domingo, 31 de agosto de 2014

Um em dois

O catatau dado como programa de governo de Marina Silva e do PSB, mas que contraria tudo o que PSB defendeu até hoje, leva a uma originalidade mais do que eleitoral: na disputa pela Presidência, ou há duas Marinas Silvas ou há dois Aécios Neves. As propostas definidoras dos respectivos governos não têm diferença, dando aos dois uma só identidade. O que exigiu dos dois candidatos iguais movimentos: contra as posições refletidas nas críticas anteriores de Marina e contra a representação do avô Tancredo Neves invocada por Aécio.
Ao justificar sua proposta para a Petrobras, assunto da moda, diz Marina: "Temos que sair da Idade do Petróleo. Não é por faltar petróleo, é porque já estamos encontrando outras fontes de energia". Por isso, o programa de Marina informa que, se eleita, ela fará reduzir a exploração de petróleo do pré-sal.
Reduzir o pré-sal e atingir a Petrobras no coração são a mesma coisa. Sustar o retorno do investimento astronômico feito no pré-sal já seria destrutivo. Há mais, porém. Concessões e contratos impedem a interferência na produção das empresas estrangeiras no pré-sal. Logo, a tal redução recairia toda na Petrobras, com efeito devastador sobre ela e em benefício para as estrangeiras.
Marina Silva demonstra ignorar o que é a Idade do Petróleo, que lhe parece restringir-se à energia. Hoje o petróleo está, e estará cada vez mais, por muito tempo, na liderança das matérias-primas mais usadas no mundo. Os seus derivados estão na indústria dos plásticos que nos inundam a vida, na produção química que vai das tintas aos alimentos (pelos fertilizantes), na indústria farmacêutica e na de cosméticos, na pavimentação, nos tecidos, enfim, parte do homem atual é de petróleo. Apesar de Marina da Silva. Cuja proposta para o petróleo significaria, em última instância, a carência e importação do que o Brasil possui.
A Petrobras é o tema predileto de Aécio Neves nos últimos meses. Não em ataque a possíveis atos e autores de corrupção na empresa, mas à empresa, sem diferenciação. Que seja por distraída simplificação, vá lá. Mas, além do que está implícito na candidatura pelo PSDB, Aécio Neves tem como ideólogo, já anunciado para principal figura do eventual ministerial, Armínio Fraga -- consagrado como especialista em aplicações financeiras, privatista absoluto e presidente do Banco Central no governo Fernando Henrique, ou seja, quando da pretensão de privatizar a Petrobras.
A propósito, no debate pela TV Bandeirantes, Dilma Rousseff citou a tentativa de mudança do nome Petrobras para Petrobrax, no governo Fernando Henrique, e atribuiu-a à conveniência de pronúncia no exterior. Assim foi, de fato, a ridícula explicação dada por Philipe Reichstuhl, então presidente da empresa. Mas quem pronuncia o S até no nome do país, com States, não teme o S de Petrobras. A mudança era uma providência preparatória. Destinava-se a retirar antes de tudo, por seu potencial gerador de reações à desnacionalização, a carga sentimental ou cívica assinalada no sufixo "bras".
Ainda a propósito de Petrobras, e oportuno também pelo agosto de Getúlio, no vol. "Agosto - 1954" da trilogia "A Era Vargas", em edição agora enriquecida pelo jornalista José Augusto Ribeiro, está um episódio tão singelo quanto sugestivo. Incomodado com o uso feroz da TV Tupi por Carlos Lacerda, o general Mozart Dornelles, da Casa Civil da Presidência, foi conversar a respeito com Assis Chateaubriand, dono da emissora. Resposta ouvida pelo general (pai do hoje senador e candidato a vice no Rio, Francisco Dornelles): se Getúlio desistisse da Petrobras, em criação na época, o uso das tevês passaria de Lacerda para quem o presidente indicasse. De lá para cá, os diálogos em torno da Petrobras mudaram; sua finalidade, nem tanto.
De volta aos projetos de governo, Marina e Aécio desejam uma posição brasileira que, por si só, expressa toda uma política exterior. Pretendem o esvaziamento do empenho na consolidação do Mercosul, passando à prática de acordos bilaterais. Como os Estados Unidos há anos pressionam para que seja a política geral da América do Sul e, em especial, a do Brasil.
Em política interna, tudo se define, igualmente para ambos, em dois segmentos que condicionam toda a administração federal e seus efeitos na sociedade. Um, é o Banco Central dito independente; outro, é a prioridade absoluta à inflação mínima (com essa intenção, mas sem o êxito desejado, Armínio Fraga chegou a elevar os juros a 45% em 1999) e contenção de gastos para obter o chamado superavit primário elevado. É prioridade já conhecida no Brasil.
Pelo visto, Marina e Aécio disputam para ver quem dos dois, se eleito, fará o que o derrotado deseja.


Reprodução da coluna de Jânio de Freitas, na Folha de São Paulo

Broch faz defesa apaixonada de humanismo em coletânea


CRÍTICA - ENSAIO

Broch faz defesa apaixonada de humanismo em coletânea

Austríaco autor de 'A Morte de Virgílio' debate decadência cultural do séc. 20
UM DOS MAIORES ESCRITORES DE EXPRESSÃO ALEMÃ, BROCH SE DESTACA BRILHANTEMENTE COMO ENSAÍSTA

