O resultado mais significativo da eleição israelense de terça (9) não é a mais que previsível recondução de Binyamin Netanyahu ao posto de primeiro-ministro. É a morte do ainda não nascido Estado Palestino(previsto pela legalidade internacional mas jamais criado).
O atestado de óbito leva a assinatura do Yesha, acrônimo em hebraico para Conselho da Judeia, Samaria (como os judeus chamam a Cisjordânia) e Gaza, territórios que deveriam ser palestinos (só Gaza é, por enquanto).
O Yesha, em seu comunicado sobre a eleição, diz que “o povo expressou sua lealdade à Terra de Israel e escolheu aplicar a soberania de Israel sobre a Judeia, a Samaria e o vale do Jordão”.
Dá para entender essa análise radical: Netanyahu, nos últimos dias da campanha, havia anunciado que, se vencesse, estenderia a soberania israelense aos assentamentos judaicos na Cisjordânia. Logo, se a maioria votou não exatamente por ele, mas pela combinação de partidos de direita e ultra-direita que o apoiam, votou pela anexação pré-anunciada.
Anexar os assentamentos impede formar um Estado palestino minimamente viável.
Até uma liderança palestina relevante, Saeb Erekat, admite e lamenta, ao dizer que, conforme os resultados apurados até a madrugada, “só 18 dos 120 membros eleitos do Parlamento israelense apoiam a solução de dois Estados e nas fronteiras de 1967”, anteriores, portanto, à guerra em que Israel ocupou mais territórios palestinos.
Essa contabilidade mostra que é injusto atribuir apenas a Netanyahu a destruição do sonho palestino. A sociedade israelense foi se movendo paulatina mais firmemente nessa direção. “Bibi”, como é chamado, sentiu essa pulsação e foi avançando sobre os territórios palestinos.
Escreve, por exemplo, David Halbfinger no New York Times desta quarta (10): “A aparente reeleição de Netanyahu como primeiro-ministro atesta a visão conservadora do Estado judeu e de seu povo a respeito de onde estão e para onde caminham”.
Diz muito sobre o conservadorismo o fato de que os partidos religiosos vêm crescendo há anos em peso tanto no Parlamento como nos gabinetes de Netanyahu (o atual e, certamente, o futuro).
Na questão palestina, claro que os religiosos e seu conservadorismo pesam, mas o principal, a meu ver, reside no fato de que a grande maioria dos israelenses desinteressou-se dos palestinos.
Seria necessária uma investigação aprofundada para explicar as razões desse descolamento quase irrestrito. Mas a segurança certamente é um fator determinante.
O muro que Israel construiu (e continua construindo) para separar as terras palestinas ajudou a conter o terrorismo mais impactante, aquele dos homens-bomba que se explodiam em restaurantes, mercados, pontos de ônibus.
Israel instalou-se em uma zona de conforto e não quer mais se preocupar com os palestinos. Quanto pode durar o conforto ninguém sabe. Mas levar a sério a conclamação do Yesha para tomar a Cisjordânia e Gaza, que os religiosos consideram a Terra de Israel, é armar uma bomba de tempo: os palestinos que vivem na Cisjordânia, na Faixa de Gaza e em Israel são 6,5 milhões —exatamente o mesmo número de judeus em Israel.
Dá para condená-los eternamente a ser um povo sem Estado?
Texto de Clovis Rossi, na Folha de São Paulo.
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