar Morel era pau para toda obra. Até o poeta João Cabral batucou nas pretinhas do diário cuja primeira sede funcionava ao lado da Central do Brasil.
Moacir Werneck de Castro ficou até o fim. Antes de o jornal ser vendido, em 1971, passaram por lá Paulo Francis (inflamado defensor de Leonel Brizola!), Maneco Muller, Antonio Maria, Sérgio Porto, Adalgisa Nery, Amado Ribeiro, Jaguar, Lan, Redi, Tarso de Castro, Nelson Motta, Luiz Carlos Maciel, Daniel Más, José Carlos Rego, Marisa Raja Gabaglia, Maria Lúcia Rangel e, fugindo de Salazar, o romancista português José Cardoso Pires.
Esse timaço mostra que, para Samuel Wainer, o conceito de um veículo popular era bastante elástico. Hoje a UH seria considerada uma publicação de elite. Mudou o jornalismo ou mudaram os leitores?
Texto de Álvaro Costa e Silva, na Folha de São Paulo.
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