EVANDO NASCIMENTOESPECIAL PARA A FOLHA

A publicação de "Espírito e Espírito de Época", de Hermann Broch, em excelente tradução de Marcelo Backes, deve ser saudada como um importante lançamento. Um dos maiores escritores de expressão alemã, o austríaco Broch se destaca também brilhantemente como ensaísta.
Deve-se, todavia, ter o cuidado de não reduzir as interpretações da ficção de um autor às declarações que este faz em outros tipos de texto. Isso porque uma obra romanesca tão densa quanto a de Broch não se sustenta em teses, ao contrário de seus ensaios, que debatem objetivamente o chamado Zeitgeist, traduzido em geral por "Espírito de época".
Nos seis ensaios que enfeixam a coletânea, em particular no que dá título ao livro, o autor de "A Morte de Virgílio" faz defesa apaixonada da tradição humanista ocidental.
Judeu convertido ao cristianismo, Broch crê que a história humana é feita de ascensões e declínios, e que desde o século 19 até o momento em que escreve, na primeira metade do século 20, ocorre o triunfo do positivismo e a decadência da cultura.
Esse traçado algo linear deve bastante ao pensamento de Hegel. O filósofo alemão foi o grande metafísico a levar às últimas consequências uma teoria do Espírito (Geist, também traduzível por mente), tendo, entre outros parâmetros, a religião cristã. Quase simultaneamente à fundamentação da dialética hegeliana, Augusto Comte e discípulos teriam lançado as bases do racionalismo científico, que viria a corroer a unidade espiritual do mundo.
Na pena de Broch, "Espírito de época" representa, em princípio, a totalidade significativa que preside uma época e que muitas vezes escapa aos contemporâneos.
Mas "Espírito de Época" é também a Época do Espírito, como expressão máxima de uma totalidade, de que só o misticismo pode dar conta. Assim, a aposta que se faz é no sentido de, após o declínio, ocorrer uma ressurreição filosófica e teológica, como resgate da unidade primeira.
No século 21, a potência e os limites desse idealismo filosófico já foram bem demarcados, sobretudo na trilha dos questionamentos de Nietzsche, que nos retiraram em definitivo do solo teológico. Reinventaram-se, assim, outras possibilidades do humano, não derivadas do que Broch nomeia como "Espírito europeu".
E é mesmo como expressão de certo espírito de época europeu, com algumas consequências devastadoras para o resto da humanidade, que esses ensaios merecem ser lidos e amplamente discutidos.

Ferida aberta


MINHA HISTÓRIA - JU QINGDONG, 84

Ferida aberta

Preso e torturado no Rio depois do golpe de 1964, jornalista chinês ainda espera pedido de desculpas do governo brasileiro
RESUMO Na madrugada de 3 de abril de 1964, três dias após o golpe militar, nove chineses foram presos no Rio, suspeitos de tramar uma revolução comunista no país. Sofreram torturas e foram condenados a dez anos de prisão, da qual cumpriram um, antes de serem expulsos do Brasil. O jornalista Ju Qingdong, 84, é uma das cinco vítimas ainda vivas. Ele continua à espera de um pedido de desculpas do governo brasileiro. O episódio é tema do livro recém-lançado "O Caso dos Nove Chineses", de Ciça Guedes e Murilo Fiuza de Melo

(...) Depoimento a
MARCELO NINIODE PEQUIM

Chegamos ao Rio de Janeiro em 29 de dezembro de 1961. Era véspera de Réveillon e, em seguida, veio o Carnaval. Nesse clima de festa, nossa adaptação foi muito fácil. Na época, os chineses não sabiam quase nada sobre o Brasil.
O país vivia um momento de debates e movimentos populares. Mas, para nós, o principal era reportar sobre assuntos econômicos, culturais e sociais. Sendo estrangeiros e jornalistas, não nos metemos [em política].
Às vezes sentíamos que estávamos sendo vigiados, mas nunca foi evidente.
Tudo o que fazíamos era conforme a lei. Por isso, não saímos do Brasil quando ocorreu o golpe. Tomávamos muito cuidado, nunca tivemos contatos com qualquer partido. Tudo mudou no dia 3 de abril [de 1964].
Até bem tarde da noite do dia 2, eu ainda estava enviando notícias. Às 22h, a polícia bateu na porta. Como era noite, não quisemos abrir. Se nos levassem presos de madrugada, sem ninguém saber, como iríamos nos defender?
Por isso, dissemos a eles que voltassem de manhã. Mas os policiais não quiseram esperar muito. Mal o dia clareou e eles voltaram e arrombaram a porta. Eram umas 4 ou 5 da manhã. O prédio inteiro assistiu, mas nenhum vizinho intercedeu.
Os policiais começaram a nos bater assim que entraram. Eu fui amarrado com os braços para trás e forçado a ir com eles em todos os cômodos para revistar o apartamento. Não havia diálogo, apenas ameaças. Diziam que iríamos ser fuzilados.
Nos revistaram e tiraram até o dinheiro que tínhamos no bolso. Na prisão, tiraram nossas roupas e todos nós fomos torturados. Policiais com sapatos de couro pisaram na minha barriga, causando uma evacuação involuntária. Me queimaram com cigarros. Já na segunda noite, começamos a fazer greve de fome.
Não conseguiram encontrar nada que pudesse nos incriminar, então disseram que os remédios chineses para gripe e as agulhas de acupuntura que encontraram no apartamento seriam usados para assassinatos por envenenamento. Confiscaram o nosso dinheiro como prova de acusação. Este dinheiro [R$ 865 mil em valores atuais] está até hoje retido no Brasil.
Fabricaram provas falsas. Até maio de 1964, não apareceu ninguém para ajudar.
Um dia estávamos no pátio, quando chegou Sobral Pinto, o "velho advogado" [forma respeitosa usada pelos chineses], junto de um coronel. Vestia terno preto e tinha um guarda-chuva na mão.
Veio até nós e se apresentou: "Sobral Pinto, advogado. Sou católico; vocês, comunistas. Mesmo que não seja a mesma ideologia, estou aqui para prestar-lhes serviço de advogado. Li tudo que foi publicado sobre o caso de vocês, o que está acontecendo é uma palhaçada. Quero defendê-los sem cobrar nada".
Depois disso, ele passou a nos visitar duas ou três vezes por semana. Ele já tinha 72 anos. Era excelente pessoa.
Houve sete audiências no tribunal. Cada um de nós recebeu sentença de dez anos de prisão. Ficamos muito indignados. Nada foi provado.
Recebemos amplo apoio internacional. Já estava bem claro que era perseguição política. A imprensa brasileira também nos apoiava. O Brasil ficou numa situação desconfortável no cenário internacional.
Com a pressão internacional, logo que foi dada a sentença, o presidente concedeu a expulsão. Era mais fácil expulsar, em vez de os nove cumprirem a pena no Brasil.
Ficamos 380 dias presos no Brasil. Enquanto isso, na China o caso saía diariamente nas primeiras páginas dos jornais. Das grandes cidades às áreas rurais, inclusive nas mais montanhosas, todos sabiam. Até hoje, quem tem 60 anos ou mais na China lembra desse caso.
Fico feliz em ver que, hoje, o relacionamento entre nossos governos é muito diferente. Nosso futuro é muito bom. Mas a história e os fatos não mudam. Deveríamos resolver esse assunto corretamente. Do contrário, no fundo do coração, restará sempre um incômodo, um nó.
Em 1997, quando visitava minha filha no Chile, pedi um visto de turista para o Brasil, mas não fui atendido. Não posso confirmar a razão, mas vejo que o Brasil não tem coragem de dar o passo adiante.
Cinco de nós estão vivos. É claro que vivemos bem. Mas olhando para o passado, a ferida ainda existe, e é sempre lembrada. Gostaria que isso fosse resolvido, mas não vejo nada acontecer.
Há algum tempo, li num jornal chinês uma pequena notícia de que o governo brasileiro estabeleceu a comissão da verdade. Eu sei que milhares de brasileiros sofreram com isso. Espero que, no nosso caso, a sentença e a expulsão sejam anuladas e também o dinheiro seja devolvido. Ele é a falsa prova do nosso "crime", nem que seja um dólar, ele tem valor político.
Em 1974, quando foram estabelecidas as relações diplomáticas entre nossos países, o governo brasileiro disse que [nossa prisão] foi um erro político. Afirmou que iria resolver esse assunto o mais rápido possível, anular a sentença, a expulsão e devolver o dinheiro. Mas, até agora, nada.

