sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Morre Paul Veyne, historiador francês especialista em Antiguidade


O historiador e arqueólogo francês Paul Veyne morreu nesta quinta-feira, aos 92 anos, em Vaucluse. A informação foi publicada no site do jornal francês Le Monde. A causa da morte não foi revelada.

Conhecido por sua especialidade em Antiguidade grego-romana, Veyne publicou livros como "Sêneca e o Estoicismo", "Elegia Erótica Romana", "Os Gregos Acreditavam em seus Mitos?" e "Pão e Circo: Sociologia Histórica de um Pluralismo Político".

Veyne publicou também livros relacionados a filosofia. Em "Foucault - Seu Pensamento, Sua Pessoa", por exemplo, o historiador se debruça sobre o pensamento de Michel Foucault, filósofo que o citava para rebater a ideia do cristianismo como marco da repressão sexual.

Veyne dizia que a história é a história das práticas e das crenças. Ele repudiava qualquer ideia de racionalidade da história, de ser movida por fatores profundos como progresso ou luta de classes. Para ele, "não se pode tirar nenhuma lição da história", como contou à Folha, em 2009.

Nascido em 1930, em Aix-en-Provence, Veyne começou a se interessar pelo Império Romano aos oito anos de idade, ao ver uma ânfora em um sítio celta.

Além de historiador, arqueólogo e escritor, Veyne foi também professor na Escola Francesa de Roma e Universidade Sorbonne. Em 1975, se tornou titular da cadeira de história romana do Colégio da França, cargo que ocupou até 1998.


Reprodução de notícia da Folha de São Paulo

quinta-feira, 29 de setembro de 2022

O país tem como barrar o avanço do bolsonarismo, o Rio de Janeiro, não


Se as Forças Armadas não enlouquecerem; se as pesquisas de intenção de voto se confirmarem; se a terceira via se convencer de que é preciso votar pela democracia no primeiro turno; se esses quatro anos de desatino acabarem no dia 2 de outubro, enfrentaremos anos duros, mas suportáveis.

Aflige pensar que 30% da população brasileira ainda acredita em Messias; disso, não nos livraremos.

Para uma carioca, desespera ainda mais saber que os representantes desse terço bélico do eleitorado procurarão um ninho para se criar que, infelizmente, atende pelo nome de Rio de Janeiro.

O país tem como barrar o avanço do bolsonarismo, o Rio, não. Ou sim, é preciso acreditar. A origem da derrocada da minha cidade tem seu marco zero na mudança da capital para Brasília. Feita em tempo recorde, sem um planejamento que protegesse o Rio das perdas inevitáveis, a transferência do centro de poder para o interior deixou de herança uma folha de pagamento inchada do funcionarismo e o ressentimento de uma cidade que não só perdeu o posto, como virou metrópole de um Estado do qual sempre se viu apartada.

Ferida incurável, volta e meia o separatismo emerge, com projetos doidos de desmembramento da Guanabara. Mas até isso é passado. O Rio depende, hoje, do polo de petróleo do norte do estado, dominado pelos Garotinho. A violência, a miséria e a falta de mão de obra qualificada, entre outros problemas insolúveis, espantaram a indústria e, hoje, chega a ser ridículo imaginar que o Rio já ostentou uma Bolsa de Valores.

Assim como Salvador, primeira capital da colônia, e Recife, que foi o centro da ocupação holandesa, o Rio perdeu a majestade, mas manteve certa influência. Juízes, economistas, empresários, advogados, médicos e artistas, além do samba, do funk e do Cristo Redentor, ainda moram aqui.

Não se sabe se por vingança de Brasília, ou mania de grandeza mal curada, por muito tempo, nós, cariocas e fluminenses, votamos para meter o bedelho na política nacional e não para resolver nossas mazelas. A cidade e o estado se transformaram num trampolim para o Planalto.

De Brizola a Garotinho, o Rio serviu de palanque para políticos de oposição. A picuinha fechou a torneira de investimento federal, agravando a crise econômica.

Sérgio Cabral se elegeu prometendo reestabelecer o diálogo, mas era um maníaco cleptocrata, um malandro, na pior tradução da palavra.

Quando atingimos o recorde de quatro ex-governadores presos por justa causa, cheguei a aventar a possibilidade de dividir o estado em três, para distribuí-lo entre os vizinhos.

São Paulo ampliaria a costa verde, levando de brinde, além das belas praias, uma usina nuclear; Minas Gerais ganharia o acesso ao mar, através da faixa central, Cidade Maravilhosa incluída; e o Espírito Santo ficaria com o polo de petróleo da região norte, mas teria que dar conta dos Garotinho. Os milicianos... Bem, esses seriam partilhados igualmente pelos agraciados, para ninguém ser obrigado a segurar sozinho o rojão.

Era uma ideia.

Mas nem isso será mais possível depois que Messias voltar a dormir no Vivendas. Se Cláudio Castro, que é Cláudio Castro —vice de Witzel!— lidera as pesquisas das urnas, imagina um mito que já envergou a faixa? Não bastasse, a dinastia tem quadros para eleger um governador 00, um prefeito 01, um senador 02, um deputado federal 03 e um estadual 04. Não vai ter jeito, o Rio é e será a trincheira armada dos 30% do Whey Protein.

Sempre me incomodou a ideia de que o artista, por ser artista, possui uma sensibilidade política mais aguçada do que a de um médico, um advogado, uma professora, um estudante ou um cientista. Ser artista não nos livra dos erros e desvios inerentes à raça humana. Declarar voto é uma grande responsabilidade. Nessa eleição, no entanto, não é o futuro de um partido ou outro que está em jogo, mas a própria possibilidade da existência de partidos e instituições representativas no Brasil.

Com isso em mente, compareci ao ato de apoio à candidatura de Marcelo Freixo ao governo do Rio de Janeiro, ocorrido no Circo Voador no dia 21 de setembro, com a presença de lideranças culturais. Éramos todos minoria, ali, o bolsão de resistência de um estado dominado pela ignorância, a truculência e o crime.

É Lula lá, no primeiro turno, e S.O.S. Rio, no segundo. Isso, se conseguirmos concluir essa eleição de forma digna. O Brasil merece.


Texto de Fernanda Torres, na Folha de São Paulo