É fato que pouca gente gosta de expor a vida íntima. Por essa razão se chama vida íntima. Já diz o dicionário, o que é íntimo é privado, pessoal e particular. É tão íntimo falar da vida íntima, que o simples fato de falar a expressão "vida íntima" já soa íntimo.
Não foi o que aconteceu alguns dias atrás. Isso após um acidente doméstico, quando minha vida, digamos, íntima foi exposta a pelo menos uma dúzia de pessoas completamente estranhas.
O que levou a essa circunstância começou quando eu e meu marido nos tornamos pais de dois bebês gêmeos. Nossas atividades entre quatro paredes ficaram menos intensas comparadas às de um casal jovem, cheio de hormônios. A falta de prática também deixou minha flexibilidade e desenvoltura durante as performances entre quatro paredes nada acrobáticas.
Foi justamente quando tentei fazer uma mudança de posição apressada na nossa vida, como posso dizer, íntima, a ser exposta a uma dúzia de pessoas. Mirei a Daiane dos Santos, acertei no Mr. Bean e acabei dando uma joelhada na costela do meu marido.
A tirada de atraso virou uma ida ao pronto socorro com suspeita de costela quebrada ou, sabe-se lá, infarto.
Logo na triagem, a enfermeira tentou imaginar o acidente: "Mas ela tentou passar a perna e te chutou?". "Esquisito. Melhor encaminhar para o cirurgião."
O cirurgião olhou para o teto, desenhando a cena mentalmente: "Mas uma joelhada não poderia quebrar uma costela. Vamos chamar o cardiologista?".
Cardiologista para o cirurgião: "Mas deixa eu entender, ela passou a perna por cima e deu com o joelho nele? Melhor ver com o ortopedista".
Ortopedista para cardiologista e cirurgião: "Deve ter sido uma baita pancada. Vamos fazer uma tomografia?".
Enfermeiro da tomografia, para outros enfermeiros, ao lado do cirurgião, cardiologista e do ortopedista: "Tudo isso por causa de uma joelhada?".
Diagnóstico: uma costela quebrada e nossa vida sexual escancaradamente compartilhada a uma equipe hospitalar.
Saímos pela sala, aliviados por nunca mais compartilhar nossa, digamos, intimidade, encontramos meu chefe ao lado da esposa: "Ela quebrou o pé jogando tênis. E vocês, o que estão fazendo aqui?".
Texto de Flavia Boggio, na Folha de São Paulo.
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