Rumo ao desconhecido


Com a ascensão rápida de Marina Silva, confirmada pelo Datafolha e captada pelas pesquisas desta semana, teremos dois meses de alta indeterminação pela frente. As incógnitas que rondam a candidata, neste momento majoritária no segundo turno, tornarão volátil o cenário político e eleitoral até 26/10. Relação com o agronegócio, programa social, base de apoio para governar, há muito em aberto na candidatura pessebista.
Ao comprometer-se com a independência do Banco Central (BC), Marina traçou o perfil macroeconômico de um possível governo do PSB. Teremos juros altos, recessão bem mais que técnica, corte de gastos públicos e desemprego. Mas como seria possível encaminhar os problemas da população que tem renda familiar mensal (RFM) entre 2 e 5 salários mínimos e mora em grandes centros urbanos, cujo apoio a ex-senadora precisa consolidar para vencer?
De acordo com o Ibope, Marina detém 31% das intenções de votos nesse segmento, encontrando-se empatada tecnicamente com Dilma Rousseff (33%). Como a vantagem de Dilma é nítida entre os mais pobres --sobretudo os que recebem até 1 salário mínimo de RFM (46% contra 23% da candidata ambientalista)--, o fiador da possível eleição de Marina será o eleitor de baixa renda que já superou os problemas da sobrevivência imediata, mas continua às voltas com grandes insatisfações.
A lógica eleitoral indica que Marina vai acentuar promessas, como a realizada no debate da Band (26/8), de destinar 10% da receita da União para a saúde. Ocorre que as referidas propostas são incompatíveis com a orientação sinalizada pela independência do BC. É certo que as campanhas adversárias vão apontar a contradição, ainda que isso cause algum problema de definição para elas próprias.
Outra via de ataque a Marina diz respeito à "nova política". A entrevista para o "Jornal Nacional" (27/8) deu o tom do que vem pela frente. A impossibilidade de explicar, ou condenar, o suposto caixa dois envolvido no avião em que Eduardo Campos viajava, deixou Marina com a resposta típica do que ela chama "velha política": por enquanto nada tenho a declarar e tudo será investigado. Casos do gênero vão pipocar, pois a candidata está, e estará cada vez mais, aliada a políticos tradicionais.
Em que medida o eleitor prestará atenção e perceberá tais incongruências? Concluo, após duas décadas de estudos eleitorais, que, apesar de pouco informado, o cidadão médio capta o "cheiro" do que vem pela frente. O difícil é saber se, na hora H, preferirá correr o risco de decepcionar-se com Marina para tirar o PT do poder, ou se optará pela segurança da situação já conhecida, ainda que não animadora.


