segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Mães deportadas da Argélia abandonam filhos com medo da travessia pelo Saara


Mães deportadas da Argélia abandonam filhos com medo da travessia pelo Saara

Ignacio Cembrero

"Fomos transportados como cordeiros; 500 pessoas amontoadas durante horas em cada caminhão!" Laure Kottin Mbibo, 27 anos, natural de Camarões, levanta primeiro o tom para expressar sua indignação, mas depois sua voz se quebra quando lembra de Brunette, sua filha de 5 meses que abandonou, talvez para sempre, em 24 de novembro passado em Orã (Argélia). "Gostaria de apertá-la em meus braços, cobri-la de beijos", afirma entre soluços. "Tive de abandoná-la para salvá-la."

Laure fala pelo telefone celular, de um centro de retenção de imigrantes irregulares em Tamanrasset, a quase 1.600 quilômetros ao sul de Orã, em pleno Saara argelino. Ela conta que está lá com outras 140 pessoas, 14 delas mulheres, à espera de ser expulsa para o Mali. "Dentro de alguns dias nos deixarão atirados do outro lado da fronteira, no deserto", prevê. A areia do deserto, a 2.300 quilômetros de Orã, em vez das costas da Espanha a apenas 200 quilômetros de onde estavam.

Terminará assim sua expulsão da Argélia, e a de outras três mulheres camaronesas, que se reveste de tons dramáticos porque todas foram obrigadas a se desfazer de seus cinco bebês em Orã e entregá-los a parentes ou a outros subsaarianos que nem sequer são próximos. Sua história foi reconstituída e narrada em um relatório por Fouad Hassam e Mechri Salim, dois voluntários do sindicato autônomo do funcionalismo público (Snapap), uma central tolerada pelas autoridades de Argel. A denúncia do Snapap e da Liga Argelina de Direitos Humanos, reproduzida pelos principais jornais, não foi desmentida pelo Ministério do Interior da Argélia.

Em 12 de novembro, a polícia irrompeu na maternidade do hospital universitário de Orã para deter Michelle Gono, que na véspera havia dado à luz uma menina, Jouana. Mãe e filha permaneceram cinco dias em um calabouço antes de comparecer diante do juiz que a condenou a seis meses de prisão - pena que não exige o ingresso na prisão - por permanência ilegal, e à expulsão. Logo depois o juiz impôs a mesma pena a Aminattou Diolo, outra camaronesa que tinha ido ao mesmo hospital com seu bebê de 5 meses porque tinha dificuldades respiratórias. Não chegou a ver um médico. Foi detida e acabou com o menino em um porão da delegacia central de Orã.

Em 13 de novembro, outras três mulheres de Camarões, Yalande Christelle Yango, Sarah Koumassok Barrack e Laure, a que fala por telefone de Tamanrasset, se encontraram à tarde com seus filhos, entre 10 e 5 meses, em um apartamento adjacente à prefeitura em pleno centro de Orã. "Somos católicas e fomos ali para rezar juntas em casa de uma amiga", conta.

A reza não durou muito. Um vizinho as denunciou. "O exército de policiais cercou o edifício e os agentes entraram no apartamento sem mandado judicial", indigna-se o sindicalista Hassam. Todas foram transferidas com seus bebês para a delegacia central e, depois de passar dois dias nas celas, ingressaram com seus filhos na prisão de Gdyel, até que em 20 de novembro compareceram diante do juiz. "Ele demorou 45 segundos para julgar cada uma delas", afirma Hassam. Tiveram um intérprete árabe-francês durante o julgamento, mas não tiveram advogado. O veredicto foi o habitual, mas não voltaram para a penitenciária, e sim para a delegacia.

Nas delegacias de Orã, os detidos não são alimentados, afirma Laure. "Nossos filhos precisavam de leite - e tivemos de suplicar aos funcionários e lhes dar dinheiro para que o comprassem", lembra. Um subsaariano, companheiro sentimental de uma das camaronesas, também se aproximava diariamente pelas dependências policiais para lhes fornecer comida.

Em 24 de novembro, um agente anunciou às camaronesas que começava sua deportação. Mostaganem, a 80 quilômetros de Orã, era a primeira etapa de um longo percurso que passava por Relizane, Tiaret, Laghouat, Ghardaia, In Salah, Tamanrasset e afinal, depois de duas semanas, a fronteira de Mali. Em cada parada subiam novos candidatos a expulsão.

As mães se plantaram em Orã. Gritaram para os policiais que estavam dispostas a se matar para não subir no veículo. "Levar nossos filhos conosco significava sacrificá-los", afirma Laure. "Não teriam suportado tantas penalidades durante o trajeto", acrescenta. "Não é excepcional que algumas crianças pequenas morram depois de uma longa agonia, de fome, frio, e esgotamento ou falta de remédios para tratar qualquer doença", confirma Hassam.

A determinação das mulheres desconcertou os policiais. Chegou o próprio comissário chefe, lembra Laure. "Ele nos propôs um trato: deportariam a nós, mas as crianças ficariam." Elas demoraram, mas acabaram aceitando. Os agentes chamaram por telefone Roger, o subsaariano que levava comida para as mães, que veio à delegacia com dois amigos. Os três levaram quatro bebês. As camaronesas embarcaram rumo a Mostagadem.

Aos quatro bebês entregues a Roger na delegacia, se acrescenta uma quinta menina abandonada, Nawal, de 18 meses, que Michelle Gono deixou em casa de conhecidos quando foi em 12 de novembro dar à luz no hospital universitário. Quatro dos cinco meninos estão com parentes camaroneses, alguns em situação irregular e que também poderiam ser expulsos. O quinto ficou com uma família nigeriana.

Apesar de seu sofrimento, Lara não se arrepende de ter deixado Brunette em Orã. "Aqui passamos muita fome, não sei se ela teria resistido", afirma, em Tamanrasset. "Para comer nos dão a cada um, por dia, duas barras de pão e um litro de leite para dividir entre cinco pessoas", acrescenta. "Não temos cobertores nem colchões para dormir. Deitamos sobre papelões e nos abrigamos com papelões." Poucos dias depois dessa conversa, as mulheres chegaram a Mali, segundo informou na sexta-feira a Liga Argelina de Direitos Humanos.

"A fome é uma das principais características da experiência que vivem os expulsos" da Argélia, escreve Clara Lecadet, do Centro de Estudos Africanos de Paris, em um longo estudo intitulado "Itinerários da Fome". Em Ghardaia, uma cidade do sul da Argélia, Laure adoeceu e perdeu a consciência. "Receitaram-me remédios que tive de pagar", lamentava. "Seguirei. Tomara que chegue viva a Douala" - sua cidade natal em Camarões.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves



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