Escrevo roteiros para pagar as contas, o que significa que preciso ter todas as respostas. Seja na manga, na ponta da língua, mas, de preferência, no papel. Qual o objetivo da sua protagonista? Por que não consegue atingi-lo? O que precisa aprender? Como sua jornada começa e como termina?
Qual é a força e qual é fraqueza de uma personagem, por exemplo, são duas perguntas que exigem a mesma resposta. Se ela for ambiciosa, é isso que vai catapultá-la para a glória e arrastá-la para a lama. Mas a grande ironia é que aprender os macetes de roteiro não tornou minha vida mais fácil.
Ninguém foi capaz de narrar melhor esse drama do que a escritora polonesa Wislawa Szymborska em seu poema "A Vida na Hora". Ela compara a vida a uma peça de teatro e lamenta o fato de não tê-la ensaiado, de se sentir "despreparada para a honra de viver". "Se eu pudesse ao menos praticar uma quarta-feira antes/ ou ao menos repetir uma quinta-feira outra vez!/ Mas já se avizinha a sexta com um roteiro que não conheço."
No papel, na tela, no palco, os rebotes do destino que pegam o personagem de calças arriadas são uma delícia. Na vida, na hora, são uma tortura. Se, na ficção, aprendi a evitar as soluções fáceis, que chamamos de "Deus Ex Machina", na realidade, tudo que eu mais queria era que a saída para meus problemas se apresentasse em uma bandeja de prata.
Dar vida a uma personagem não significa que sou a mãe dela. Meu papel não é protegê-la de desafios e reveses, pelo contrário, preciso levá-la ao limite, ou o público vai mudar de canal e/ou se distrair com vídeos de dancinhas no celular. Mas quando me deparo com um obstáculo, ao vivo e a cores, só consigo lembrar de uma frase que li no Twitter: "Pode até servir de aprendizado, mas preferia ter continuado burra".
Um manual de roteiro me ensinou que, ao ser questionada sobre os rumos da minha história, a única resposta proibida é "eu não sei". Mesmo se for o caso, preciso fingir que tenho tudo sob controle. São ensinamentos como esse que a protagonista da minha própria vida, a roteirista que vos escreve, precisa desaprender. E admitir, por mais desafiador que seja, que nunca terá todas as respostas.
Texto de Manuela Cantuária, na Folha de São Paulo.
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