Texto de André Singer, na Folha de São Paulo

Marina e o mito do cavaleiro solitário


Todo fim de ciclo político abre espaço para os outsiders da política.
São períodos em que ocorre um aumento da inclusão, da participação popular e os mecanismos políticos tradicionais não mais dão conta da nova demanda. Há o descrédito em relação à política e, no seu rastro, o cavaleiro solitário, cavalgando o discurso moralista e trazendo a esperança  da grande freada de arrumação.
Fazem parte dessa mitologia políticos como Jânio Quadros, Fernando Collor e, agora, Marina Silva.
***
Tornam-se fenômenos populares, o canal por onde desaguará a insatisfação popular com o velho modelo.
No poder, isolam-se por falta de estrutura partidária ou mesmo de quadros em qualidade e quantidade suficiente para dar conta do recado de administrar um país complexo como o Brasil.
Com poucos meses de mandato, a população percebe que não ocorrerá o milagre da transformação política brasileira e se desencantará com o salvador. Sem base política, sem o canal direto com o povo, perdem o comando e trazem a crise política. 
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Desde a redemocratização de 1945 o Brasil tornou-se um país difícil de administrar, dada a complexidade de forças e setores envolvidos. Só é administrável através das composições políticas.
Na última década, a complicação ficou maior porque floresceram uma nova sociedade civil, novas classes de incluídos e o fantasma da hiperinflação (e dos pacotes econômicos) não mais funcionava como agente organizador das expectativas e de desarme das resistências.
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O maior momento de Marina foi quando, na OMC (Organização Mundial de Comércio) defendeu a o direito do Brasil proibir a importação de pneus. No episódio Cessna descobre-se um sócio oculto do ex-governador Eduardo Campos, que enriqueceu com incentivos fiscais (do estado de Pernambuco) justamente para a importação de pneus.
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Não apenas isso.
Sua vida profissional indica uma personalidade teimosa e desagregadora.
Começou a vida política com Chico Mendes. Depois, rompeu com ele e aderiu ao PT. Foi parceira de Jorge Vianna, governador do Acre. Rompeu com Jorge, tornou-se Ministra de Lula.
Teve embates com a então Ministra-Chefe da Casa Civil Dilma Rousseff acerca da exploração da energia na Amazônia. Perdia os embates nas reuniões Ministeriais, mas criava enormes empecilhos no licenciamento ambiental.
Nas reuniões ministeriais, jamais abria mão de posições. Quando derrotada, se auto-vitimizava e, nos bastidores, jogava contra as decisões com as quais não concordava.
Saiu do governo Lula no dia em que anunciou seus planos para a Amazônia e Lula entregou a gestão para Roberto Mangabeira Unger.
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Saiu do governo, entrou no PV e promoveu um racha no partido. Tentou montar a Rede, juntou-se com o PSB e criou conflitos de monta com os principais auxiliares de Campos.
A teimosia em geral estava a serviço de ideias e conceitos totalmente anticientíficos.
Combateu as pesquisas em células tronco. Em 2010, em uma famosa entrevista no Colégio Marista, em Brasilia, anunciou que proibiria ensinar Darwin nas escolas, por ser a favor do criacionismo.
Se o país resolver insistir na aposta no personagem salvador, só há uma coisa a dizer: bem feito!

Reprodução do Blog do Luís Nassif

Médico denuncia privatização dos hospitais gaúchos

Hospital da Restinga – Construído com recursos Federais.
Não vi e não ouvi nenhuma menção ao fato de que o Hospital da Restinga foi construído com uma “doação” de recursos (R$ 65 milhões) feita pelo Ministério da Saúde ao Hospital Moinhos de Vento (a alegação é de que o Hospital Moinhos de Vento é uma entidade filantrópica – não sei em que mundo – nenhum paciente do SUS jamais passou pela porta do HMV – e se passou deve ter sido barrado em seu interior). O Hospital Moinhos de Vento, assim como o Hospital Mãe de Deus, é tão filantrópico como a Santa Casa de Misericórdia que declara para a imprensa que atende 62% de Planos Privados e mais 5 a 10% de privados puros – quando deveria atender 60% pelo SUS. E o terreno, pelo que sei, foi doado pela prefeitura de Porto Alegre ao HMV. Essa é a nossa “Saúde Pública”. Já comentei em outro artigo que 84% dos leitos hospitalares do Rio Grande do Sul são privados. E que o setor privado detêm de 7 a 10 vezes mais equipamentos para exames complementares do que o SUS. Deveriam ser 84% públicos e o restante privado. Nesta conta não estão incluídos os 120 leitos do Hospital de Clínicas que ficam à disposição de quem tem Plano Privado ou pode despender o dinheiro necessário para ser internado de forma privada no H. Clínicas.
O que é uma pouca vergonha.
E aí aparece na imprensa uma história declarando que os leitos do Hospital da Restinga não são utilizados por falta de profissionais médicos!!!!!
Faltam médicos em Porto Alegre? Desde quando?
Porto Alegre tem uma das maiores taxas de médicos por habitante do país.
O que existe é uma vergonhosa política de privatização e subsídio ao setor privado, transformando o “setor público’ em um setor desqualificado e de dificílimo acesso. Filas e mais filas, meses para ser atendido por um especialista e assim vai.
É uma desfaçatez. Em 2013 a arrecadação de impostos pelos governos foi de 1 trilhão e 700 bilhões. Desse total, 1 trilhão fica com o governo Federal. Não daria para disponibilizar os 160 bilhões para a saúde e fazer uma saúde decente para o povo.
Falta de dinheiro não é. É falta de vergonha.
E ainda temos, como também já comentei, um Laboratório de Fabricação de Medicamentos – LAFERG S – que há 15 anos não produz nenhum tipo de medicamento. Também não é falta de recursos financeiros. É uma política deliberada de beneficiar os setores privados que vendem medicamentos.
Espero que nas próximas eleições o povo eleja um governo comprometido com os interesses da população e não de um punhado de setores privados – se é que existe algum candidato com esse perfil. Eu particularmente, penso que não.
Nem no Estado e nem em nível Federal.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Ferguson, Missouri - Detenção de repórteres chama atenção para truculência policial


As prisões de profissionais de imprensa durante a cobertura dos protestos violentos na cidade de Ferguson, nos EUA, deram início a um debate, nas redes sociais, sobre abuso de poder e o despreparo das autoridades policiais diante de manifestações populares. Três jornalistas alemães foram presos na cidade na terça-feira [19/8].
Ansgar Graw, repórter do tabloide alemão Die Welt; Frank Herrmann, jornalista freelancer; e Lukas Hermsmeier, repórter do tabloide alemão Bild Das, foram presos no bairro de St. Louis. Eles pretendiam cobrir os protestos em Ferguson, onde a população se revoltou contra a polícia local em razão do assassinato de Michael Brown, jovem de 18 anos que foi morto à queima-roupa após ser rendido por um policial no dia 9/8.
Graw alegou que sua prisão foi “ridícula” e que retrata a incapacidade da polícia local de lidar com a situação. Ele disse também que o policial que o prendeu se recusou a fornecer seu nome. Graw e Herrmann tiveram seu pertences pessoais confiscados e foram levados a uma delegacia em St. Louis. Pedidos por água foram ignorados, bem com o direito de dar um telefonema. Ambos foram liberados após três horas de detenção, sem receber maiores explicações e sem registro de acusações formais.
Já Hermsmeier chegou a ser ferido pelos policiais. Ele alegou que, quando a polícia começou a disparar gás lacrimogêneo contra os manifestantes, ele e um colega jornalista ergueram os braços e se identificaram como imprensa. Alguns policiais ignoraram e começaram a atirar balas de borracha. Hermsmeier foi atingido por três tiros e preso em seguida.
“Agressão à liberdade de imprensa”
Os incidentes com os jornalistas alemães não são casos isolados. Os repórteres Wesley Lowery, do Washington Post, e Ryan Reilly, do Huffington Post, foram detidos em 13/8quando policiais tentavam evacuar uma lanchonete que eles usavam como base para trabalhar. Já membros de uma equipe da emissora de TV Al Jazeera America foram atingidos por balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo, mesmo após identificação. Um porta-voz da emissora classificou o episódio como “uma agressão flagrante à liberdade de imprensa, voltada para abalar nossa capacidade de cobrir um acontecimento tão importante”.
Apesar da indignação nas redes sociais com o que é visto como abuso de poder, há quem ache que os policiais estão apenas cumprindo sua função. O apresentador de TV Joe Scarborough, anfitrião do programa Morning Joe, da emissora MSNBC, argumentou que os próprios jornalistas são culpados por não obedecerem às instruções da polícia.
Já veículos de comunicação estatais chineses e russos têm se aproveitado da situação para atacar o governo americano. Um editorial do Global Times, jornal de língua inglesa publicado na China, classificou os incidentes em Ferguson como “irônicos”, alegando que os EUA deixam de assimilar as barbáries locais para “apontar o dedo para a China”.
Truculência
Na internet, circulam diversos vídeos mostrando a truculência policial. Em alguns deles, os policiais são ríspidos com manifestantes – apontando armas, fazendo ameaças de morte e usando palavreado chulo –, e em outros chegam a ordenar aos jornalistas que desliguem suas câmeras.
Um policial de Ferguson foi afastado de seu posto por tempo indeterminado após apontar um fuzil semiautomático para um manifestante e ameaçar matá-lo, durante uma manifestação pacífica na noite de terça-feira [19/8]. Brian Schellman, porta-voz da polícia do Condado de St. Louis, disse que o incidente foi lamentável e que não representava os profissionais que “trabalham diariamente em Ferguson para manter a paz”.

Reprodução do Observatório da Imprensa

Como Abílio Diniz é como gestor?


Abílio Diniz deu uma entrevista à Folha que viralizou hoje.
Ele se declarou um “bom gestor”. E afirmou que, nesta condição, jamais conseguiu liderar mais que doze pessoas diretamente.
Ele estava se referindo aos 39 ministérios de Dilma. Não dá, segundo ele, para você comandar eficientemente 39 pessoas sob você, e isto tornaria o país “ingerenciável”.
No geral, apesar desse adjetivo, a entrevista teve um tom positivo e otimista sobre o Brasil. Os investidores estrangeiros cobiçam o mercado brasileiro por suas dimensões e por seu potencial, disse Abílio Diniz.
E qualquer dos três candidatos, em sua avaliação, poderá fazer um bom governo.
Tudo isso dito, queria falar um pouco sobre Abílio Diniz como executivo.
Ele é mesmo um bom gestor, como afirmou?
Em meus anos de jornalismo de negócios na Exame, conheci um bocado de Abílio Diniz.
Sua filha Ana chegou a fazer um estágio num suplemento da revista.
Vi, na minha carreira, poucos gestores tão centralizadores e tão controladores quanto Abílio Diniz.
Ele herdou o Pão de Açúcar de seu pai, Valentim. Levou a melhor na disputa pela sucessão com os irmãos, nenhum dos quais revelou talento expressivo.
Sob Abílio Diniz, o Pão de Açúcar cresceu, sobretudo quando a economia brasileira era fechada.
Quando o mercado brasileiro se abriu à competição estrangeira, as coisas se complicaram. Num determinado momento, o Pão de Açúcar não teve alternativa senão fazer parceria com um sócio estrangeiro.
Não tardou muito e se percebeu que a empresa, por maior que fosse, era pequena para Diniz e o novo sócio.
Depois de sucessivas brigas, o novo sócio, como tinha mais força, conseguiu tirar Diniz do caminho.
Em seus tempos de Pão de Açúcar, Abílio Diniz se notabilizou também por fritar todos os principais executivos que respondiam a ele, um clássico nas empresas familiares.
Ele não queria sombra, e nem contestações. E também exigia que seus comandados fossem réplicas dele.
Diniz tinha – tem — uma fixação obsessiva por esportes. Você não entrava na turma se não compartilhasse dessa paixão.
Isso significa o seguinte para um executivo do Pão de Açúcar: acordar cedíssimo e estar preparado para uma sessão prolongada de exercícios antes de começar o expediente.
Ou você virava um esportista militante e entusiasmado ou o Pão de Açúcar não era para você.
Isso valia para a família, e para os agregados.
Trabalhei, na Abril, ao lado de Luiz Felipe Dávila, genro de Abílio Diniz e fundador da Bravo.
Dávila foi contratado como executivo da Abril quando esta comprou a Bravo, fechada alguns anos depois.
O casamento com uma Diniz fizera de Dávila um Diniz. Fazia esportes alucinadamente. Numa ocasião, ao correr de bicicleta em alta velocidade como se fosse Lance Armstrong, levou um tombo espetacular que o obrigou a se afastar do trabalho por vários dias.
Imagino que, sem Diniz, a prática de esportes entre os executivos do Pão de Açúcar tenha diminuído consideravelmente.
A vaidade se manifestava nas pequenas coisas. Uma vez demos uma capa com ele. Na semana seguinte, ele telefonou. Queria saber se sua capa vendera mais que as demais.
Se é um bom gestor?
Bom, eu não gostaria de trabalhar sob suas ordens, definitivamente.
Mas aceito que muitas pessoas também não gostaram de trabalhar sob as minhas.

