A nigeriana Chimamanda Adichie, uma das principais escritoras da atualidade, falou para 3.000 pessoas no Rio outro dia, durante um evento literário no Maracanãzinho. Imagino que grande parte da plateia a admire por seus romances, como "Hibisco Roxo" e "Americanah!". Outra parte pode tê-la descoberto quando trechos de seus discursos em órgãos internacionais sobre feminismo e racismo foram citados pela estrela Beyoncé numa canção que escalou as paradas. Antes disso Chimamanda já era admirada, inclusive no Brasil, onde é traduzida por Julia Romeu. Mas o endosso de Beyoncé pode lhe ter dado um público que a literatura não costuma atingir. Se isso faz com que mais gente ouça a sua voz, melhor ainda.
O endosso de um artista por outro mais famoso nunca é demais. Verlaine lançou Rimbaud, Jean Cocteau lançou Raymond Radiguet, Sartre lançou Jean Genet. Gertrude Stein lançou Hemingway, que, em troca, debochou dela, 40 anos depois, em "Paris É uma Festa". Mistinguett lançou Maurice Chevalier, Edith Piaf lançou Yves Montand. Carmen Miranda lançou Dorival Caymmi. E Bing Crosby avalizou Frank Sinatra: "Frank é um desses cantores que só surgem uma vez na vida. Mas tinha de ser na minha vida?".
Às vezes, o endosso pode ser involuntário. Em 1919, Ruy Barbosa viu no Jeca Tatu ridicularizado por Monteiro Lobato em "Urupês" uma vítima das oligarquias e, como disse isso num discurso de campanha presidencial, a venda do livro disparou. "Não ficou um", vibrou Lobato.
Em 1960, James Bond era só um detetive de ficção como muitos, nem de longe popular como Mike Hammer ou Ellery Queen. Mas John Kennedy, eleito presidente dos EUA e indagado sobre o que gostava de ler, surpreendeu: "Os romances de Ian Fleming com o agente 007". Ninguém sabia quem era. Foram ver e deu no que deu.
Talvez eles não precisassem de padrinhos. Mas nenhum o dispensou.
Texto de Ruy Castro, na Folha de São Paulo.
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