O combate à desigualdade se tornou o grande assunto das democracias. Não discordo da pertinência nem da urgência, mas devo confessar que fico ligeiramente decepcionado com o fato de pouco se discutir qual é o princípio distributivo que deveríamos adotar para perseguir esse objetivo. A filosofia, afinal, oferece um amplo cardápio de opções.
A mais intuitiva delas é o igualitarismo, que considera moralmente reprováveis situações que resultem em benefício muito maior para um grupo do que para outro. Por esse critério, se A ganha R$ 100 mil, e B, apenas R$ 1.000, é meritório um sistema de taxação que onere proporcionalmente mais A para transferir rendimentos para B.
É claro que as coisas nunca são tão simples. Há um grupo de filósofos como Harry Frankfurt que sustenta que não é a desigualdade, mas a pobreza, que constitui um problema moral. Com efeito, se A tem patrimônio de R$ 3 bilhões, e B, um de "apenas" R$ 1 bilhão, não é obviamente necessário tomar nenhuma ação para reduzir essa desigualdade.
Quem segue essa linha de raciocínio tende a abraçar ou o suficientarismo ou o prioritarismo (sei que os neologismos são horríveis, mas são os nomes que existem). Pelo primeiro, as ações distributivas devem ter o objetivo de assegurar que todos obtenham o suficiente para levar uma boa vida (leia-se "eliminar a pobreza"). Diferenças de rendimento para quem estiver acima do patamar arbitrado são moralmente irrelevantes.
Já no prioritarismo, ajuda-se antes quem está em pior situação. Ao contrário do que ocorre no suficientarismo, a tarefa nunca acaba, já que não há uma linha de chegada, mas, ao contrário do igualitarismo, esse princípio não nos força a eliminar toda e qualquer diferença.
Não pretendo resolver em 56 linhas um dos principais problemas que o mundo enfrenta hoje, mas estou convicto de que uma discussão mais técnica seria enriquecedora.
Texto de Helio Schwartsman, na Folha de São Paulo.
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