Reprodução do Diário do Centro do Mundo

Trabalhar tanto quanto Antônio Ermírio de Moraes faz sentido?

Antônio Ermírio de Moraes tinha uma obsessão pelo trabalho.
Criticava constantemente o que julgava ser o número excessivo de feriados no Brasil.
Trabalhava todos os dias.
Quase no fim da vida, fez uma conta. Todos os finais de semana e feriados que ele trabalhara somavam 14 anos. “Não é uma lamentação, é uma constatação”, avisou.
Dizia que seu sonho era morrer trabalhando, mas isso não foi possível. Uma combinação de doenças – Alzheimer a principal delas – o afastou do escritório alguns anos antes da morte, aos 86.
Valeu a pena trabalhar tanto?
Quantas horas, dias, anos talvez, ele deixou de aproveitar, por exemplo, a companhia dos dois dos nove filhos que perdeu?
Penso na sabedoria ancestral grega, e lembro uma frase de Demócrito. “Ocupe-se de pouco para ser feliz.”
As pessoas mais atormentadas que vi em minha carreira eram exatamente as que mais trabalhavam e menos tinham vida pessoal.
Boa parte delas morreu cedo.
O culto ao trabalho não é exatamente novo. Na Revolução Industrial inglesa, esse culto teve a intenção de legitimar as intermináveis horas que os trabalhadores passavam nas empresas que os empregavam.
Contra isso se insurgiu Paul Lafargue, um esquerdista que só podia ser francês – o povo que melhor estabelece limites ao trabalho. (O francês evita até ter amizades pessoais com gente da empresa para não correr o risco de conversar sobre trabalho fora do escritório.)
Lafargue publicou, em 1880, um clássico do combate à apologia do trabalho, O Direito à Preguiça.
Selecionei dez frases:
1) “Sejamos preguiçosos em tudo, exceto em amar e em beber, exceto em sermos preguiçosos.”
2)”O trabalho é a causa de toda a degenerescência intelectual, de toda a deformação orgânica. Comparem o puro-sangue das cavalariças de Rothschild, servido por uma criadagem de bímanos, com a pesada besta das quintas normandas que lavra a terra, carrega o estrume, que põe no celeiro a colheita dos cereais.”
3) ”Os filósofos da antigüidade ensinavam o desprezo pelo trabalho, essa degradação do homem livre; os poetas cantavam a preguiça, esse presente dos Deuses.”
4) ”Jeová, o deus barbudo e rebarbativo, deu aos seus adoradores o exemplo supremo da preguiça ideal; depois de seis dias de trabalho, repousou para a eternidade.”
5) ”O provérbio espanhol diz: Descansar es salud (Descansar é saúde).”
6) “A nossa época é, dizem, o século do trabalho; de fato, é o século da dor, da miséria e da corrupção.”
7) “Introduzam o trabalho de fábrica, e adeus alegria, saúde, liberdade; adeus a tudo o que fez a vida bela e digna de ser vivida.”
8  )”Que se proclamem os Direitos da Preguiça, milhares de vezes mais nobres e sagrados do que os tísicos Direitos do Homem; que as pessoas se obrigue a trabalhar apenas três horas por dia, a mandriar e a andar no regabofe o resto do dia e da noite”
9) “O  trabalho desenfreado é o mais terrível flagelo que já  atacou a humanidade.”
10) “A paixão cega, perversa e homicida do trabalho transforma a máquina libertadora em instrumento de sujeição dos homens livres: a sua produtividade empobrece-os.”
Lafargue não teria a aprovação de Antônio Ermírio, naturalmente.
E é certo que, como provocador que era, ele pode ter exagerado aqui e ali.
Mas entre suas ideias e as de Antônio Ermírio fico, convictamente, com as dele.
Trabalhar demais – atenção: eu disse demais — é bom apenas para a empresa para a qual você trabalha.
Para você mesmo, é um tormento.

Reprodução do Diário do Centro do Mundo.

