O ano é 2020. O sexo só é permitido se for dentro da bolha. Pessoas com discordâncias políticas não trocam nem ideias, nem fluidos.
Aplicativos como PTinder, PSOLitários, Bolsolteiros e PSLindos são as principais opções de cardápio
humano para adultos.
humano para adultos.
A orientação política à esquerda ou à direita funciona como uma versão repaginada das famílias rivais Capuleto e Montecchio. Aqueles que ousassem furar a bolha corriam o risco de serem perseguidos por seus amigos, familiares e colegas de trabalho.
Foi o caso de um youtuber de direita que achou uma boa ideia participar, infiltrado, de uma manifestação contra o governo, denunciando para seus seguidores os surubas, cirandas e pajelanças que rolam “do outro lado”.
Vestindo uma camisa vermelha desenterrada do fundo do armário, ele se embrenha na multidão com sua câmera.
E descobre que as mulheres de esquerda não têm dreadlocks no buço ou pintam seus cartazes com
sangue de menstruação, como ele imaginava.
sangue de menstruação, como ele imaginava.
Logo chega a polícia com bombas de efeito moral, balas de borracha, gás de pimenta. Apavorado, ele arranca sua camiseta, revelando, por baixo dela, o escudo da CBF, e corre na direção dos policiais em busca de proteção. É recebido com um caloroso golpe de cassetete. Vê (13) estrelas e desperta minutos depois, com a visão de um anjo.
O anjo, no caso, é uma agitadora cultural que nos momentos de lazer gosta de acampar (em Curitiba) e ainda morre de saudades do seu ex (presidente Lula).
Como a maioria das pessoas, ela também tem um fetiche estranho: a ideia de transar com um bolsonarista já não parece tão ruim, pelo simples fato de ser proibido.
O casal passa a se encontrar às escondidas. Ele, mais conservador, já pensava em ter filhos —o que ela jamais toparia, certa de que as crianças se tornariam ciristas.
Sugeriu que ambos deletassem seus aplicativos de pegação, o que hoje equivale à oficialização de um
namoro, mas ela também não acreditava em relações monogâmicas.
namoro, mas ela também não acreditava em relações monogâmicas.
Os dois poderiam ter vivido uma comédia romântica ou uma tragédia shakespeariana, mas só concordavam em um único ponto: o tesão é o maior inimigo do senso crítico.
Texto de Manuela Cantuária, na Folha de São Paulo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário