A justiça determinou: Porto Alegre vai continuar homenageando o ditador Castelo Branco.
Só em Porto Alegre mesmo não se pode trocar tirar nome de ditador de rua.
A Espanha vai exumar até o final deste ano o cadáver do ditador Francisco Franco.
O tirano foi enterrado num monumento nacional, o Vale dos Caídos.
O tirano foi enterrado num monumento nacional, o Vale dos Caídos.
O mesmo deverá acontecer com os restos mortais de José António Primo de Rivera, fundador da Falange Espanhola e inspirador do franquismo, que também encontrou abrigo no altar-mor da catedral construída para receber os mortos “por Deus e pela Espanha”. Vai ganhar sepultura lateral.
País sério faz isso.
Desmonta homenagens a quem foi mau exemplo.
Só em Porto Alegre mesmo é que não se pode tirar nome de ditador de uma rua.
Franco atolou a Espanha no obscurantismo por quase 40 anos. As suas “viúvas” ainda choram por ele. Acabou tolerado por democracias, com os Estados Unidos à frente, por seu anticomunismo carola. Nunca uma cultura foi tão pragmática quanto a americana. Por dinheiro, a maior democracia mundial sempre tolerou ditaduras regionais. As marcas do tempo de Franco cabem em poucos termos: fascismo, autoritarismo, repressão e preconceito.
A Espanha franquista foi um paraíso para a exploração modernista: praticamente não havia legislação trabalhista. Muito menos espaço para contestação. Homem de bem era homem calado. Direitos humanos e liberdade de imprensa não rimavam com o franquismo.
Hitler e Franco tinham, além do pendor totalitário indisfarçável, mais um ponto em comum: um só testículo. O que isso significa para a história da humanidade? Em princípio, nada. Ou poderá existir alguma teoria política capaz de explicar a ditadura por um ovo? O leitor desculpará a vulgaridade da expressão como parte de uma hipótese exigindo clareza na terminologia para evitar mal-entendidos.
Não se faz um ditador sem culto à sua personalidade e sem paixões que custem caro. O Real Madrid cresceu à sombra de Franco: ganhou estádio, ajuda para contratar estrelas e arbitragens camaradas. Se a família do generalíssimo não quiser receber os seus restos, sugiro que seja enterrado no Santiago Bernabeu. Uma piada ainda contada revela o medo que as pessoas tinham de Francisco Franco.
– Franco morreu?
– Tem certeza?
– Absoluta.
– Mas quem vai ter coragem de dizer isso a ele?
Francisco Franco era tão simpático que Hitler, ele mesmo, o louco que enfeitiçou a Alemanha, afirmava que encontrar o espanhol era um pouco menos divertido do que perder quatro dentes ao tomar um soco. Os franquistas, porém, só viam qualidades no militar que os conduzia com braço firme e mente estreita: por trás da repressão brutal, viam paz, ordem e harmonia; por trás da censura, viam civismo, respeito e bom comportamento; por trás da desigualdade social imensa, viam os méritos dos vencedores; por trás da paz dos cemitérios, comemoravam a inexistência de baderna e de vagabundagem. Achavam-se no paraíso.
Tirar Franco do Vale dos Caídos é acertar contas com a história.
A extrema-direita espanhola está usando o argumento padrão: não se pode apagar o passado.
Infelizmente não. Mas dá para apagar homenagens indevidas. A Espanha podia aproveitar para liquidar sua patética monarquia, cuja restauração não deixa de ser herança do franquismo.
Porto Alegre vai pagar mico por mais algum tempo.
Entre a Legalidade e a ditadura, ficou com a última.
Eu ficaria com Avenida Elis Regina.
Só em Porto Alegre mesmo não se pode tirar ditador de nome de rua.
Juremir Machado da Silva em seu blog no Correio do Povo.
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