A arte da fuga


Há mil momentos em que gostaríamos de fugir --da família, dos amigos, do nosso passado, de nós mesmos: em suma, de tudo.
Especialmente na adolescência, a fuga é um jeito saudável de crescer --fugimos para os devaneios, para outra religião, para drogas, para ideias políticas inéditas na nossa família, para promiscuidades sexuais bizarras ou, ainda, fugimos de casa com uma trouxa nas costas.
É preciso fugir para ter a impressão de sermos "nós mesmos", diferentes do que os pais, a escola e os adultos esperavam que fôssemos. Mas a arte da fuga é complicada e comporta alguns riscos.
Está em cartaz "Um Belo Domingo", de Nicole Garcia. O filme não é uma obra-prima, mas é perfeito para pensar na arte da fuga. Além disso, tenho um carinho especial por Nicole Garcia.
Em 1983, eu estava dando a volta à França para promover um livro ("Hipothèse sur le fantasme", Seuil). Era um livro de psicanálise, para adeptos. Nas cidades que eu visitava, conversava com um pequeno público de psicanalistas e estudantes. Em Grenoble, o encontro era num sábado, na casa da cultura.
Quando cheguei, já havia uma fila impressionante esperando para entrar: o papo foi transferido para o grande anfiteatro. O que tinha acontecido? Na época, semanalmente, "Le Nouvel Observateur" convidava uma celebridade a indicar seu evento preferido para cada dia. Naquela semana, Nicole Garcia, atriz (ela ainda não dirigia), tinha indicado, para aquele sábado, o encontro comigo na casa da cultura de Grenoble. Alguns acharam que eu devia estar secretamente namorando Nicole Garcia, e outros que ela devia estar se analisando comigo.
Por que conto essa história agora? Freud explica: aquela viagem a Grenoble por pouco não foi a ocasião para uma grande fuga (que foi postergada: o ano seguinte foi minha primeira viagem ao Brasil). Agora, se Nicole Garcia tivesse estado lá e tivesse me proposto para fugir com ela...
Curiosidade: esbarrei na página responsável pelas mil pessoas que compareceram naquele dia (http://migre.me/ldhZa).
Nicole Garcia sempre se interessou por psicanálise, e "Um Belo Domingo" é quase um filme didático. Sem spoilers: Baptiste fugiu de seu passado, mas um dia, para ajudar uma amiga, ele precisa voltar para a casa e a família das quais ele fugiu.
1) A recusa do passado da gente pode ser uma revolta (sou contra a família que me criou) ou uma mistura de ficção e esquecimento (eles me quiseram ou não me quiseram etc.) --enfim, tudo para dar sentido à nossa presença no mundo.
Há fugas que são apenas distorções da vida que parecia nos ser destinada, e há fugas nas quais a gente se afasta de nossa história a ponto de se perder. Nessas fugas radicais, à força de querermos ser nós mesmos, podemos acabar não sendo mais nada.
Os exemplos, justamente, vão desde o filho de um advogado californiano que acabou sendo talibã no Afeganistão até os que enlouquecem por ter cancelado sua história sem conseguir inventar ou encontrar outra.
2) As recusas radicais produzem uma espécie de errância. Quase sempre, o que nos prende a um lugar é nosso passado --sem ele, por que parar? Inversamente, prender alguém (interná-lo) se apresenta como um jeito de "convencê-lo" a aceitar seu passado.
3) É fácil imaginar que a recusa radical de nosso passado nos leve a uma grande liberdade de vida, de ação e de pensamento. Não é assim: a recusa radical de nosso passado nos leva à procura incessante (angustiada e, às vezes, delirante) de qualquer coisa que organize o mundo ao redor da gente.
4) As fugas radicais são fracassos da arte da fuga. E não sei se há mesmo casos em que uma fuga radical seja inevitável ou desejável. Há poucas histórias que precisem ser apagadas e que não possam ser transformadas.
Fugi de casa aos 14 ou 15 anos; sumi durante um ano. Ninguém me procurou para me internar. O extraordinário, retroativamente, foi o respeito de minha família por minha fuga. De qualquer forma, eu não desprezava o sentido que minha família e meu passado me reservavam. Fugi por pressa de inventar sentidos novos, porque me parecia que o passado não bastava para justificar minha vida.
Em que medida é justo querer que os filhos sejam "nossos" filhos? E em que medida é possível aguentar que eles, um dia, fujam da gente?


Texto de Contardo Calligaris, na Folha de São Paulo

Regitta Zimermman (1933-2014) - Morreu 2 horas após o marido


REGITTA ZIMERMMAN (1933 - 2014)

Morreu 2 horas após o marido

FABRÍCIO LOBELDE SÃO PAULO

Dona Gitta e seu marido, Floriano, foram internados na última semana em Joinville, em Santa Catarina. Os amigos dizem que o coração de seu Floriano não aguentou ver a saúde de dona Gitta se deteriorando tão rapidamente.
Os médicos conseguiram que o casal ficasse no mesmo quarto do hospital.
Na última segunda-feira (25), às 7h, Floriano morreu, aos 91 anos, em decorrência de uma cardiopatia. Dona Gita morreu duas horas depois. Segundo os médicos, ela havia perdido a consciência na noite anterior.
O casal se conheceu no final da década de 1970, quando Gitta já era viúva de seu primeiro marido.
Com o novo companheiro, Gitta viajou de carro pelo Estado para participar de competições de bolão (uma espécie de boliche), em que ela conquistou alguns troféus.
Amante de música germânica tradicional, Gitta estava sempre com a irmã, Margarida, em festas do gênero.
Com o tempo, as duas passaram a acompanhar um grupo que tocava bandoneon (semelhante ao acordeão).
As irmãs mandaram confeccionar roupas típicas. Margarida vestia-se de colona alemã e Gitta, de colono. As duas viajavam Santa Catarina de festa em festa, onde passavam horas dançando.
Será lembrada como uma pessoa festiva e tranquila. Morreu de complicações de um câncer no estômago, tardiamente diagnosticado, aos 81 anos. Não teve filhos.
Deixa sobrinhos e a irmã Margarida, que se despediu da companheira de danças vestindo o traje típico e ao som de bandoneon.


Reprodução da Folha de São Paulo

Brasil tem mais de 202 milhões de habitantes, aponta IBGE

Brasil tem mais de 202 milhões de habitantes, aponta IBGE

Rio Grande do Sul conta com população de 11,21 milhões de pessoas

O Brasil tem uma população de 202.768.562 habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicados nesta quinta-feira no Diário Oficial da União. O estado mais populoso, São Paulo, tem 44,03 milhões de habitantes. Já no estado menos populoso, Roraima, vivem 496,9 mil pessoas.

Os dados do IBGE são estimativas de população no dia 1º de julho de 2014. Além de São Paulo, cinco estados têm mais de 10 milhões de habitantes: Minas Gerais (20,73 milhões), Rio de Janeiro (16,46 milhões), Bahia (15,13 milhões), Rio Grande do Sul (11,21 milhões) e Paraná (11,08 milhões).

Na lista dos lista de unidades da federação com mais de 5 milhões de pessoas, estão seis estados: Pernambuco (9,28 milhões), Ceará (8,84 milhões), Pará (8,08 milhões), Maranhão (6,85 milhões), Santa Catarina (6,73 milhões) e Goiás (6,52 milhões). Apenas dois estados têm menos de 1 milhão de habitantes, além de Roraima: Amapá (750,9 mil) e Acre (790,1 mil).

As demais unidades federativas têm as seguintes populações: Paraíba (3,94 milhões), Espírito Santo (3,88 milhões), Amazonas (3,87 milhões), Rio Grande do Norte (3,41 milhões), Alagoas (3,32 milhões), Piauí (3,19 milhões), Mato Grosso (3,22 milhões), Distrito Federal (2,85 milhões), Mato Grosso do Sul (2,62 milhões), Sergipe (2,22 milhões), Rondônia (1,75 milhão) e Tocantins (1,5 milhão).


Reprodução do Correio do Povo

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O novo cenário político, com a ascensão de Marina


Algumas considerações sobre o fenômeno Marina Silva.

Fato 1 - Marina cresceu por ela, não por Campos.

Dada a enorme rejeição aos dois favoritos, Dilma Rousseff e Aécio Neves, era previsível um crescimento da chamada terceira via, Eduardo Campos. Cantei essa bola aqui.

Acontece que Marina sempre teve maior presença que Campos e, em todas as pesquisas, muito mais intenções de voto que ele.

Ela disparou por ter se tornado candidata à presidente, não pela comoção em torno da morte de Campos.

Fato 2 - Marina não é um Russomano.

Em toda eleição, em algum momento as ondas da opinião pública contemplam um outsider. Foi assim com Garotinho e Ciro Gomes, para presidente; ou com Celso Russomano para prefeito de São Paulo.

Marina é mais que isso. De um lado por ter plantado em 2010 as sementes do discurso do "novo". Enquanto o cético Serra rezava a Bíblia e clamava pelos céus (especialmente pelo inferno contra o aborto), a evangélica Marina discursava sobre o novo. Hoje, ambos colhem o que plantaram. E apenas o plantio de Marina floresceu.

Mas, em parte também, por ser politicamente um papel em branco. Ao acenar para os "homens de bem" de todos os partidos - e, com suas alianças iniciais, poder quebrar a resistência dos "homens de bens" - cria uma utopia formidável.

O PSB acredita que, através dela, conquistará o poder. É o chamado auto-engano. Os operadores de mercado tem certeza. Pois não convocaram o mais esperto e deletério dos operadores de mercado: André Lara Rezende? Os cansados da polarização PT x PSDB caem de cabeça.

Eleita, pelo que se conhece de sua personalidade, Marina será ela, apenas ela.

Fato 3 - Marina não é um Lula.

O voluntarismo faz com que parte da opinião pública acredite piamente que essa frente de homens de bem tornará o país governável. Como se, após a posse, não houvesse um Congresso que aprova as leis e uma terrível disputa pela ocupação do espaço político, tanto de partidos políticos como do Judiciário, do Ministério Público, dos grupos de mídia, do mercado, de setores sociais, empresariais.

É esse o pepino que o próximo presidente terá que administrar.

A ideia de que, como a opinião pública desconfiava de Lula em 2002, e ele deu certo, logo Marina dará, esbarra em uma questão fundamental: Marina não é Lula; e a Rede não é o PT.

Havia uma estrutura de comando no PT, a aproximação com as forças econômicas, o apoio dos movimentos sociais. E, acima de tudo, a intuição e o carisma de Lula e, no primeiro tempo, dois operadores de peso atuando de forma sincronizada: José Dirceu e Antonio Pallocci.

Mesmo assim, o primeiro governo Lula deu no que deu.

Imagine-se, agora, esse mar de interesses, de egos, de situações complexas sendo administrado por Marina.

Ontem ela foi certeira ao dizer que o papel do presidente é ser o planejador, o que aponta rumos e não o mero gerente. Faltou dizer que é papel do Estadista a administração de conflitos e das forças políticas. E ela não parece ter nenhuma das características que se exige desse presidente estadista.

Fato 4 - o fim do PSDB.

Seja qual for o resultado final das eleições, o PSDB desaparece definitivamente como força hegemônica da oposição. Paga, agora, a mediocrização a que se entregou desde 2006, quando indiciou Geraldo Alckmin como candidato a presidente; e, principalmente, em 2010, com a inacreditável campanha de José Serra. Morreu ao se afastar da academia, abrir mão de qualquer nova ideia ou conceito em nome de um oportunismo míope, e deixar-se conduzir por economistas de mercado, grupos de mídia e pela extrema-direita.

O partido perderá a presidência, a bandeira de maior partido de oposição, o governo de Minas e restará - se não acontecer nenhuma novidade - o controle de São Paulo por aquele que, provavelmente, é o mais despreparado governador da história do Estado.

Cumpre-se a sina de José Sarney que, em 2009, já prognosticava: o DEM acaba, o PSDB será o novo DEM e a nova oposição sairá das entranhas do governo.

Fato 5 - a nova correlação de forças.

Nem de longe Marina será uma líder de massas, uma representante dos desassistidos. Continuará com prestígio enquanto papel em branco. Quando começarem as definições, perderá parte da aura.

No plano social, seu discurso não avança além da ecologia. No plano econômico e fiscal, seus porta-vozes praticarão o liberalismo à la Eduardo Gianetti. Para ele, todos os desequilíbrios sociais, os abusos de preços, de juros, decorrem da falta de educação do povo brasileiro. Sendo assim, nenhuma política pública é eficaz para coibir abusos de mercado.

A esse liberalismo de proveta some-se o liberalismo ecológico de Marina, suas restrições ao crescimento, à ampliação das  hidrelétricas, ao próprio agronegócio.

Na oposição, Marina exerce um papel único, de grilo falante dos abusos ecológicos e do centralismo administrativo. No governo, poderá ser enorme fator de risco.

Sua eleição colocará em risco o estoque de políticas sociais existentes. E, com o liberalismo econômico na Fazenda e no Banco Central, não se espere nenhuma estratégia de desenvolvimento amarrada ou não a políticas sociais.

A imagem do bom selvagem é mais forte do que essas complexidades. O grande desafio será Dilma mostrar que a folha em branco poderá acabar com o avanço do estado de bem estar.


Reprodução do Blog do Luís Nassif